Crítica | A Lavanderia – Sátira da Netflix peca pelo excesso de pretensão

A máquina de contar histórias baseadas em fatos com o típico olhar americano foi ligada por Steven Soderbergh (Distúrbio) para dar uma versão mais “romantizada” do escândalo dos Panama Papers, baseado no livro ‘The Secrecy World’, do jornalista Jake Bernstein, sobre um grande vazamento de e-mails que expôs o íntimo de empresas de fachadas sediadas em paraísos fiscais, usados para sonegar impostos. Mas não se engane, a trama de ‘A Lavanderia’ (The Laundromat), que a princípio pode parecer complexa, acaba por ser mastigável e exposta de forma didática ao espectador. Por um lado, o longa desenvolve um humor ácido interessante, que envolve, já por outro, o excesso de cinismo no roteiro atrapalha, ficando o destaque maior para a direção exibida e teatral de Soderbergh.

Narrado por Antonio Banderas (A Pele Que Habito) e Gary Oldman (O Destino de Uma Nação), que também são os donos da firma que sonega, a trama segue um caminho irreverente, ao quebrar a quarta parede com diálogos voltados diretamente para o espectador, até mesmo, deixando claro que se trata de um filme. Os bem construídos planos-sequência mostram a maestria do diretor na tentativa de colocar um tempero a mais na história tão sem gosto que aborda, que segue os caminhos de filmes como ‘Vice’ (Adam McKay), por desenvolverem uma conversa direta e mastigada com o público leigo em assuntos como os bastidores de empresas, governos e o mundo dos negócios.

Fora o trabalho excepcional e exibido da direção, há sim um ritmo interessante que envolve e conecta as subtramas. Além disso, o roteiro acerta em expor com naturalidade o lado ganancioso e obscuro dos bastidores de grandes empresas, que inclusive, envolve o Brasil. Apesar do excesso de personagens enfraquecer essa narrativa mais enérgica, alguns núcleos funcionam mais que outros, como é o caso da história que segue com Meryl Streep, por si só uma presença poderosa para se ter e que, facilmente, roubará a cena. Sua personagem, que não existe na vida real, possui um ar misterioso e de rancor, similar ao da personagem que recentemente viveu em ‘Big Little Lies’, algo que faz pensar se a atriz, tão brilhante, estaria enfim caindo na repetição por já ter a segurança de sua imagem, porém, funciona como elemento narrativo que move a trama para frente.

O tom humorístico do roteiro é eficaz e sem dúvida facilita o caminhar da trama por entre os núcleos, evidentemente, criados para desenvolver o arco do filme, sendo alguns, inexistentes na história real que se baseia. Essa liberdade criativa fica notória nas mãos de Soderbergh e, mesmo com alguns detalhes que precisam ser moldados, mostra maturidade narrativa e estética do diretor. Porém, o longa cumpre os requisitos para as grandes premiações e essa pressão imposta acaba por danificar sua qualidade. Mesmo com grande elenco, não está lapidado à ponto de ser lembrado, dessa forma, mais uma vez, a pretensão atrapalha outra obra de Soderbergh para a Netflix.

Ainda assim, há uma qualidade técnica inegável e a direção de Steven Soderbergh se mostra madura e extravagante em ‘A Lavanderia’, que funciona no que se propõe, mas decepciona como um todo. O humor é caloroso, mas a bagunça e excesso de personagens do roteiro pesam negativamente a ponto de nem mesmo a presença forte de Meryl Streep dar conta do recado. Para uma noite de diversão, é válido, mas certamente será esquecido com facilidade, como uma roupa que fica na máquina de lavar por dias, sem que lembramos de sua existência.

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