Crítica | Para Todos os Garotos: Agora e Para Sempre – O mais raso capítulo da vida de Lara Jean

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Saber a hora de encerrar uma história é uma inteligência que o cinema ainda não aprendeu a lidar. Obviamente não é fácil se despedir da mina de ouro, mas existem personagens e jornadas que necessitam terminar antes que toda a qualidade da obra se perca e permaneça apenas o gosto amargo, especialmente quando se trata de uma trilogia, adaptada de livros de sucesso, que não vai muito além de sua zona de conforto. É que curioso que, por vezes, há história demais nas páginas, que precisa ser enxugada para caber nas telas, mas quando o movimento é contrário: há história de menos e filmes demais, daí a receita do bolo desanda. A aventura amorosa e a trajetória de amadurecimento de Lara Jean na franquia Para Todos os Garotos, da Netflix, segue esse pensamento e, ainda que, definitivamente, tenha pontos altíssimos em representatividade, diversidade e construa seu romance aos moldes clássicos ao longo do toda a trilogia, aquele período de vida conturbado da adolescência cedo ou tarde chega ao fim, não é mesmo? O que vem após isso não é mais tão doce ou glamoroso para render um filme sobre. E com a chegada do aguardado desfecho em Para Todos os Garotos: Agora e Para Sempre (To All the Boys: Always and Forever), último filme de uma saga que começou lá em 2018, fica bem evidente que a dilatação do tempo só serviu para deixar a trama cada vez menos impactante, ainda que proporcione um final adequado à essa montanha-russa juvenil.

A trama e o elenco

Não que esse novo e último capítulo seja menos adocicado que os demais, muito pelo contrário, é perceptível que, após o segundo e tedioso filme, a franquia revistou sua fórmula de base em prol de fazer um encerramento mais, digamos, “maduro” e até mesmo denso, com menos problemas do que antes, isso é fato. Porém, seu roteiro simplista e maçante segue aprisionado em apenas um único plot, já que esse aqui explora o tão previsível e clichê momento da vida de um adolescente americano ao ter que decidir qual universidade irá cursar após se formar no ensino médio e como vai conseguir manter seu relacionamento amoroso através da distância. Ainda que esse recorte específico seja palco para incansáveis filmes, a ausência de qualquer novidade só torna toda a aventura ainda mais cansativa, desnecessária e brega. O casal protagonista tem mínima evolução ao longo da franquia e parece que neste filme o desenvolvimento é ainda menor, já que, por quase duas horas, a trama explora apenas o desenrolar desse iminente rompimento, colocando de lado todos os demais personagens e suas subtramas em prol de, mais uma vez, girar em torno do egocentrismo de Lara Jean.

Mesmo que Lana Condor seja uma excelente atriz e realmente se entregue à protagonista, Jean é uma personagem intrigante, mas que se tornou gradativamente vazia e desinteressante de ser assistida e isso é total culpa da necessidade, com base nos livros, de manter a fórmula do “amor ideal” e da “jovem boazinha” e diferente da escola, que acaba atraindo a atenção do galã problemático, mas que nunca têm seus problemas julgados. Toda e qualquer independência ou força feminina que ela possa ter adquirido ao longo desses anos acaba sendo ofuscada pela maneira submissa de como a história à coloca perante o modelo perfeito de relacionamento. Faltam-se camadas e nuances em sua personalidade.

Sinceramente, é difícil manter conexão com sua falta de empatia de enxergar o mundo além de si mesma. Peter, por sua vez, ainda que possa ter mais profundidade do que vemos nas telas, não é (e nunca foi) o destaque dessa narrativa e, como tal, serve apenas para arrancar suspiros dos fãs e nada mais além disso. Noah Centineo tem carisma de sobra, mas faz tempo que perdeu sua afinidade com o personagem. Apesar disso, quando estão juntos em cena, o casal até possui boa química, fato esse que serve como cola para manter a trama conectada. Mas, definitivamente, está longe de ter a sintonia que outras franquias possuem.

E antes que venham falar sobre público-alvo, sim, a trilogia, conscientemente, não tenta lidar com todas as tonalidades da juventude e está tudo bem. É uma comédia romântica convencional e escapista, sobre o fim da adolescência e as responsabilidades da vida adulta, mas convenhamos que o potencial era para ser muito menos superficial que isso. Não digo ser denso e reflexivo como a série Euphoria, por exemplo, mas há ótimos elementos em Para Todos os Garotos que renderiam discussões interessante caso fossem abordados de uma forma mais realista e menos leviana, especialmente esse desfecho, pautado por despedidas, rompimentos e a tão assustadora chegada da maturidade. É muito possível fazer humor leve e inteligente com esse tipo de obra e Sex Education está aí para provar isso, não é mesmo? Mas ok, agora é tarde para avaliar o que o filme poderia ter sido e o foco é no que ele é: uma comédia singela, desesperada para acabar antes que todas as possibilidades se esgotem. E, para nossa tristeza, se esgotaram já faz tempo.

A direção

O desenvolvimento da narrativa centraliza 90% do seu tempo no fato de que o casal irá se distanciar por advertências da vida e acaba deixando de lado outros personagens, inclusive, esquecendo totalmente da existência de John Ambrose (Jordan Fisher), que tanto teve importância nos filmes anteriores e aqui nem dá as caras. Ainda que explore outros países para dar aquela falsa sensação de grandiosidade, a história, na realidade, é minúscula e diluída em água para fazer render mais.

Porém, possui uma montagem divertida e enérgica, feita pelas mãos ágeis de Michael Fimognari, também diretor dos filmes anteriores. Assim como os demais elementos, é perceptível que a direção avançou e ousou usar algumas novas artimanhas para deixar o longa visualmente sofisticado. A fotografia é bastante expressiva e mais escura que os anteriores, exatamente para retratar esse momento triste e confuso da vida dos personagens, porém, a trilha sonora deixa a desejar e falha na condução de emoção do público.

Conclusão

Embora Para Todos os Garotos: Agora e Para Sempre contenha alguns momentos genuínos de coração, o conflito central está exagerado, os personagens carismáticos foram deixados de lado e entrega o desfecho entediante e mais zona de conforto possível, algo que acaba por funcionar perfeitamente dentro de um roteiro satisfeito em ser superficial. Este capítulo final é mais denso e maduro, resgata a doçura e simplicidade do primeiro e até corrige os erros do segundo, mas não escapa de ser o menor e mais raso episódio da vida de Lara Jean. Se apaixonar é bem mais fácil do que se despedir.

Nota: 6/10

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