A adaptação de romances para o cinema não é uma novidade, mas tem se tornado cada vez mais difícil capturar a essência de uma narrativa bem estruturada em um livro de mais de 300 páginas em um filme. Essa transição de formato afeta muitas obras que são fantásticas na literatura, mas se tornam pesadelos sem ritmo na tela, como vimos recentemente com Um Lugar Bem Longe Daqui e A Filha do Rei do Pântano. Agora, é a vez de É Assim Que Acaba, best-seller da autora Colleen Hoover, cuja trama densa foi transformada em uma adaptação cansativa, excessivamente autoexpositiva e heteronormativa da forma mais “família tradicional” possível.
Índice
Os acertos e erros de É Assim que Acaba
Enquanto a trama do livro aborda temas complexos da juventude, com personagens mais jovens, o filme opta por aumentar suas idades, focando em um público jovem adulto e introduzindo novas problemáticas. Essa mudança assertiva intensifica a temática de abuso, tornando-a ainda mais séria e sombria.
No entanto, acaba deixando o romance e o sexo cafonas, com um erotismo constrangedor de assistir, apesar da ótima química do elenco. O filme não chega a cair no soft porn, mas definitivamente perde ânimo e graça quando seus protagonistas estão presos em um contexto romântico que não funciona ao ser transportado para as telas.
No centro desta narrativa, temos Lily Bloom (Blake Lively), uma mulher que, após vivenciar eventos traumáticos na adolescência, decide começar uma nova vida em Boston e abrir seu próprio negócio. Lá, ela conhece um neurocirurgião rico e atraente, mas logo se reencontra com um antigo amor do passado, com quem perdeu a virgindade e ainda mantém uma conexão emocional.
A história se complica quando descobrimos que o charmoso médico de Boston é, na verdade, abusivo, agressivo e extremamente ciumento. Lily, sendo uma otimista nata, tenta ver o lado positivo das coisas, mas começa a questionar se tomou as decisões certas na vida.
Blake Lively interpreta uma protagonista forte e uma narradora não confiável, mas que por vezes se apaga para destacar os homens de sua vida. Apesar dos esforços da atriz (que também é produtora do filme), a direção masculina acaba deixando tudo um pouco menos íntimo.
O diretor Justin Baldoni (A Cinco Passos de Você), que também atua como um personagem absolutamente detestável do começo ao fim, definitivamente não consegue transportar a sensibilidade do olhar de Colleen Hoover para o filme. O longa se prolonga demais no romance e pegação e, quando aborda a temática dramática sobre abuso e traumas, faz isso de maneira excessivamente expositiva e autoexplicativa, sem deixar espaço para questionamentos.
A protagonista perde seu destaque, sendo ofuscada pelo excesso de charme dos homens da história e parecendo apenas uma figura sedutora que os instiga. As sequências de violência, apesar de potencialmente impactantes, são suavizadas por um roteiro raso e óbvio.
É perceptível que a trama se concentra em quebrar o ciclo de violência que persegue as mulheres em muitas famílias, demonstrando como, no início de uma relação, todos os homens parecem perfeitos. O filme aborda isso de forma eficaz ao mergulhar nos sentimentos mais profundos de sua protagonista, uma jovem sempre ferida por homens, seja por seu pai ou namorados.
Blake Lively é uma atriz altamente envolvente e se entrega de coração à personagem, mas o roteiro não permite que ela vá além das linhas do texto. Baldoni, ao se dividir entre duas funções importantíssimas, acaba não se destacando em nenhuma delas.
A produção, por outro lado, não surpreende em nada. Canções pop, típicas de adaptações de livros, marcam a narrativa, e o problema de ritmo torna as mais de duas horas de filme ainda mais maçantes e cansativas. No entanto, da metade para o final, o filme ganha uma energia positiva ao mergulhar na complexa relação de Lily com os dois homens que marcaram sua vida.
Atlas (interpretado por Brandon Sklenar) emerge como o candidato ideal, um homem gentil e doce (que chega até ser enjoativo), seu primeiro e talvez eterno amor. O triângulo amoroso é clichê do gênero e, aqui, tudo é tão óbvio e explícito que não sobra espaço para torcer pelos dois, já que um deles é claramente abusivo e odioso.
De fato, é uma abordagem moderna para trazer essa temática ao mundo jovem atual, para a geração TikTok, e isso é louvável dessa história. O filme mantém a essência do livro ao tocar em feridas da sociedade heteronormativa que os romances geralmente ignoram, embora o faça com uma dose maior de charme do que deveria.
Não chega a romantizar relações tóxicas como anda sendo acusado, mas também não tem a coragem de apontar o dedo de forma incisiva. Como um drama adulto sobre relações em crise, falta mais ousadia e assumir uma posição clara, especialmente considerando o talento de um elenco disposto a se entregar sem reservas.
Veredito
Por mais que as intenções de É Assim Que Acaba sejam boas e a temática sobre abuso seja forte e imprescindível, o romance prevalece, e dá a sua história um odor amargo de uma adaptação que luta para se encaixar em um formato mais expositivo.
As analogias e metáforas sobre flores e o amadurecimento de uma jovem cercada por homens tóxicos são diluídas em uma abordagem romântica açucarada que domina quase toda a narrativa, deixando o espectador de vela. Embora não seja um desastre narrativo completo e apresente boas ideias e um elenco verdadeiramente talentoso, infelizmente não é flor que se cheire.
NOTA: 5/10
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