Crítica | Frankie – Drama melancólico feito sob medida para Isabelle Huppert

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Alguns roteiros já nascem doces, como é o caso de ‘Frankie’, drama melancólico sobre uma famosa atriz francesa que descobre estar muito doente e que tem pouco tempo de vida. A trama, assim como seu roteiro pontual, ganha força nos inúmeros diálogos e caminhadas, similar a deliciosa trilogia ‘Before’, do cineasta Richard Linklater, ao menos, em sua estrutura composta por belos cenários urbanos, naturais e debates precisos e afiados sobre solidão, amor e morte. Porém, nada é mais poderoso do que Isabelle Huppert (Obsessão) como protagonista dessa história, feita sob medida para ela e que a coloca como o sol de seu universo, direcionando todos os holofotes para si e sua atuação honesta e, mais uma vez, deliciosa, mesmo com as recentes baixas na carreira.

Todas as partes do projeto são simplistas e centradas em dialogar sobre a vida da perspectiva de alguém que está partindo, é um recorte, sem tempo específico e sem a estrutura de atos, sobre um dia na vida de diferentes pessoas. A direção privilegia o silêncio e longas tomadas em que a câmera se torna apenas mais uma espectadora, já que a ação se desenrola, em a sua grande maioria, pautada no improviso, mesmo que haja bons diálogos coreografados. A veracidade dos encontros dos personagens e seus sentimentos são o ponto chave para que haja envolvimento do público, ainda que o ritmo do filme seja lento e que a história, que de certa forma não possui começo, meio e fim estabelecido, se desdobre no seu próprio tempo, sendo interessante no começo e perdendo gradativamente a energia, até seu desfecho poético, porém demasiadamente arrastado.

As cores, o uso de luz natural e da natureza exuberante das locações em Portugal (que aliás é um país pouquíssimo explorado nos cinemas)  na composição dos planos lembram muito as obras vívidas de Pedro Almodóvar, o que causa um contraste interessante, já que a trama é carregada de melancolia e tristeza. Certamente o cineasta espanhol serviu de inspiração para o diretor Ira Sachs (Deixe a Luz Acesa), em especial, na criação do melodrama, que flui do texto dos personagens. Seu trabalho na direção é condizente com a proposta livre das amarras do cinema tradicional, sendo quase que teatral de tão observadora que a câmera se torna. Porém, a espontaneidade também se torna sua maior fraqueza. Há problemas na captação do som e alguns cortes mal realizados, fora que, mesmo a proposta ser focada nos diálogos, muitos personagens andam de lá para cá, sem rumo, e alguns parecem tão apreensivos com os longos planos-sequência, que evidenciam. A emoção é outra camada mal trabalhada por Sachs, enquanto o texto é rico em sentimentalismo, sua direção não explora todo o potencial emocional dele.

Além de Huppert, outra atriz que consegue destaque é Marisa Tomei (Homem-Aranha: Longe de Casa), extremamente natural, carismática e confortável com seu papel que não lhe exige tanto assim, mas que parece ter sido prazeroso de fazer. Brendan Gleeson (Mr. Mercedes) consegue se sobressair, mas é ofuscado pelas atrizes. O elenco, como um todo, está bom e equilibrado.

Certamente, um pouco mais de alma teria feito bem para um roteiro cujo foco é conquistar pelo coração. ‘Frankie’ é simples, delicado e explora, com naturalidade, a despedida de uma pessoa que costumava ser o centro das atenções e que agora percebe que não passa de um ser humano frágil como qualquer outro. Pautado por diálogos afiados sobre amor, morte e solidão, a força do longa está mesmo no trabalho feito sob medida para Isabelle Huppert e que a coloca fortemente na lista das melhores atrizes da atualidade. Ainda que possa se perder na ausência de sofisticação, a simplicidade da produção é condizente com sua proposta e, no fim, deixa uma reflexão pertinente. Basta sentar e apreciar a jornada do sol se pondo no horizonte da vida.

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