Pode ser uma comparação um pouco hiperbólica, mas há muito de Os Fantasmas Se Divertem e The Rocky Horror Picture Show no roteiro de Fervo, nova comédia nacional original do Star+ que conquistou uma estreia também nas telonas. E muito disso se deve, claro, ao material original do longa, que funciona como um remake de uma comédia francesa de 2006, Poltergay, também fortemente influenciada por outras obras de horror e fantasia.
Com uma premissa simples e direta, o longa do diretor Felipe Joffily (Os Caras de Pau em O Misterioso Roubo do Anel) não gasta energia tentando reinventar a roda e mergulha na sempre hilária conexão que o terror gera dentro da comédia na busca por criar uma história bobinha, acessível e divertida na medida certa.
A trama e o elenco
Antes de mais nada, é preciso destacar que Fervo não inova na fórmula e nem parece desejar tal feito, mas ao menos brinca com uma narrativa diferente e pouco utilizada no cinema nacional, através de uma montagem um tanto quanto desregulada – uma cena pula para outra sem grandes impactos -, mas facilmente conectada aos clichês e tropos do cinema de terror. Tudo começa com a visão aérea de um carro por uma estrada sinuosa chegando a uma casa isolada e sinistra no meio do Rio de Janeiro. Logo o casal protagonista é apresentado e descobrimos que os coitados se mudaram para uma casa mal-assombrada. Até aí, tudo comum, porém, o local costumava ser uma boate LGBTQIA+ no passado. E sim, até os fantasmas aqui são inclusivos (e isso é ótimo!).
Cercados por poltergeists da diversidade, a dupla de arquitetos é assombrada pelos traumas e assuntos mal resolvidos do passado do lugar e de seus três fantasminhas insurgentes: uma drag queen ácida (Rita Von Hunty), uma lésbica revoltada (Renata Gaspar) e um gay rebelde (Gabriel Godoy). Dessa premissa descomplicada, grande parte do roteiro feijão com arroz se sustenta pelo humor natural do elenco estelar e pelas piadas mórbidas elaboradas com maestria para a ocasião, uma vez que o ritmo é um grande problema, assim como a condução confusa e apressada de uma direção levemente perdida na proposta.
Enquanto Georgianna Goes e o excelente Felipe Abib (Faroeste Caboclo) arrasam com o pouco que possui em mãos para trabalhar, boa parte dos co-protagonistas já não entregam tanto assim, algo que proporciona algumas cenas, digamos, constrangedoras. Paulo Vieira, por exemplo, apesar de seu enorme talento na comédia, parece um pouco sem rumo quando o seu papel exige mais profundidade, um claro problema de direção. Ainda assim, o humor do astro ofusca seus pequenos deslizes e, no fim, acaba com saldo positivo.
Apesar dos altos e baixos da trama e da falta de conexão emocional – ainda que o roteiro de Fervo se esforce para estabelecer o drama dos fantasmas e a relação ruída do casal – o ponto alto está na direção de arte, figurino, trilha e fotografia da produção. Mesmo com orçamento limitado, o trabalho é excepcional e bastante minucioso, especialmente para extrair o ar soturno e sombrio da casa assombrada e a áurea melancólica das almas penadas. A imersão se deve muito à atmosfera criada pela parte técnica e a direção de Felipe Joffily brilha bem mais nos sustos divertidos e no “terror” do que quando tenta algo mais comovente.
Veredito
Fervo é uma comédia de horror simpática, com boas mensagens sociais e risos pontuais, mas assombrada por um roteiro raso e uma direção desregular, que não ajuda em nada na imersão desse conto divertido sobre poltergeists LGBT’s que buscam mais do que apenas um final feliz.
Este remake de um filme francês – e inspirado em tantas outras produções clássicas de casas mal-assombradas – funciona na comédia, mas morre precoce quando tenta ser algo a mais. Não espere nada extraordinário ou mesmo inovador e receba um filme animado, ácido e repleto de fantasmas que se divertem, afinal, quantas vezes no cinema você viu a Morte dançar Pabllo Vittar? Pois então.
NOTA: 6/10
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