Crítica | Joias Brutas – Adam Sandler brilha em atuação intensa

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Desconstruir um astro de Hollywood cuja carreira foi pautada por inúmeros filmes simplórios de comédia, sem dúvida, é o grande mérito do drama policial ‘Joias Brutas’ (Uncut Gems). Um trabalho, de fato, diferente de tudo que Adam Sandler (Mistério no Mediterrâneo) já realizou e uma persona completamente oposta aos seus personagens desconcertantes. Porém, a escolha para protagonizar o filme não parece ter sido apenas focada em dar ao ator uma chance de ser indicado ao Oscar, mas também, por ser um personagem irritante e cômico em seu estado natural, caindo como uma luva para o tipo de humor de Sandler. Se fizer um paralelo com o título do longa, é Sandler a tal joia bruta que só precisou de um bom roteiro e uma direção dedicada, para ser lapidada e se tornar um diamante inesperado.

Ainda que seja um trabalho exemplar e diferente, é injusto dizer que o astro não viveu bons papeis nos cinemas. Apesar de muitos fracassos, ‘Click’, de 2006, é um bom exemplo do carisma e de uma atuação dedicada e emocional de Sandler. Mas ao deixar de lado a comédia pastelão, o ator evoca seu lado mais sombrio para viver Howard Ratner, um carismático joalheiro de Nova York, que está sempre atrás de vantagens. Ao fazer uma série de apostas de alto risco que podem garanti-lo uma herança surpreendente, ele terá que planejar um ato grandioso, à medida que luta para manter o equilíbrio em sua família e nos negócios, enquanto ainda tenta derrubar seus adversários, tudo pela incansável busca pela vitória.

Fora a atuação de um elenco envolvente (destaque também para a ótima Idina Menzel) e que preza pelo naturalismo, o roteiro do longa é desenvolvido de forma genial e enriquecido por enormes momentos de diálogos. Diálogos esses que, apesar de interessantes em sua grande maioria, também cansa o espectador, principalmente por conta de Sandler só atuar aos berros. Uma característica do personagem, talvez, mas que causa desconforto após algum tempo. Ainda que tenha muito talento envolvido, há certos exageros no seu personagem. Propositais ou não, é difícil desenvolver uma afeição por sua jornada rumo ao caos e isso é um problema grave. A falta de carisma do protagonista pode até ficar em segundo plano quando a trama foca em nos provocar com cenas intensas, porém, pesa negativamente quando o roteiro força a barra para que possamos sentir pena dele, o que acaba não acontecendo.

Por outro lado, é um personagem com camadas e nuances entre o “mocinho” e o “vilão” e sua jornada na trama se intensifica conforme mais e mais eventos dão errado. O casamento não funciona, os negócios vão de mal a pior e sua vida começa a perder o significado. O humor é sombrio, mergulhado em ironias e momentos constrangedores, mas o roteiro ainda consegue encontrar espaço para ser poético e carregado de metáforas visuais, que já se tornaram marca estética na direção da dupla de irmãos Josh Safdie e Ben Safdie, do excelente ‘Bom Comportamento’, filme este que dialoga diretamente com ‘Joias Brutas’, em sua essência complexa e na forma como aprofunda nos sentimentos mais obscuros de seus personagens. Há planos sequência bem coreografados e a câmera segue a intensidade dos diálogos e dos ambientes fechados e claustrofóbicos.

Outro destaque marcante (além da direção de fotografia fria e sombria que dá ao longa um clima pesado) e que contribui ainda mais para a potência de suas cenas, é a épica trilha sonora original de synthpop e new wave, presença constante do começo ao fim, em especial, quando a câmera viaja por entre a mística pedra valiosa e mistura diversos cenários da natureza e o universo. É pura loucura e alucinação em belíssimos planos que abrem e encerram o filme.

Com isso, ‘Joias Brutas’ é simples em sua forma e eficiente em sua intensidade. A jornada sombria de um homem comum rumo ao caos é hipnotizante de ser assistida. Adam Sandler prova que não é um ator limitado e usa todo seu exagero para entregar um personagem complexo, egocêntrico e obscuro, diferente de tudo que já fez e, certamente, uma entrega primorosa, mesmo que seja difícil extrair carisma de sua performance. É o ator certo, para o filme certo e vivendo o personagem irritantemente adequado. O verdadeiro momento ‘Breaking Bad’ de sua vida.

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