Crítica | Cherry – Tom Holland se entrega de corpo e alma em bagunça ambiciosa

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Acostumados com orçamentos grandiosos após comandar os maiores filmes dos últimos anos, os irmãos Anthony e Joe Russo ainda navegam na maré da magnificência mesmo em uma trama previsível como a de Cherry – Inocência Perdida, novo drama original da Apple TV+ que coloca Tom Holland (O Diabo de Cada Dia) no centro dos holofotes em uma das suas melhores performances até então. Carregada de técnicas exuberantes, a produção desenvolve um enredo denso, sombrio e imersivo sobre a ruína da inocência, mas acaba por se perder durante o caminho com seu excesso de pretensão.

A trama e o elenco

Baseado no romance do autor Nico Walker, o roteiro de Cherry divide a extensa jornada do protagonista em capítulos, que narra sua vida desde o ápice da inocência na faculdade, passando pelo período que foi soldado durante a Guerra do Iraque, e da vida como viciado em drogas, que culmina em se tornar ladrão de bancos após voltar para o país bem no meio da epidemia americana de opioides. Dessa aventura cheia de altos e baixos, a trama mergulha no interior do personagem (literalmente, já que somos até mesmo introduzidos em seu ânus) e proporciona um interessante estudo de personalidade, afinal, o narrador vai do mocinho ao vilão por conta de suas inúmeras decisões contestáveis e o espectador é instigado a assistir e compreender as nuances de sua vida explosiva.

Se por um lado o protagonista possui bastante profundidade e Holland se prova ainda mais versátil por saber conduzir tantas nuances – já que interpreta múltiplos personagens dentro de um só – por outro, a montagem caótica faz parecer que cada capítulo é um filme diferente. As conexões emocionais não são fortes o suficiente para dar liga aos núcleos e a passagem de tempo dá a sensação de que estamos acompanhando diferentes tipos de pessoas em contextos distintos.

Há um arco central de mostrar como um jovem comum pode ter seu coração partido, surtar e modificar toda a sua vida em torno da dor e angústia, porém, essa linha de foco abre espaço para tantas subtramas e acontecimentos no vasto período que a história abrange, que resta pouco desse ponto de partida para ser explorado. Ao sair da sua inocência, passar por uma infinidade de desafios e retornar ainda mais forte, o roteiro explora a jornada do herói de forma bastante convencional, no entanto, esse caminho deixa pouca margem para surpresas e reviravoltas. Fora Holland, que realmente se supera cada vez mais, o restante do elenco serve apenas de fio condutor para levar o personagem do ponto A ao ponto B.

A direção

É inegável o talento dos irmãos Russo em conduzir histórias extensas e com muitos personagens. Porém, em Cherry, há mais energia sendo gasta do que seria necessária para que essa premissa fosse contada de forma eficiente, como aquela lâmpada que deixamos acesa durante um dia claro. Realmente a dupla arrisca planos sofisticados e fora do comum, somados a fantástica direção de fotografia, que brinca com aspectos do cinema e quebra algumas regras que estão na moda serem quebradas (como a proporção de tela, por exemplo). E por ser um filme para streaming, a liberdade criativa fala mais alto e há bastante experimentação, desde o humor ácido e a violência gore, até o uso excessivo de câmera lenta para dar um ar mais sofisticado à narrativa. Todavia, a desordem faz o trem descarrilhar muito cedo e o longa se perde em tudo que busca ser. É um filme de guerra? Um romance? Uma comédia ácida? No fim das contas, a batida de liquidificador não é tão saborosa quanto parece e a sofisticação dos diretores vai por água abaixo quando as demais engrenagens não trabalham na mesma sintonia.

Conclusão

Por consequência, apesar da versatilidade de Tom Holland – facilmente um dos melhores atores de sua geração – Cherry: Inocência Perdida é uma bagunça ambiciosa, tão profunda em seu desenvolvimento e ao mesmo tempo rasa em sua fórmula. Uma jornada de caos e perdição que explora a sofisticação técnica de uma dupla de diretores mimados com a magnitude cinematográfica, mas que se perde na tarefa de contar essa história simples, sobre a ruína da inocência.

Nota: 6/10

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