Crítica | MONOS: Entre o Céu e o Inferno – Obra-prima do cinema sul-americano

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O magnetismo que algumas obras exercem no público é algo transcendental, inexplicável e que guarda a essência do cinema, de fazer filmes e de criar arte através de imagens em movimento. São poucas as obras que alcançam esse patamar de envolvimento e está cada vez mais raro que algumas ultrapassem as barreiras do entretenimento rápido e feito para se assistir no smartphone. Quando ‘Parasita’ de Bong Joon-ho surgiu, a indústria parou para apreciar uma obra única nessa década, que tinha como seu maior mérito criar uma história que o expectador fosse imergido em um emaranhado de reflexões, ao mesmo tempo que desenvolvia um delicioso entretenimento, muito por conta da sua brincadeira com diferentes gêneros. Nesse âmbito, um novo fenômeno acaba de nascer e se chama ‘MONOS: Entre o Céu e o Inferno’ (Monos), drama colombiano poderosíssimo em sua narrativa sensorial e que ainda deve chamar muita atenção nessa temporada de premiações por tamanha maestria como é trabalhado.

A trama e o elenco

Com uma energia singular, muito rara de ser alcançada, a produção divide seus atos em dois climas diferentes e explora as montanhas frias e a selva agonizante de uma América Latina que, por si só, já é uma força da natureza monumental. Seus protagonistas são adolescentes que participam de uma guerrilha numa região remota da Colômbia. Com nomes como Rambo, Pé Grande e Smurf, diariamente fazem treinamento militar rígido enquanto também cuidam de uma prisioneira americana (vivida pela excelente Julianne Nicholson).

Nesse contexto contemporâneo de guerra, a trama se progride em um ritmo interessante e intenso ao mostrar a rotina dos jovens e, sendo jovens, como nem tudo sai como era planejado. Da mesma forma queParasita usa e abusa de diferentes gêneros para rechear sua história, ‘Monos: Entre o Céu e o Inferno’ também navega entre o drama emocional, o suspense de sobrevivência e se mostra um delicioso e inesperado filme coming of age, ou seja, um filme sobre amadurecimento juvenil.

O elenco jovem, por sua vez, está a mais pura perfeição. Todos atuam da melhor forma possível e com bastante naturalidade, que funciona para passar a veracidade das situações e o limite que chegam naquele lugar claustrofóbico de tão imenso e perigoso. É difícil definir quem se sai melhor, já que todos possuem espaço para brilhar e entregar o melhor de si, mas Moises Arías (Hannah Montana), sem dúvida, se destaca. Julianne Nicholson (Eu, Tonya) tem uma performance poderosa, digna de uma indicação ao Oscar e que deve marcar por saber dosar o lado emocional da prisioneira, com a vontade absurda de sobreviver.

O roteiro é forte e denso, que faz a narrativa ter quase um caminho próprio, especialmente por conta da absurda direção de fotografia de Jasper Wolf, que ressalta ainda mais a grandiosidade da natureza e explora detalhes belíssimos dos cenários naturais, algo muito semelhante ao que vemos em filmes como ‘Apocalypse Now’, por exemplo. Há cenas pesadas envolvendo animais e isso deve incomodar os mais sensíveis. É bom assistir com cautela nesses momentos pois realmente impacta, mas é importante destacar que não são gratuitas. Todos os elementos do roteiro imersivo e frenético possui uma explicação plausível e cada momento constrói aos poucos, a interação entre os personagens e suas decisões ao longo da história.

A direção

Alejandro Landes é um nome para se guardar preso na geladeira daqui para frente. O trabalho do diretor é sofisticado, prazeroso e seus enquadramentos impressionam, especialmente pela forma como mescla muito bem a sensibilidade das situações humanas, com a grandiosidade da guerra além daquelas meras pessoas. Seu estilo, com uma câmera que quase “flutua” pelas cenas, lembra e muito o de outro grande cineasta latino: Alejandro González Iñárritu. Claramente uma referência positiva em sua carreira. Em nenhum momento, mesmo quando para pra ser apreciativo, sua condução perde o ritmo ou o interesse do espectador, muito pelo contrário, se torna cada vez maior e mais envolvente conforme a história avança, culminando em um desfecho catatônico e que, mais uma vez, lembra bastante ‘O Regresso’, de Iñárritu, especialmente por conta de uma tal quebra da quarta parede na última cena.

Conclusão

Dessa forma, ‘MONOS: Entre o Céu e o Inferno’ é aquele acidente sublime, como ‘Parasita’, que acontece de vez em quando no cinema mundial e que leva seu fôlego embora com bastante facilidade, através de uma trama sensorial, imersiva e que explora a riqueza monumental do cinema sul-americano. Esse passeio selvagem e provocativo vai te tirar do eixo por completo e levar em uma jornada estonteante que só o cinema pode proporcionar. Nos últimos minutos de um ano incomum e difícil para a indústria do cinema, esse filme se consagra, com facilidade, como uma das melhores e mais impactantes obras.

Nota: 10

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