Crítica | Alice e Peter – Fantasia opta por realismo e se perde em roteiro enfadonho

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Primeiro de tudo, é importante refletir sobre para quem esse filme foi, de fato, pensado para atingir. É infantil e bobo demais para divertir um adulto, mas, por outro lado, é realista, enfadonho e deprimente à ponto de não conseguir prender a atenção das crianças. Ou seja, nesse limbo de sem saber quem agradar, Alice e Peter: Onde Nascem os Sonhos (Come Away) é um total desperdício de premissa em uma obra cansativa, sem nexo e que se perde dentro de sua própria imaginação apelativa, quando a promessa era fazer uma releitura realista que, sejamos francos, não tem a menor necessidade de existir, uma vez que a graça dos contos de fadas está exatamente no fato de ter a liberdade criativa de explorar mundos encantados sem ter a necessidade de se justificar. Com parte importante desse charme sendo arrancado da ideia original, resta apenas uma trama que serve com um bom sonífero para a sala escura.

A trama e o elenco

Se você, que cresceu com Alice no País das Maravilhas e Peter Pan, tem apego emocional à essa dupla de personagens da cultura pop, é melhor passar bem longe desse drama aqui. Ao ser uma espécie de prelúdio sem muita lógica para ambas as histórias famosas, o roteiro pega apenas a premissa básica delas e desenvolve um enredo original extremamente forçado, com personagens que não soam naturais naquele ambiente e aventuras, digamos, pé no chão, que reconfiguram tudo o que mais amamos sobre as criações de Lewis Carroll e J. M. Barrie. O crossover coloca esses ícones da literatura como irmãos, em um mundo “normal”, cuja fantasia e magia acontecem apenas em suas mentes repletas de criatividade e imaginação.

Nesse contexto, o enredo imaginativo – e os efeitos especiais bastante medianos para uma fantasia com grandes astros – cria uma atmosfera de ilusão convincente e apresenta as crianças protagonistas, vividas por Jordan A. Nash e Keira Chansa, que realmente são adoráveis. De longe, a melhor coisa do filme. Mas não demora muito para sua história se esgotar e sobrar mais de uma hora de absolutamente nada de interessante acontecendo em tela, sendo apresentado por uma narrativa arrastada, cansativa e tediosa, que faz qualquer criança perder o interesse.

Agora, se você foi atraído pelos veteranos Angelina Jolie (Aqueles Que Me Desejam a Morte) e David Oyelowo (O Céu da Meia-Noite), prepare-se para se decepcionar ainda mais. Ambos vivem personagens apagados, mal desenvolvidos e que não sobra espaço nem para mostrar qualquer ápice de carisma, fora a ausência de química, não apenas do casal, como do elenco como um todo. Tudo é muito ensaiado, dramatizado e emocional. É meloso demais e, no fim das contas, não convence.

Representatividade está presente

É importante ressaltar que o longa é estrelado por duas crianças negras e, de fato, essa representatividade é bastante bem-vinda e necessária para incluir e diversificar histórias já datadas com o tempo, algo parecido com o que a Disney faz atualmente em seus live-actions. Através dessa iniciativa, grande parte do filme realmente possui seu valor e merece aplausos de pé por, convenhamos, fazer o mínimo, mas pelo menos arriscar fazer sem medo algum, ainda que possa haver aqueles tradicionalistas que virão a lamentar essa releitura sem ao menos perceber que esse tipo de obra não anula o que veio antes e, mais do que isso, não foi pensada para agradá-los. Por conta disso que dói tanto o fato da trama não decolar e o roteiro se perder em suas próprias ambições. Tinha tudo para repercutir.

A direção

Sendo o primeiro live-action da diretora Brenda Chapman, conhecida por seus trabalhos em grandes animações de sucesso, como O Rei Leão (1994) e Valente, definitivamente mostra que sabe lidar melhor com personagens animados do que com mundos reais. Além de sua condução sem ritmo e da falta de conexão emocional que estabelece entre as personagens, as cenas de ação – super necessárias nesse tipo de fantasia – são rasas, mal dirigidas e não levam para lugar algum.

Fora isso, o roteiro de Alice e Peter explora (sem o menor tato) assuntos como morte, depressão e vício, e mostra uma mãe batendo em sua filha gratuitamente, ou seja, mais uma vez evidencia que está perdido sem encontrar seu público-alvo. Cenas longas e monótonas, acentuadas por uma trilha que fica entre o meloso e o épico, com uma fotografia sem vida, tudo aqui contribuí para criar a atmosfera séria, rígida e desinteressante, que permanece do começo ao fim e desperdiça qualquer tentativa de fazer algo diferente do comum ou pelo menos dar um gás à essas histórias já tão exploradas no cinema.

Conclusão

Com o objetivo – desnecessário – de trazer os contos de fadas para um mundo palpável, Alice e Peter: Onde Nascem os Sonhos acaba entregando um melodrama cansativo, sem brilho e facilmente esquecível, que não apenas anula qualquer fantasia existente nas obras originais, como também prova que algumas histórias são intocáveis. Com exceção da representatividade e da doçura do elenco infantil, faltam as maravilhas da Terra do Nunca, coelhos apressados, chapeleiros loucos, navios alados e fadas para que essa obra possa, de fato, mergulhar na imaginação infantil que faz clássicos da literatura serem clássicos.

Nota: 3/10

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