Na incessante busca da Disney por refilmar seus grandes clássicos em versões live-action, se criou uma impressão terrivelmente desconfortável: a de que tocar nos originais era sempre um grande erro. Mas a questão nunca foi exatamente essa.
Reinterpretar animações que marcaram gerações é, na verdade, um movimento natural dentro do ciclo do cinema — uma forma de resgatar histórias, atualizar visões e, sobretudo, reescrever capítulos problemáticos de seu próprio passado. O verdadeiro desafio sempre foi como fazer isso sem desencadear a fúria dos nerdolas. Muitos diretores tropeçaram nessa missão, seja por receio criativo ou pela rigidez do estúdio — como Tim Burton em Dumbo, por exemplo.
E então chega Lilo & Stitch, que repete em 2025 o que já havia feito lá em 2002: salva a Disney num momento de incerteza. Com sua doçura descomplicada, uma narrativa inventiva e generosas doses de emoção, o novo filme amplifica tudo o que a animação original tinha de melhor. Introduz personagens carismáticos, respeita a essência da obra e, acima de tudo, demonstra que o problema nunca foi fazer remakes — e sim o desejo desenfreado de transformar clássicos em algo maior do que deveriam ser.
Lilo & Stitch acerta porque entende o que tornou a Disney bilionária: sua capacidade de emocionar sem abrir mão da qualidade e do carinho que o público já nutre por esses personagens. Um acerto raro, mas decisivo para o estúdio.
Índice
Os acertos e erros de Lilo & Stitch

A trama permanece fiel à animação original, com poucas adições: um alienígena fugitivo se esconde na Terra e acaba descobrindo o significado do amor ao conhecer uma garota solitária e sem amigos no Havaí. É nessa conexão entre Lilo — interpretada por Maia Kealoha, um verdadeiro fenômeno de carisma, impossível de ignorar em cena — e o caótico, mas adorável Stitch que reside a força emocional do filme.
O roteiro é simples e o orçamento aparenta ser mais modesto do que outros live-actions da Disney, mas justamente por manter os pés no chão, o longa se destaca como um dos melhores remakes do estúdio — talvez até superior à animação em certos aspectos. A combinação harmoniosa entre elementos digitais e cenários reais contribui para a credibilidade da história, sem excessos visuais ou ambições desnecessárias.
O diretor Dean Fleischer Camp, que já havia demonstrado sua sensibilidade criativa no delicado Marcel the Shell with Shoes On, da A24, mostra aqui que encontrou mais um projeto que fala diretamente ao seu estilo. Ele compreende que o verdadeiro valor dessa narrativa está na amizade entre os protagonistas e, acima de tudo, na forma como personagens marginalizados se reconhecem e se acolhem mutuamente.
Embora o roteiro não traga mudanças drásticas, a escolha de ancorar a comédia sci-fi em temas humanos e universais — como solidão, pertencimento e afeto — é significativa. O resultado é um filme que emociona, diverte e, discretamente, lembra ao público por que essas histórias merecem ser revisitadas.

Como verdadeiro pilar do filme, a pequena Maia Kealoha entrega exatamente o que o papel exige: atitude, carisma e um timing cômico impecável. Seu desempenho é especialmente notável nas cenas ao lado do Stitch em CGI — mais uma vez dublado por Chris Sanders, codiretor da animação original. Mesmo com poucos diálogos, Maia transmite com precisão quem é Lilo: uma criança doce, mas marcada por uma tristeza profunda após a perda dos pais.
É nessa dor que ela encontra em Stitch uma válvula de escape — alguém com quem pode expressar sua raiva, sua solidão e seu desejo por aventura. Há algo de profundamente bonito e inspirador na ideia de que, vindo do espaço, surge alguém capaz de resgatar o lado mais humano que existe em nós.
Apesar da relação entre Lilo e Stitch ser o coração da história, o vínculo mais poderoso desta nova versão é, na verdade, entre Lilo e sua irmã mais velha, Nani — vivida por Sydney Elizabeth Agudong, outra revelação com carisma espontâneo e um senso de humor genuíno. A química entre as duas em cena é tocante, intensa e totalmente crível, dando ainda mais peso emocional à narrativa.
Mas nem tudo são flores havaianas: Se há um tropeço no filme, ele vem da dupla de alienígenas encarregada de capturar Stitch na Terra. Zach Galifianakis (Se Beber, Não Case!) interpreta o chato Jumba e Billy Magnussen (A Noite do Jogo) dá vida ao bobo Pleakley — ambos optam por performances exageradamente caricatas.

Embora funcionem como um óbvio alívio cômico, o humor que entregam é raso e infantilizado, destoando do tom mais sensível e contido do restante do longa. Aqui, fica claro que certos elementos funcionam melhor no universo animado, onde o absurdo se encaixa com mais naturalidade. Ainda assim, deve agradar as crianças menores.
Veredito
Sem tentar inflar o clássico com grandiosidade artificial para justificar seu retorno às telonas, o remake de Lilo & Stitch aposta no caminho certo: emoção, humor na medida e um profundo afeto pelos personagens. É essa combinação que permite ao filme aprofundar sua narrativa e resgatar, com sensibilidade, uma história simples, doce e carregada daquilo que a Disney sempre soube fazer melhor: partir nossos corações e, em seguida, reconstruí-los com ainda mais força.
Menos custoso que os remakes grandiosos das princesas e mais focado em contar uma boa história, Lilo & Stitch repete, em 2025, o feito de 2002: salva a Disney em um momento de dúvida criativa. O resultado é um live-action vibrante, cheio de coração, que emociona de verdade e nos arranca lágrimas sinceras. “Ohana”, agora, passa a significar também que ainda é possível fazer remakes de animações clássicas — desde que o foco esteja no amor, no cuidado e no respeito pelas histórias que ajudaram a formar o imaginário de tantas gerações.
NOTA: 8/10
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