Crítica | Close – Um filme inesquecível para nos lembrar que estamos vivos

Uma vez por ano, às vezes mais, uma obra atravessa a tela do cinema e penetra poderosamente em nosso coração como uma faca afiada, sem que tenhamos a chance de escapar de sua tentativa de nos ferir, de partir nosso coração em pedaços para que depois possamos reconstruí-lo do que restou. E, mesmo entre as lágrimas e a angustia daquele sentimento sufocante, você sabe que essa dor valeu a pena quando você ressurge mais forte, mais sábio e mais empático do duelo injusto entre você e o filme. Este ano, Close é, de longe, esse tal filme dilacerador.

A produção belga – que chega ao Brasil através de uma parceria da O2 Filmes e da MUBI – está indicada ao Oscar 2023 e, acima de tudo, parece deixar devastação emocional por onde quer que passe ao mostrar uma doce e íntima amizade e a dor de perdê-la. Ainda que explore diversos temas delicados – como saúde mental e homofobia – o longa é, sobretudo, sobre a interrupção da inocência em uma história friamente calculada para nos fazer chorar do começo ao seu belíssimo final. Um feito raro e um filme extraordinário em sua sensibilidade.

A trama e o elenco

Sob o sol acolhedor do verão belga, Léo (Eden Dambrine) e Rémi (Gustav De Waele) compartilham uma amizade sincera, uma conexão daquelas singulares que fazemos poucas vezes na vida, sendo boa parte delas na infância. Durante o tempo que passam juntos, os meninos de 13 anos fazem o que meninos dessa idade costumam fazer: brincam, fazem festas do pijama e compartilham conversas silenciosas, que revelam a proximidade entre os dois na bolha bucólica que eles criaram para se protegerem do que existe do lado de fora desse mundinho ingênuo.

No entanto, apesar de não se aprofundar no amor romântico que possa ou não existir entre eles, o drama centraliza em como essa proximidade é rompida por conta de fatores externos, incentivados pela maldade e pela malícia das pessoas em relação à amizade masculina e de como o mundo não permite que meninos – queer ou não – possam se amar sem as barreiras impostas pela masculinidade tóxica.

O afeto dá lugar ao medo e, quando Léo começa a se distanciar de Rémi, a transição da inocência primaveril para a consciência adolescente torna-se insuportável para Rémi. Ao ser ao mesmo tempo devastador e esperançoso, o longa do diretor e roteirista Lukas Dhont revela um retrato magnífico do antes e do depois, da pureza da amizade e da devastação de perdê-la tão drasticamente, e isso com a absurda performance do jovem Dambrine no centro de tudo.

Durante toda a projeção – com seu ritmo lento e que se constrói devagarinho -, há uma dor silenciosa que corta a relação dos meninos e, após uma virada drástica na trama, o que parecia ser o nascimento de uma relação tão poderosa que ultrapassaria as barreiras da amizade, se transforma mesmo é, inesperadamente, num exercício de luto avassalador. Uma história de amadurecimento como poucas vezes o cinema ousou fazer. Até mesmo a ambiguidade em relação à identidade sexual de seus dois jovens protagonistas, somada ao silêncio poderoso que preenche as lacunas deixadas pela ausência de grandes diálogos, tudo mostra uma sensibilidade admirável da direção e do elenco.

E, claro, para um filme com esse viés dramático aflorado, os dois atores jovens que interpretam Léo e Rémi necessitavam ser cuidadosamente escolhidos, algo que certamente se concretizou. Ambos retratam uma complexidade emocional impressionante de se ver e são extremamente talentosos. Dão uma aula de atuação, que vai muito além de sua pouca idade. Suas performances são verdadeiramente imersivas e com alto nível de entrega, mesmo quando Léo demora para expressar suas emoções no terceiro ato. Mas quando as emoções reprimidas são finalmente tratadas em uma cena climática maravilhosamente escrita, o público desaba em lágrimas em um clímax comovente, doloroso e de partir o coração, que culmina em uma imagem final que permanece em nossa cabeça por muito tempo.

Veredito

Talvez, o que torna Close tão imensuravelmente poderoso e esmagador de sentimentos é a sua honestidade e coragem de fazer um conto de amadurecimento assumidamente triste e comovente, sobre a potência dos laços que criamos na infância, a dor de sua quebra e aos amores genuínos que perdemos pelo caminho. Um daqueles filmes devastadores que são difíceis de seguir em frente depois de assistir, mas que se apega na esperança e no perdão para mostrar que sempre haverá tempo para se curar, mesmo quando perdemos parte de nosso coração.

Apesar de uma narrativa lenta, com atuações fortes e uma direção sensível, Close é certamente um filme que vai te arrasar e fazer pensar por horas sobre a crueza da vida, mas que, merecidamente, justifica sua indicação ao Oscar e o impacto dramático que tem provocado por onde passa. Uma experiência triste mas real, que apenas prova a força que o cinema possui de atravessar a tela e montar um triplex em nossa mente, só para depois derrubar tudo e nos fazer reconstruir dos pedaços que restaram. E Close permanece abraçado em nós durante toda essa demolição emocional.

NOTA: 10/10

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