Crítica | A Tragédia de Macbeth – O casamento estranhamente agradável entre cinema e teatro

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Bom, se você vai adaptar – mais uma vez – uma das obras mas famosas de William Shakespeare para os cinemas, por qual motivo não fazer da forma mais artística possível e diferente de tudo que já havia sido produzido antes? Esse é o diferencial do estrondoso A Tragédia de Macbeth (The Tragedy of Macbeth), novo drama da impecável A24 comandado pelo diretor Joel Coen, agora livre das amarras de seu irmão, Ethan. A identidade marcante da dupla – e seu banho de sangue convencional – agora dá lugar à uma obra que eleva o nível artístico à uma atmosfera sem igual, ao mesmo tempo que explora a nova vertente de um clássico atemporal.

A trama e o elenco

Par viver o grande centro dessa história de dor e violência, o homem de ego ferido Macbeth, Denzel Washington (Os Pequenos Vestígios) empresta todo o seu carisma e proporciona uma performance brilhantemente densa, talvez o seu melhor trabalho em anos. Não é um personagem fácil, mas o ator flutua com maestria por entre as nuances do protagonista e suas decisões contestáveis ao viver um sujeito ambicioso, que recebe uma profecia das bruxas de que irá se tornar o futuro Rei da Escócia. O problema é que a Escócia já tem um, o Rei Duncan (Brendan Gleeson), porém, Lady Macbeth (vivida pela fantástica Frances McDormand) acha uma ótima ideia porque ela precisa de um novo título como Rainha. Claro, isso inicia uma guerra civil que pode custar a vida de muitos.

E, para alegria dos entusiasmados da literatura clássica, Coen honrou as palavras de Shakespeare, mantendo o diálogo preciso para os tempos mergulhados em retórica, metáforas e preso em versos eternos. Por vezes, a obra mais parece um livro aberto tendo suas páginas viradas ou uma peça teatral coordenada e ensaiada em seus mínimos detalhes.

Por mais danoso e arcaico que possa parecer, um dos pontos mais interessantes de A Tragédia de Macbeth está exatamente na fidelidade com o material de base e no fato de Coen optar por não modernizar sua narrativa. Ainda que a paleta em preto e branco, a proporção de tela ajustada e a narrativa lenta, construída em seu próprio tempo, possam provocar tédio no público que espera mais ação, a essência do dramaturgo encontra-se intacta e assombra todas as decisões estéticas da produção. Sem dúvida é de longe a melhor adaptação de Shakespeare até hoje.

A direção

Com ar sombrio e intenso, Joel Coen incorpora a alma de clássicos como Cidadão Kane e cria uma atmosfera singular que envolve desde o começo, muito por conta do uso de uma trilha absolutamente marcante e por sua condução imersiva, calma e que proporciona um verdadeiro banquete visual ao espectador, como se um quadro expressionista ganhasse vida diante da tela. Afinal, os filmes são um meio visual, não é mesmo?

O diretor estabelece uma paleta de pretos e brancos, com impressionantes tomadas minimalistas que se tornam um casamento estranhamente agradável de cinema e teatro. Ele aprimora o tom melancólico do filme que torna o material de origem tão reverenciado. Crédito também a Bruno Delbonnel (O Destino de Uma Nação), o diretor de fotografia do filme, que capta a paranoia do roteiro. Com isso e seu trabalho em A Crônica Francesa, ele está tendo um ano para celebrar.

Conclusão

Dessa forma, ao ser o casório sublime entre teatro e cinema, A Tragédia de Macbeth encanta com seu banquete visual estonteante e encarna o tom soturno, feroz e melancólico da obra de Shakespeare como nenhum filme antes ousou fazer. É fato que seu ritmo lento e seu desenvolvimento imersivo devem afastar alguns espectadores, mas, uma vez que está disposto a mergulhar na trama e se envolver na fantasia atemporal, a experiência é a mais pura beleza. A única tragédia aqui é que essa obra memorável acaba justamente quando atinge seu ponto mais excepcional.

NOTA: 9/10


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