Crítica | Coffee e Kareem – Comédia da Netflix brinca com temas pesados de forma hilária

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A clássica premissa de filmes com policial atrapalhado parece, de fato, nunca se esgotar em Hollywood. Dessa forma, os roteiristas precisam encontrar maneiras de se reinventar, e uma delas é a trama politicamente incorreta de ‘Coffee e Kareem’, comédia da Netflix que brinca, consciente, com os clichês e estereótipos desses tipos de filmes em prol de fazer piadas absurdas com assuntos extremamente delicados. Essa ausência de limites, ainda que incomode, felizmente segue o caminho de outras obras como ‘Jojo Rabbit’, que quebras todas as regras do que pode ou não dizer, nos coloca na pele de protagonistas que são favoráveis ao que consideramos errado e usa esse humor para atingir lugares em que outras obras não tem coragem de chegar, sendo assim, se torna diferente dentro do seu próprio conceito e se destaca.

Mas não é apenas o tipo ácido de humor, afinal, o timing cômico do elenco e o ritmo corrido e dinâmico também contribuem para o roteiro ser realmente hilário, ainda que boa parte de suas piadas sejam toscas, repetitivas e desenvolvam humor em cima de temas como violência policial, racismo e até mesmo pedofilia, em uma trama que mostra as rivalidades entre o menino Kareem (Terrence Little Gardenhigh) e o policial (e também namorado de sua mãe) James Coffee (Ed Helms). Na tentativa de assustar o policial e o afastá-lo de sua mãe, o jovem acaba descobrindo uma enorme rede de criminosos no subúrbio de Detroit e, no melhor estilo “dupla dinâmica”, os dois precisam conviver para se salvar. Dessa proposta simples, a história se desdobra entre momentos de ação, perseguição, lutas e entrega tudo que um filme policial precisa ter.

Ainda que o humor seja o bolo recheado, o jovem Terrence Little Gardenhigh, novato no cinema, é definitivamente a cereja que faz a trama ser tão divertida. O linguajar vulgar do personagem, o conhecimento absurdo de assuntos “adultos” e o estilo destemido são fantásticos, assim como a atuação do menino, que rouba o filme para si de forma fenomenal. Além disso, a química entre ele e o ator Ed Helms (de ‘Se Beber, Não Case!’) é excepcional. A dupla funciona perfeitamente, como poucas duplas “sérias” em filmes policiais. Outra que tem menos tempo em tela, mas sempre que aparece mostra sua força, é Taraji P. Henson (Estrelas Além do Tempo), já que protagoniza uma das melhores cenas de luta do filme. Já Betty Gilpin (A Caçada) vive a vilã nervosa e clichê, mas feita sob medida para atriz, que também tem um ótimo desempenho. Como podemos ver, o elenco, escolhido a dedo, faz total diferença para a proposta de “brincar” com temas complicados.

A direção de Michael Dowse (Será que?) consegue amarrar todas as boas ideias e, seu ritmo apressado e sua ótima direção de elenco, equilibra o humor direto e sem papas na língua com a ação policial, na tentativa de criar cenas que façam o espectador rir ao mesmo tempo que se entretém com uma luta bizarra, coreografada e com a pegada de filmes dos anos 1980. Aliás, essa energia oitentista não é à toa, já que o longa presta homenagem a diversos sucessos, como ‘Corra Que a Polícia Vem Aí!’ e ‘Loucademia de Polícia’, obras que, sem dúvida, abriram caminho sólido nas paródias de filmes policiais. A diferença está nos assuntos abordados, atualizados para a época em que vivemos, e na forma consciente que o diretor e o roteirista conseguem brincar com o inapropriado sem ofender gratuitamente. Ainda que possamos gargalhar com piadas envolvendo sexo entre o menino, de 12 anos, e o policial, há um tom absurdo por trás, visível e construído para mostrar como a juventude de hoje tem acesso a todo tipo informação na internet.

Dessa forma, com a proposta de ser nonsense e absurda, inicialmente a trama de ‘Coffee e Kareem’ pode até ser um café quente, que desce ardendo pela garganta do espectador, mas não demora muito para que a viagem sem limites se torne uma jornada hilária, destemida e que vai te fazer chorar de rir. A comédia é plenamente consciente dos seus clichês e estereótipos, tem um elenco fantástico, como o jovem Terrence Little Gardenhigh, que rouba o filme para si, e ainda equilibra, de forma coerente, o humor ácido e tosco com as cenas de ação tiradas diretamente de filmes policiais dos anos 80. Fazia tempo que um roteiro tão imbecil não divertia tanto, exatamente por fazer piadas inapropriadas, porém, que passam a mensagem oposta. Nada melhor como o humor para fazer pensar.

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