Crítica | Relatos do Mundo – O mais puro e ambicioso tédio

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O faroeste é um gênero em extinção e, com exceção de alguns realizadores renomados, que resgatam a essência dessas narrativas e assumem a breguice convencional, poucos filmes atuais realmente decolam, seja por conta de replicar a mesma fórmula datada ou por seguir um ritmo lento, que transforma a obra no mais puro e ambicioso tédio, como acontece com o recente Relatos do Mundo (News of the World), longa que teve sua estreia nos cinemas cancelada e chegou ao Brasil direto pela Netflix. Ambicioso por conta do ótimo elenco, que se transforma na aposta certa do serviço de streaming para a temporada de premiações, mas tão demasiadamente cansativo e desinteressante, que terá dificuldades de manter uma conexão genuína com o público, especialmente quem busca mais energia e ânimo.

A trama e o elenco

A premissa de Relatos do Mundo, baseada no romance de Paulette Jiles, começa no ano de 1870 e acompanha a jornada do Capitão Jefferson Kyle Kidd (Tom Hanks), que viaja pelos Estados Unidos oferecendo notícias do mundo para as pessoas, apesar dos jornais estarem se tornando cada vez mais acessíveis na época. Em uma dessas aventuras, acaba se deparando com a responsabilidade de cuidar de uma jovem de 10 anos, criada por uma tribo local e, através desse pesado e complicado fardo, acaba desenvolvendo sentimentos paternos pela menina. Ao explorar o conservadorismo americano, assustadoramente presente até os dias de hoje, a trama foca na dinâmica entre a dupla, suas diferentes culturas e as situações que surgem ao longo dessa road trip empoeirada. Por esse caminho, o roteiro, desprovido de urgência, tem pontos altos, como o ótimo desenvolvimento de seus personagens individualmente e as camadas que mergulha conforme a narrativa avança, porém, quando está lá embaixo, é difícil se reerguer.  

Tom Hanks (Greyhound), o único atrativo do filme, segue com o mesmo carisma de costume, ainda que não faça nada além do convencional. O astro é naturalmente gostoso de ser assistido, mas é insuficiente quando o drama se intensifica. Por outro lado, a jovem atriz Helena Zengel (Transtorno Explosivo) se destaca bastante e rouba a cena em diversos momentos. Uma ótima surpresa para se ficar de olho nos próximos trabalhos. Mesmo com desequilíbrio, a química da dupla é boa e, de longe, é um dos menores problemas, já que é o tal ritmo que boicota a trama. Com um desenvolvimento arrastado, e que entrega poucos atrativos, especialmente para o público desacostumado com esse estilo, falta ação e, quando finalmente surge algo para acordar o espectador, os efeitos digitais, totalmente desnecessários, são ruins e pouco convincentes. No entanto, há sim qualidade presente no design de produção e nas locações estonteantes, que tornam toda a ambientação agradável e prazerosa de ser acompanhada.

A direção

Essa falta de ação, em contraponto com a mão pesada no drama, feita pelo diretor Paul Greengrass, é curiosa, afinal, foi ele o responsável por dar vida a ótima franquia Bourne, ou seja, filmes enérgicos não é um problema para realizar. Acontece que, para conduzir o emocional do público à um patamar elevando, acaba renunciando à bons momentos em prol de apenas focar na forçada relação de pai e filha dos personagens e em suas diferenças de cultura, língua e tradição. Os homens querem usar a menina para fins perversos e Kidd sente que precisa defendê-la à qualquer custo, mesmo que o roteiro explore bem superficialmente o surgimento desse sentimento paterno, mas que pode ser compreendido pelo teor de injustiça e maldade da sociedade da época e como o protagonista assume uma postura heroica e vai contra a maré de violência. A forma lírica e sem pressa de como Greengrass escolhe contar sua história e seus inúmeros planos gerais apreciativos funcionam por algum tempo, mas depois o desinteresse atropela qualquer comoção que esteja sendo lentamente articulada, culminando em um terceiro ato longo demais e divertido de menos.

Conclusão

Através disso, com desenvolvimento arrastado e sem urgência, o faroeste da Netflix Relatos do Mundo enche os olhos com sua técnica exuberante, mas entrega uma trama cansativa, desinteressante, pouco inspiradora e não digna do talento e carisma de Tom Hanks. Sendo uma imperfeita fotocópia de diversos outros westerns clássicos, a falta de ação e o drama emocional forçado pesam negativamente e a sua essência mais pura e sentimental, que poderia ser a cereja do bolo nas mãos de um bom diretor, se perdem como um grão de areia no deserto.

Nota: 6/10

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