Crítica | Batem À Porta – Uma visita envolvente, mas sem surpresas

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Não é fácil assistir um filme de M. Night Shyamalan sem esperar por alguma reviravolta mirabolante. E parte dessa expectativa se deve exatamente ao próprio cineasta, que nos acostumou a ver sua arte desta forma dependente. Uma atitude nociva e que, por si só, já afeta o resultado final do público que sempre espera por algo além do comum. Com altos e baixos ao longo dos anos – e mais baixos na última década – fazer um filme como Batem À Porta (Knock at the Cabin) após duas bombas como Vidro e Tempo, exemplifica perfeitamente como a carreira do diretor vive em uma constante montanha-russa desgovernada.

Se os filmes citados foram o ponto mais baixo e desanimado dessa jornada irregular, a nova produção talvez represente ao diretor a primeira subida significativa de um retorno ao que sabe fazer de melhor: intrigar o público do começo ao fim. Mas manter esse trem nos trilhos – sem se apoiar em plot twist – pode exigir bem mais do que apenas um suspense decente e um bom elenco. Batem À Porta tem tudo isso e mais um pouco, mas também deixa uma sensação amarga de que algo está faltando.

A trama e o elenco

Para começo de conversa, recomendo passar longe dos trailers de Batem À Porta. Não por conter praticamente toda a ação do filme nesse marketing, mas por também entregar de início a essência da trama e sua óbvia reviravolta. Para alguém que gosta de revirar a expectativa do público, Shyamalan joga seguro dessa vez e não deixa que o plot twist seja o principal ponto de seu filme. E acredite, não é.

Assim como obras como Rua Cloverfield 10, o grande enigma dessa história – adaptada do livro O Chalé no Fim do Mundo, do autor Paul Tremblay – está na dúvida que gera na cabeça do espectador: há realmente um apocalipse do lado de fora ou tudo isso aqui não passa de uma farsa?

É essa questão que nos prende na poltrona por quase duas horas, enquanto acompanhamos o sequestro do casal vivido por Jonathan Groff e Ben Aldridge, com sua filha pequena em uma cabana na floresta durante as férias de verão. O que parecia ser um dia normal se transforma em algo bizarro quando Dave Bautista (Guardiões da Galáxia), Rupert Grint (Harry Potter), Nikki Amuka-Bird (Tempo) e Abby Quinn (Depois do Casamento) chegam para anunciar que eles precisam tomar uma catastrófica decisão: ou alguém da família morre ou o mundo é devastado por um apocalipse bíblico.

Dentro desse mistério se sobre o que estamos vendo é real e se a família vai escolher se sacrificar para salvar a humanidade, o roteiro brinca com os clichês do subgênero home invasion e proporciona ótimas sequências de suspense, impecavelmente dirigidas por Shyamalan.

Desprendida de ter que revelar seus mistérios com facilidade e sabendo que essa decisão segura o público, a trama progride de maneira natural e bem menos expositiva como vimos em Tempo, por exemplo. As explicações são rasas e o suspense se mantém exatamente por prometer um desfecho poderoso, desfecho este que nunca chega, ou seja, a deliciosa imersão nessa cabana se deve exclusivamente pela jornada e não por seus resultados.

O elenco, por sua vez, é excelente, destaque para Ben Aldridge e Dave Bautista (mais uma vez indo muito bem em papeis dramáticos), que se entregam de cabeça aos sentimentos da história e passam a quantidade ideal de emoção e carisma para que nos importemos com suas narrativas.

Boa parte dos projetos recentes do diretor são sustentados por seu elenco estelar e aqui isso faz total diferença, uma vez que o longa acaba se enfraquecendo pela necessidade de mostrar demais do mundo exterior à cabana, perdendo parte significativa de seu mistério toda vez que a TV é ligada e o CGI ruim destoa da realidade. Enquanto a cinematografia e os ângulos de câmera fazem um trabalho excepcional de extrair a estranheza das situações, somada a gélida trilha sonora constante, cada vez que a trama mergulha em flashbacks, menos enigmática ela fica, mesmo que essas cenas do passado sejam emocionantes e sirvam para evidenciar a luta da comunidade LGBTQIA+ por respeito e igualdade.

Tudo é válido, mas o terror se perde pelo caminho. Fora isso, por conta da classificação etária, as mortes são menos violentas e intensas do que poderiam ser.

Veredito

O cinema de M. Night Shyamalan é ame ou odeie, isso é fato, mas é inegável que sua visão singular de suspense tem nos proporcionado obras acima da média, como Batem À Porta, que se torna uma excelente adição à sua filmografia, mesmo com a ausência de ambição e de um desfecho satisfatório. Abandonando sua marca registrada, o diretor abre mão de reviravoltas chocantes para se focar exclusivamente nos mistérios da aventura e seus dilemas morais. Um exercício de maturidade e reinvenção válidos, mas que deve decepcionar quem espera se surpreender.

Se você precisar escolher entre o apocalipse ou sua família, é melhor que essa decisão seja comandada pelo olhar aguçado, inteligente e sofisticado de um cineasta que sabe até onde seu pé pode alcançar, mas não espere um desfecho além do previsível. Se Shyamalan está batendo na porta do cinema – mesmo após alguns deslizes pelo caminho – é sinal de que ele ainda possui ótimas e intrigantes histórias como essa para contar. Sorte a nossa – ou azar – de precisar atender sem saber o apocalipse que nos aguarda.

NOTA: 7/10

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