Em um festival dominado por narrativas carregadas de palavras, voice overs e elucubrações — como se só o verbo bastasse —, Cais, de Safira Moreira, vence o 14º Olhar de Cinema exatamente por seguir o caminho contrário. Enquanto outros filmes falam muito, Cais escuta. Escuta os gestos, os silêncios, as águas e os ventos que atravessam a Bahia e o Maranhão em busca de um abraço impossível: o da mãe que partiu.
Safira Moreira, conhecida pelos curtas Travessia (2017), Nascente (2020) e Alágbedé (2021), estreia na direção de longas com uma obra profundamente pessoal, mas de reverberações universais. Após a morte de sua mãe Angélica, Safira embarca em uma jornada com o filho pequeno por territórios encharcados de memória, cruzando o Rio Paraguaçu e o Rio Alegre — e, ao fazer isso, reconstrói não apenas sua própria história, mas também as raízes que ligam mulheres, gerações e territórios invisíveis ao olhar distraído.
Há algo de ritualístico em Cais. A câmera, nunca intrusiva, se aproxima das mãos, dos gestos, dos trabalhos cotidianos, e aos poucos nos convida a mergulhar nesse fluxo de imagens e sensações. É como se o cinema aqui não fosse sobre representar, mas sobre sentir. Sentir o tempo, sentir a ausência, sentir o amor que se infiltra até nos silêncios mais fundos.
A beleza de Cais está em sua capacidade de nos levar ao território do íntimo sem jamais soar indulgente. Não há espetáculo da dor, não há dramatização da perda. Há, sim, uma cadência generosa, encantada e encantadora, que já dava sinais de maturidade nos curtas de Moreira, mas que aqui alcança potência plena.
Cais é um filme raro porque entende que o cinema pode ser ponte, pode ser porto — mas, acima de tudo, pode ser cais. Um lugar onde a memória atraca e, por um breve instante, reencontra o que foi levado pela maré.
O longa levou 3 prêmios para casa na noite: Melhor Filme pelo Júri Oficial, Melhor Filme pelo Voto do Público e Melhor Filme pela Crítica ABRACCINE.
LEIA TAMBÉM:
- Tudo o que já sabemos sobre ‘A Arte do Roubo’, novo filme nacional com Carla Diaz e Reynaldo Gianecchini
- 5 motivos para assistir ‘June e John’, novo filme de Luc Besson
- Operação Transplante | 5 fatos impactantes sobre a doação de órgãos no Brasil
Aproveite para nos acompanhar nas redes sociais: Facebook, Twitter, Instagram, Youtube e também no Google News.
Quer receber notícias direto no seu celular? Entre para o nosso canal no WhatsApp ou no canal do Telegram.
Quer comentar filmes e séries com a gente? Entre para o nosso canal no Instagram.