Crítica | Spencer – Drama real e sufocante vai além do biográfico

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Em seu assombroso sonho febril, o cineasta Pablo Larraín (Jackie) cria uma atmosfera de agonia, um terror psicológico sutil e poderoso, em Spencer – drama cotado para fazer a limpa na temporada de premiações e que chega ao Brasil através da Diamond Films.

A fábula acompanha um final de semana de Natal dentro da opressora e rígida Família Real, mas centraliza suas energias em contar como Diana, a famosa Lady Di, se tornou a princesa que precisa ser salva das garras da monarquia. Essa história “verídica”, ainda que tenha bastante liberdade criativa para mergulhar na fantasia e nos devaneios de uma mente em caos, funciona tanto para mostrar o lado sombrio de quem idolatramos, como também para fazer uma analogia ao peso da fama e como alguns artistas/celebridades tem suas privacidades violadas ao extremo.

A trama e o elenco

Nesse contexto de estar flutuando além da borda, Diana (vivida por Kristen Stewart – vou falar mais dela em breve), a princesa de Gales, está farta de tudo e de todos. Sua saúde mental está desmoronando, assim como seu casamento com o príncipe Charles (Jack Farthing), que não tem mais amor. Ela está ciente de que ele possui outra mulher. Sua família é fria e a cortou de qualquer conexão emocional. Toda a alegria e harmonia familiar durante as festividades param quando ela entra na sala. Ela se sente controlada, manipulada e isolada ao mesmo tempo. Seus únicos consolos são seus filhos (interpretados por Jack Nielen e Freddie Spry) e a sua confidente, a Royal Dresser Maggie (Sally Hawkins).

Dentro desse mundo claustrofóbico, Di quer se reconectar com seu passado e se sentir uma pessoa normal, como era sua vida simples antes da fama e, para isso, Kristen Stewart (Seberg Contra Todos) empresta seu corpo e alma à personalidade sonhadora e avoada da celebridade. A atriz – muito diminuída por sua participação na franquia Crepúsculo – mostra seu devido valor e brilha mais intenso que o sol.

Por vezes doce, por vezes sombria, sua performance acentua a atmosfera sufocante da obra e o contexto de angústia da vida da princesa. Muito mais que visando uma indicação ao Oscar, a estrela sabe que esse é o ponto mais íngreme de sua vasta carreira de altos e baixos e abraça corajosamente suas imperfeições em prol de fazer uma personagem vulnerável, assim como si mesma. A caracterização, por sua vez, é boa, mas não impecável ao nível The Crown, isso é fato.

A direção

Obviamente, para criar essa sensação constante de solidão e tristeza, Larraín se liberta das imagens midiáticas da Lady Di e foca no que há por trás de sua camada grossa de “branca salvadora”. Ao penetrar nas profundezas, lá habita a Spencer, uma jovem sonhadora, humilde e com fortes valores, que se tornou refém (literalmente!) da Família Real.

Esse retrato assombroso se torna cada vez mais intenso conforme a trama avança e explora os fantasmas que existem dentro da Mansão. Almas perdidas, com sonhos partidos e dores que jamais serão expostas ao público.

Sua direção é apreciativa, lenta e caminha no ritmo de um sonho lúcido. Isso, claro, deve afastar parte do público que busca respostas mais rápidas ou que se envolveu com a obra apenas para ver os bastidores malucos da Realeza. Aqui, a jornada é de empatia e a composição das cenas – em seus mínimos detalhes – são pensadas para criar a áurea de estar assistindo algo que não deveria ser exibido.

Um segredo bem guardado, de uma princesa cujo conto de fadas florido se tornou fantasmagórico sem que a mesma pudesse ter seu final feliz. Além disso, a direção de arte, os figurinos de época e a constante trilha trabalham juntas para transformar Spencer em um delicioso banquete aos olhos, destaque também para a fotografia lavada e onírica, que sobressai a sensação de delírio.

Conclusão

Dessa forma, quase que um terror psicológico, Spencer é sufocante e mergulha no íntimo de uma mulher oprimida, refém dos valores conservadores de uma família controladora e, ainda que tenha Lady Di no centro de tudo, o drama vai muito além de biográfico, uma vez que faz uma assustadora reflexão sobre a fragilidade humana e o peso imensurável da fama.

É verdade quando dizem que Kristen Stewart supera a si mesma no papel e entrega a performance mais genuína e poderosa da carreira. Ainda que sua encarnação tenha limitações, a atriz não se camufla atrás de figurinos e maquiagem pesada, muito pelo contrário, ela se faz notar. Em todo caso, Spencer é comovente, melancólico e extremamente poético. Uma sólida redenção tardia do mundo do entretenimento (e Hollywood incluso) à uma princesa que, diferente das personagens livres e romantizadas da Disney, precisava ter sido salva.

NOTA: 9/10


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