Crítica | Chamas da Vingança – Mais um incêndio para maltratar Stephen King

Chamas da Vingança (Firestarter no original), um dos títulos mais conhecidos do cultuado autor Stephen King, chegou às livrarias mundiais em 1980 e foi posteriormente indicado para vários prêmios de prestígio. No entanto, como costuma acontecer com os romances de King, a adaptação para os cinemas (lançada em 1984 e dirigida por Mark L. Lester), foi uma completa decepção. Na época, tanto o público quanto o próprio autor detestaram o resultado, algo que se refletiu na péssima bilheteria.

Agora, 38 anos depois, outro diretor achou que uma segunda chance cairia bem e decidiu tentar dar uma nova vida cinematográfica à história. Uma tradição de azar aos romances do autor. Mas Keith Thomas – se é que é possível – faz um trabalho ainda pior do que Lester. Com atuações horripilantes, um enredo lento, sem rumo e muitas mudanças constrangedoras do material de origem, a versão de 2022 realmente inicia um grande incêndio, mas, no lugar de queimar qualidade e propósito, incendeia mesmo é a nossa paciência.

A trama e o elenco

Completamente sem coração ou mesmo utilidade lógica, a nova trama de Chamas da Vingança busca dar mais destaque à elementos ignorados na versão dos anos 80 e extrai passagens fracas do livro, porém, as batidas essenciais se mantém as mesmas. A jovem Charlie (Ryan Kiera Armstrong) é a filha talentosa de Andy (Zac Efron) e Vicky (Sydney Lemmon). No passado, o casal foi submetido a experimentos com uma droga não comprovada em um estudo idealizado pelo Dr. Joseph Wanless (Kurtwood Smith). Muitos participantes sofreram efeitos colaterais péssimos, mas isso imbuiu Andy com telepatia e Vicky com telecinese. Charlie, nascida anos depois, tem um poder próprio: pirocinese.

Como com grandes poderes vem perigos ainda maiores, uma agência governamental está procurando por Charlie. Eles sabem de sua existência e querem estudá-la e prepará-la, com o provável objetivo final de armar suas capacidades de controle de fogo. E desse enredo bastante previsível e óbvio (pelo menos pelo ponto de vista de hoje, após Stranger Things e X-Men), nasce uma aventura desanimada, lenta e cansativa, fruto de um roteiro sem grande inspiração. Bom, pelo menos nesta versão a bizarra – para não dizer totalmente inapropriada – relação entre o assassino Rainbird (agora Michael Greyeyes) com a jovem menina não foi nem mencionada, uma vez que o especialista verbalizava no clássico um certo teor sexual que possuía pela menina.

Para o bem ou para o mal, o filme abraça o beco sem saída e funciona um pouco como uma obra de origem de super-heróis, exceto que, em vez de se concentrar no desenvolvimento de Charlie, uma Fênix Negra em ascensão, a transforma em uma espécie de quadro em branco, antipática e sem carisma. E isso se deve em parte às limitações da atriz Ryan Kiera Armstrong (Viúva Negra), que poderia ter se saído melhor com um diretor mais forte. A função básica de Charlie em Chamas da Vingança é explodir em chamas e matar pessoas. Ela é um dispositivo de enredo ambulante. Sem graça, sem ânimo e que só serve para gerar algumas cenas de ação peculiarmente menos épicas que as da versão anterior.

Além da falta de ação, o longa oferece pouco suspense e ninguém para se conectar. Os valores de produção são bastante questionáveis ​​e os efeitos especiais foram obviamente criados em uma tela de computador. O filme enfatiza o baixo custo de sua abordagem. A Blumhouse (que produziu o filme) é conhecida por fazer coisas impressionantes com pequenos orçamentos, mas este é um caso em que a falta de recursos financeiros resultou em um produto final abaixo do esperado.

John Carpenter, por sua vez, foi contratado como compositor. Sua trilha – que ocasionalmente lembra seu trabalho icônico na franquia de terror Halloween – é o melhor elemento dessa produção, uma vez que até mesmo Zac Efron (O Rei do Show) não entrega absolutamente nada. Nem carisma, nem performance, nem emoção.

A direção

O que Keith Thomas (do ótimo The Vigil) faz em Chamas da Vingança é enfadonho ao quadrado. O diretor, ainda que limitado dentro do fraco material que têm em mãos e das poucas saídas que possui, uma vez que o cinema de super-herói já contou essa história antes, entrega uma narrativa chata, sem rumo e que não desenvolve nenhuma vertente com vigor. Quando King colocou essa ideia de explorar o lado sombrio de uma criança sem controle dos seus poderes em seu livro, o conceito parecia novidade, agora nem mesmo essa premissa possui originalidade que justifique um roteiro baseado apenas nisso. Aliás, para os fãs do livro, saiba que o desfecho dessa versão altera alguns pontos fundamentais para, possivelmente, gerar continuações futuras. Para nosso azar.

Conclusão

Se a versão original de Chamas da Vingança foi anterior à onda de filmes de super-heróis, esse remake de 2022 acaba por ser engolido por ela, não restando absolutamente nenhuma novidade para ser contata que já não tenhamos visto antes. Com roteiro sem rumo e uma direção enfadonha, o incêndio do tédio, da lentidão e do péssimo desenvolvimento queima todas as possibilidades de ter a faísca de diversão que o clássico possuía.

Poucos autores foram tão maltratados por Hollywood quanto Stephen King; este é apenas mais um título para adicionar à enorme lista de terríveis adaptações. A versão diluída de uma grande história. Agora é torcer para que ninguém mais coloque lenha nessa fogueira de chatice.

NOTA: 2/10

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