Encerrar uma franquia pode ser tão desafiador quanto iniciá-la — talvez até mais. No caso de Missão: Impossível, que acumula quase três décadas de história, essa tarefa se mostra ainda mais complexa e custosa. Afinal, como concluir uma série que sempre foi sinônimo de espetáculo cinematográfico em sua forma mais pura?
Desde o início, a franquia apostou na ousadia física de Tom Cruise para alavancar sua carreira e elevar a série ao status de referência no gênero. E deu certo. A saga não só consolidou Cruise como o maior astro de ação vivo, como também injetou qualidade, grandes orçamentos e, o mais importante, uma narrativa envolvente — que em diversos momentos chegou a rivalizar (ou até superar) o próprio 007.
O problema é que a escala cresceu tanto que o maior obstáculo passou a ser superar a si mesma. Missão: Impossível – O Acerto Final (segunda parte do encerramento iniciado com O Acerto de Contas, de 2023) avança com fôlego curto na busca por inovação. Entrega cenas de ação intensas e perigosas, mas parece forçar a barra na tentativa de se superar a todo custo.
A grandiosidade ainda está presente, especialmente no desfecho digno que o oitavo filme oferece, mas o impacto emocional se dilui em meio a um roteiro caótico, ocupado demais em amarrar pontas soltas. O resultado é um fim competente e visualmente impressionante, mas que carece de alma.
Índice
Os acertos e erros de Missão: Impossível – O Acerto Final

Christopher McQuarrie, que assumiu o comando de mais da metade da franquia, já se consolidou como um verdadeiro especialista no universo Missão: Impossível. E parece ter guardado algumas cartas na manga para esse capítulo final. Mesmo com um roteiro excessivamente verborrágico e recheado de conveniências narrativas, o filme se mantém grandioso, fiel à visão épica que Cruise defende com tanta convicção.
Na trama, Ethan Hunt retorna para um último acerto de contas com o passado. Ainda tentando impedir a Entidade — uma inteligência artificial poderosa e ameaçadora —, ele encara a missão mais importante de sua carreira: evitar uma guerra nuclear capaz de aniquilar a humanidade. Parece uma tarefa impossível para um único homem? Sim. Mas Hunt, praticamente indestrutível, conta com aliados leais e uma boa dose de deus ex machina ao longo do caminho.
A combinação entre acrobacias práticas ousadas e uma trama que se complica a ponto de provocar dor de cabeça, tamanha a tentativa de manter tudo dentro de uma lógica rígida, resulta em uma aventura irregular. Ainda assim, há momentos de pura tensão e espetáculo — como a impressionante sequência do submarino, sem dúvida um dos pontos altos da jornada de Hunt até aqui.
O elenco, que mistura rostos já conhecidos da franquia com estreias pontuais, tenta garantir um momento marcante para cada personagem — quase como se todos merecessem sua frase de efeito no caminho para um encerramento digno. Mas, para um filme que se constrói sobre riscos extremos, o número de perdas é surpreendentemente baixo. Apenas um coadjuvante morre, o que reduz o peso dramático da narrativa, mesmo quando o roteiro flerta com a possibilidade de matar personagens queridos.

Ainda assim, isso faz certo sentido dentro da lógica atual da história: a missão de Ethan é, literalmente, salvar a raça humana. A Entidade — vilã da vez — não chega a provocar medo real, mas dialoga com questões contemporâneas: a entrega constante de dados a sistemas que, em um futuro próximo, podem nos dominar. Essa inteligência artificial é onipresente, inalcançável, e tem como objetivo nada menos que o apocalipse. É uma escala ambiciosa demais para uma saga que, apesar dos exageros, sempre tentou manter um pé na realidade.
E é aí que o filme tropeça: riscos absurdamente altos costumam expor a fragilidade de roteiros mais rasos. Tudo soa familiar demais — a ameaça biológica, o destino da humanidade pendendo por um fio, o herói solitário encarregado de salvar o mundo. Convenhamos: já sabemos como isso vai terminar. Ainda assim, a jornada entretém, com momentos de tensão bem executados. Mas é difícil ignorar os exageros, que por vezes beiram o inverossímil e tiram força da própria aventura.
Um elemento que chama atenção ao longo do filme é o constante resgate de eventos passados. As recapitulações são frequentes — quase obsessivas. De um lado, funcionam como uma homenagem aos quase 30 anos de franquia, ajudando a refrescar a memória do público. Mas, por outro, tornam o roteiro excessivamente didático e engessado. Cada detalhe é sublinhado com um flashback explícito, eliminando qualquer espaço para interpretação ou descoberta. A trama, já densa, fica ainda mais sobrecarregada com essa necessidade constante de explicar tudo.
Ainda assim, o filme encontra tempo para equilibrar seu ritmo. Entre sequências frenéticas de ação, há espaço para piadas pontuais, toques de romance e um senso de humor bem dosado, que ajudam a manter a adrenalina sob controle. Um dos retornos mais inesperados e bem-vindos é o de William Donloe (Rolf Saxon) — aquele funcionário azarado do cofre da CIA no primeiro filme, de 1996 — que agora volta com um papel de grande importância na trama.

Outro destaque vai para as coreografias de luta, que estão mais viscerais e brutais do que nunca, superando os títulos anteriores nesse aspecto. E Tom Cruise, aos impressionantes 62 anos, continua desafiando os limites físicos com vigor e emoção visível. Ele claramente entende o peso simbólico de encerrar uma história que ajudou a moldar sua imagem como ícone global do cinema de ação.
Como desfecho, no entanto, o filme deixa um gancho — algo que pode ou não ser aproveitado futuramente. Essa brecha enfraquece a sensação de conclusão, já que Ethan Hunt não encontra paz, nem descanso. Na prática, não é o fim de uma jornada, mas apenas o encerramento de mais uma missão. As portas permanecem abertas, e é difícil acreditar que não veremos mais desse universo. Porque, sejamos honestos: com tempo e dinheiro, tudo volta — esse é o jeito Hollywood de ser. Ainda assim, se a saga terminar aqui, será um final digno, nostálgico e, de certo modo, poético.
Veredito

Apesar de uma trama exaustiva e excessivamente autoexplicativa, a missão mais impossível de todas era encerrar com dignidade uma saga de ação que atravessou quase três décadas — e, nesse aspecto, Missão: Impossível – O Acerto Final cumpre seu papel com a excelência que sempre marcou a franquia. Tom Cruise deixa um legado definitivo no cinema de ação, se entregando de corpo e alma a um personagem que moldou sua carreira e seu status como astro global.
Embora não soe como uma despedida definitiva, o filme — com suas quase três horas de duração — peca pelo ritmo irregular, mas compensa com doses generosas de tensão, emoção constante, atuações seguras e cenas de ação impecavelmente coreografadas. Um fan service assumido e prazeroso, que celebra o que a série tem de melhor. Missão cumprida.
Nota: 8/10
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