A ambição, quando não vem acompanhada de propósito, costuma ser a ruína de boas ideias. É exatamente o caso de tantas continuações fabricadas a partir do sucesso de um original, sem planejamento real para expandir a narrativa, apenas para capitalizar sobre ela. O resultado costuma ser o mesmo: sequências ocas, que pouco acrescentam e não merecem nossa atenção.
O Telefone Preto surgiu em 2021 como uma das produções mais eficientes do horror mainstream recente, combinando de forma elegante elementos de true crime, sobrenatural e uma estética que evocava o found footage, entregando tensão e identidade própria. No entanto, assim como aconteceu após A Entidade (2012), Scott Derrickson parece novamente preso ao mesmo molde narrativo de sempre.
E sim, cinema é indústria, e o sucesso costuma chamar sequências, mas O Telefone Preto 2 é um desperdício de talento e oportunidade. A história repete fórmulas, se arrasta sem força dramática e dilui tudo que fazia o primeiro filme funcionar. O retorno do elenco e a mudança de ambientação até tentam dar fôlego à trama, mas não há elenco ou cenário capaz de salvar um filme que simplesmente não tem história para contar.
Índice
Os acertos e erros de O Telefone Preto 2

O Telefone Preto 2 tenta provar que tem algo novo a dizer ao nos transportar para um cenário clássico do horror oitentista: uma cabana isolada em meio a uma nevasca — o palco perfeito para um suspense sangrento, não é mesmo? Seria! A ambientação até funciona: a direção de arte e a fotografia capturam com precisão o frio cortante e a sensação de isolamento, ampliando o peso emocional dos sobreviventes do primeiro filme. Mas é justamente quando o longa começa a mergulhar em seu passado que a narrativa entra em colapso.
Sem o conto de Joe Hill como base, o roteiro, agora em território desconhecido, aposta em uma óbvia história de origem para o vilão vivido pelo sempre ótimo Ethan Hawke. O problema é que essa tentativa soa preguiçosa: a trama é arrastada, previsível e inchada de melodrama familiar, tornando suas quase duas horas uma experiência interminávelmente chata.
Em vez de preservar a aura enigmática que fazia do antagonista uma figura aterrorizante, o filme insiste em explicá-lo — e, ao fazê-lo, esvazia seu poder e o humaniza demais. O terror, antes afiado e inventivo, cede espaço a sustos sem impacto e a um suspense bobo, para não dizer risível. No fim, é uma história de origem que ninguém pediu e que só enfraquece o mito que o primeiro filme havia construído com tanta maestria.
Ao tirar o protagonismo central de Mason Thames, agora, coitado, reduzido a um adolescente apático, maconheiro, traumatizado e preso à sua síndrome de sobrevivente, e entregá-lo à irmã, vivida por Madeleine McGraw, o filme altera a dinâmica central da história, mas sem a profundidade necessária para que nos importemos com esses personagens. A atriz, mais madura, até sustenta bem o novo foco narrativo à la Lorraine Warren, mas o roteiro não lhe dá material suficiente para transformar esse protagonismo em algo verdadeiramente comovente.

Mesmo amadurecidos pela dor e traumas, os personagens ainda são tratados de forma bastante juvenil, o que colide com a atmosfera sombria e adulta que o filme tanto tenta sustentar. Para piorar, o temido Estrangulador perde toda sua singularidade: agora mais parece uma versão diluída de Freddy Krueger com vibe de Jason Voorhees, com direito a “homenagens” tão óbvias que beiram a cópia. O resultado é um vilão domesticado e menos ameaçador, um bicho-papão sem charme e que já vimos tantas outras vezes.
Os diálogos são, de fato, artificiais e carregados de explicações desnecessárias, como se o roteiro não confiasse na inteligência do público para desvendar seus mistérios bobos. As tentativas de susto, por sua vez, são inofensivas, nem mesmo quando o filme adota brevemente uma estética VHS, em clara tentativa de replicar o clima perturbador de A Entidade, consegue provocar real tensão.
Hawke, que no primeiro era a alma, aqui se torna quase figurante da própria lenda: aparece pouco, tem diálogos rasos e nenhuma cena que explore seu talento ou a natureza ameaçadora de seu personagem. Debaixo da máscara, poderia ser qualquer ator, um desperdício evidente de um dos maiores trunfos do original. Porém, algo é bastante louvável: a sequência evita ao máximo recapitular o antecessor e utiliza bem o seu tempo com uma premissa que, apesar de rasa, segue em frente.

Veredito
Se O Telefone Preto 2 não chegava com grandes promessas, pelo menos atende à sua própria chamada. A sequência não consegue captar o clima aterrador nem a energia divertida do original, mas ao menos conecta a história a algum lugar — ainda que seja um destino gelado, monótono e totalmente desinteressante. As ideias de terror até aparecem, mas afogadas em um melodrama familiar batido e cafona; se dependêssemos apenas dos sustos, esse filme simplesmente não funcionaria.
Há alguns acenos divertidos para os fãs mais apaixonados e sempre vale a pena ver Ethan Hawke em cena, mas Scott Derrickson, desta vez, parece ter atendido à ligação mais óbvia de todas: a de uma continuação sem história para contar. No fim das contas, nunca foi tão tentador deixar o telefone tocar e não atender.
NOTA: 4/10
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