Crítica | O Peso do Talento – Uma boa dose de egoísmo cômico

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A capacidade de rir de si mesmo é uma dádiva para poucos. Um recurso quando se não há mais no que apostar depois de uma carreira de altos e baixos. Toda grande obra, franquia, gênero e celebridade com o tempo apela para a paródia. E dá certo. Disso Nicolas Cage sabe muito bem, afinal, ele está de volta! (não que já tenha ido a lugar algum). No entanto, mais do que fazer uma verdadeira chacota da sua vida emocional e carreira consagrada, o astro de Hollywood aproveita que os holofotes estão direcionados para si e entrega também seu trabalho mais honesto e íntimo ao dar vida a si próprio no corajoso O Peso do Talento (The Unbearable Weight of Massive Talent), filme que mescla ficção e realidade em prol de mostrar como a indústria do cinema esmaga suas estrelas.

Dessa maluquice cinematográfica, Cage não apenas encontra voz para expressar todos os conflitos que assolam sua vida particular – fora das câmeras -, como também brinca com o ato de se fazer filmes e a mesmice do cinema atual, voltado apenas para blockbusters e franquias milionárias. Com mais de 100 anos de existência, a sétima arte encontra dificuldade de criar conexão com os jovens e, por conta disso, os astros e estrelas caem no penhasco obscuro do esquecimento. No caso de Cage, numa espiral constante de ser lembrado o quanto seu trabalho está decaindo ao longo dos anos. E olha que, ironicamente, ele vive sua melhor fase. Mas Cage sabe disso e abraça a piada com maturidade e senso de humor.

A trama e o elenco

Dar vida a si próprio pode soar arrogante (e esse é o intuito), porém, também é uma boa oportunidade de mostrar ao mundo que o artista e a pessoa não são assim tão diferentes um do outro. Nessa trama – que se gaba por ser uma comédia adulta – há nuances de diversos gêneros e tropos clássicos de filmes de ação, espionagem e até mesmo suspense, porém, com uma sarcástica e engenhosa pitada metalinguística, afinal, a melhor forma de criticar o cinema é mostrar suas fraquezas através de um filme. Dessa narrativa surge uma persona, um Nicolas Cage rabugento, sem paciência, frustrado com sua carreira e que sofre por não dedicar tempo a sua única filha, uma adolescente que acha o pai “cringe” demais.

Após correr atrás de Quentin Tarantino implorando um papel em seu novo filme e não obtendo sucesso com o diretor, Cage acaba aceitando US$ 1 milhão, como sua última fonte de renda. O dinheiro vem de Javi (Pedro Pascal), um superfã e fanático pelo ator, mas extremamente perigoso. As coisas tomam um rumo inesperado quando Cage é recrutado por uma agente da CIA (Tiffany Haddish) e forçado a viver de acordo com sua própria lenda, canalizando seus personagens mais icônicos e amados na tela para salvar a si mesmo e seus entes queridos. Com uma carreira construída para este momento, o experiente ator deve assumir o maior papel de sua vida – ser ele mesmo.

Não precisa nem destacar como o astro de A Lenda do Tesouro Perdido, Motoqueiro Fantasma e A Outra Face está excelente no papel. Cage rouba a cena no humor e, confortável com a carapuça, explora seu lado mais insano sem ter que se preocupar em ser um sucesso de bilheteria. Os demais atores – que vivem papéis mesmo – servem de escada para que o protagonista possa alcançar todo o seu potencial, ainda que seja confuso inicialmente ver essa mistura de ficção com realidade. Pedro Pascal (The Mandalorian), por sua vez, brilha ao viver a outra ponta de uma dupla improvável que funciona incrivelmente bem. As piadas – ainda que atoladas de clichês – são boas e a química magnética do elenco faz a naturalidade acontecer.

A direção

Dizem que para saber desconstruir é preciso, primeiro, saber construir. O trabalho de Tom Gormican (Namoro ou Liberdade) é inteligente, astuto e criativo em pegar as características de um roteiro genérico e transformá-lo em um verdadeiro meme, uma piada interna, composta por referências a outros filmes e alfinetadas a Hollywood.

Além disso, o cineasta sabe da necessidade de ter cenas de ação (que vendem o filme no trailer) e momentos de comédia falada – cujo Cage avisa que detesta. Porém, O Peso do Talento é um filme sobre exageros e seu terceiro ato acaba por replicar muito do que ri de si próprio, sendo cansativo e até mesmo repetitivo em alguns momentos do clímax, mas nada que afete o desenvolvimento como um todo.

Conclusão

Por vezes o cinema proporciona rir de si mesmo e feliz é quem abraça a piada. O Peso do Talento, acima de qualquer ação maluca e comédia escrachada, é um lindo tributo aos atores que dão tudo pela arte e uma afiada crítica a forma como Hollywood guarda seus ídolos na gaveta do esquecimento.

Para nossa felicidade, Nicolas Cage entra na brincadeira e está ultra engraçado neste papel em que zomba de si mesmo, se divertindo com sua reputação de viver a vida não ao máximo, mas ao excesso. Porém, claro, com momentos emocionais para que possamos ter empatia por sua carreira, digamos, excêntrica.

Uma comédia adulta repleta de referências, clichês e tudo que há de melhor em uma sátira corajosa. Se o peso do talento o esmagou faz tempo, aqui temos Nicolas Cage sendo Nicolas Cage, o que mais podemos pedir?

NOTA: 8/10


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