Crítica | Upload – Mistura de ‘Black Mirror’ com ‘The Good Place’ é criativa e divertida

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A tecnologia segue firme e forte como fonte de criatividade para histórias que materializam um futuro completamente diferente de nossa realidade atual. Se em ‘Black Mirror’, por exemplo, vemos como o uso da tecnologia pode levar a humanidade para destinos sombrios, o otimismo de Tales From the Loop já mostra um mundo modificado positivamente pela modernização. Entre esses dois pontos, existe a trama de ‘Upload’, nova série de comédia sci-fi da Amazon Prime, que mistura tanto os pontos positivos quanto os negativos de viver em um mundo em que a tecnologia não apenas auxilia nas tarefas diárias, como também modifica, por completo, a nossa forma de viver. A atmosfera futurista da premissa segue o caminho do humor e cria situações criativas para mostrar esse novo e distópico planeta Terra.

Definitivamente, a criatividade é o forte da série. Engenhosa, o design de produção apresenta diversos dispositivos futuristas (que são uma evolução de alguns que já temos nos dias de hoje) e imagina como a humanidade lidaria com a ajuda constante da tecnologia em tudo que faz, especialmente, na forma como lidamos com a morte, já que o “pós-vida” é o tema central da trama. Nesse mundo de 2033, as mentes dos mortos são digitalizadas para um sistema que recria sua personalidade em diversos “limbos virtuais”, onde essa pessoa, já falecida, passa a existir, se comunicar e viver novamente, como se nada tivesse acontecido. Porém, esse “paraíso digital” nada mais é do que uma realidade virtual desenvolvida por empresas e, com isso, essas pessoas precisam conviver com as limitações, as falhas do sistema, atualizações e compras de objetos dentro do lugar, como se estivessem, de fato, em uma espécie de ‘The Sims’.

A premissa é inteligentíssima e reúne diversas ideias soltas de outras produções para criar sua própria proposta absurda de futuro. Porém, o tom constante é de humor e, ainda que haja debates sobre o uso errado da tecnologia e como nos tornamos reféns do digital, a série não vai muito à fundo nesse lado obscuro e, como uma boa comédia, foca apenas nas bizarrices desse sistema. Diferente de ‘Westworld’, por exemplo, cuja 3ª temporada flerta com os mesmos temas, como a existência do “Sublime”, um limbo virtual onde a mente dos robôs está existindo, aqui, a comédia domina e diverte, no melhor estilo ‘Years and Years’, ainda que tenha poucas discussões sobre religião, ética e capitalismo. Os 10 episódios, com diferentes durações, são ágeis, dinâmicos e, de um modo geral, superficiais sobre mostrar os efeitos desse futuro assustador na sociedade, já que parte do princípio que o mundo já está adaptado.

A presença forte do humor inteligente se vem através de seu criador, Greg Daniels, também responsável por ‘The Office’, inclusive, ambas possuem o mesmo estilo de comédia rápida, direta e visual. Outro ponto forte está na riqueza de detalhes que a produção desenvolve para cada um dos ambientes, seja nos Éden digitais ou no próprio mundo real. Aparelhos eletrônicos curiosos, carros diferentes, na forma como as pessoas se alimentam, como fazem sexo, como trabalham, cada cenário tem elementos divertidos, originais e engenhosos, que dão bastante identidade visual à história. Além disso, o elenco também está bom, sem grandes ápices. Robbie Amell (Code 8: Renegados) vive o protagonista galã, que precisa descobrir se sua morte foi um acidente ou ele foi assassinado por motivos que são, um a um, desvendados nos capítulos. Já Andy Allo (A Escolha Perfeita 3) vive sua tutora, chamada de “Anjo”, que cuida de sua vida no Paraíso. Ambos têm uma química boa, mas é exatamente esse romance que enfraquece a narrativa.

Ainda que o romance faça parte da proposta e funcione como subtrama para a jornada do protagonista após sua morte, é brega e acaba roubando tempo demais, que poderia ser utilizado, principalmente, nos mistérios sobre sua morte duvidosa. Há cenas bonitas e doces, no melhor estilo ‘Ela’, filme de Spike Jonze, porém, se esse romance fosse desenvolvido com mais sutilezas e culminasse no desfecho “Como Se Fosse a Primeira Vez”, teria sido mais interessante. Aliás, há uma trama bem envolvente no penúltimo episódio, sobre uma atualização no sistema. Toda a proposta desse capítulo funciona para que fosse o encerramento da temporada, mas como não acaba aí, o episódio final é um anticlímax enorme, que desperdiça um potencial gancho para a segunda.

Dessa forma, ‘Upload’ mistura ‘Black Mirror’ com ‘The Good Place’ e entrega uma temporada divertida, estranha e regada de criatividade. Há algumas ideias desperdiçadas e excesso de tempo gasto em outras que cansam conforme passam os episódios, mas, de um modo geral, tem uma narrativa enérgica e propõe reflexões sobre assuntos densos, de forma leve e descontraída. Talvez, se tivesse menos episódios poderia ter ajudado a manter o ritmo em alta e, apesar de ser uma proposta feita para ser uma comédia romântica, também poderia ter se aprofundado um pouco mais no lado sombrio de uma sociedade consumida pela tecnologia. O subsolo do Paraíso, por exemplo, habitado por pessoas que possuem poucos dados e que não podem pagar para ter uma vida após a morte de qualidade, seria uma excelente alternativa de debate para a 2ª temporada. E assim esperamos, mas é inegável que a criatividade e engenhosidade da história a torna superior à muitas que também criam mundos futuristas distópicos.

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