Crítica | Shazam! Fúria dos Deuses – Amplia a tolice e a comédia mas acrescenta mais coração

Pode parecer uma enorme perda de tempo assistir a sequência de uma franquia sem futuro. Mas talvez não seja maior do que acompanhar filmes compartilhados que não dão em nada. Com a já anunciada reformulação da DC para se transformar na sonhada DC Studios, Shazam e outros super-heróis da casa estão com suas horas contadas, mas isso era diferente quando o primeiro filme fez sucesso e logo uma continuação foi anexada aos planos. Agora, sem propósito e no limbo de um estúdio perdido dentro do personagem, Shazam! Fúria dos Deuses amplifica a tolice do anterior, diverte sem depender tanto de conexões e se mostra, talvez, o atual único filme do gênero feito assumidamente para o público infantil. E isso é formidável.

De fato, Shazam sempre funcionou muito bem à parte do universo DC e essa decisão criativa foi o que fez o filme original ditar criatividade, essência e carisma ao mundo que estava sendo criado. Ser contido foi o que fez do longa-metragem de 2019 se sair tão bem na proposta e abraçar o senso de humor que antes só estava sendo feito nesse nível dentro da Marvel Studios.

E depois de uma fixação ao estilo Snyder de fazer histórias – que colocou a DC numa caixa asfixiante de tédio – ver que pelo menos uma franquia tenta fugir dos limites impostos pelo diretor de Liga da Justiça já representa um avanço significativo. Livre do caos que foi Adão Negro e seu desespero em ser um hit nas telas, Fúrias dos Deuses faz o que sabe de melhor: dar entretenimento sem esquecer o coração.

A trama e o elenco

A sequência começa um significativo tempo depois do desfecho cômico do primeiro filme, quando o Superman foi visitar Freddy (Jack Dylan Grazer) na escola. Agora com o protagonista Billy Batson (vivido pelo limitado Asher Angel) prestes a completar 18 anos e se enxergar como um adulto dentro de sua família superprotetora, o jovem precisa lidar com questões pessoais, traumas do passado e o fato de ser um super-herói famoso, mesmo que fracassado de acordo com os jornais locais. Para piorar sua síndrome do impostor, duas deusas descem à Terra em busca da magia roubada pela família Billy. É essa a premissa básica, mas há a adição de alguns elementos mágicos que dão bastante charme ao filme.

Ainda assim, é mesmo o humor o ponto forte de Shazam e o roteiro escolhe amplificar a fórmula e entregar duas vezes mais referências à cultura pop e piadas sobre o universo DC e seus deuses e monstros. O próprio filme não se leva a sério e essa qualidade é sempre bem-vinda, especialmente dentro de uma história tão banal e bobinha. Na realidade, a trama é um tanto quanto confusa quando tenta ser elaborada demais, uma vez que desemboca no previsível, como todo filme de super-herói atual. Quanto mais justifica suas vilãs rasas, vividas pelas estrelas Helen Mirren e Lucy Liu, sendo que Mirren certamente entrou nessa por dívida de jogo, menos interessante o filme fica e mais aborrecida a trama se torna.

No entanto, o elenco jovem é espetacular e a química entre todos funciona muito bem, algo fundamentado pela direção engenhosa de David F. Sandberg, um nome autêntico e apaixonado por essas histórias, que foge do ritmo frenético e caótico de outras produções da DC que tentaram emular o estilo de Zack Snyder. Em Fúria dos Deuses, Sandberg faz um trabalho brilhante de condução da narrativa e ainda mostra todo o seu potencial tendo em mãos um orçamento maior. As sequências de ação são mais divertidas, mais “heroicas” e consequentemente mais insanas em relação ao filme natalino anterior.

Mas ser maior nem sempre significa ser melhor. O excesso de criaturas, personagens e subtramas paralelas faz o próprio astro Zachary Levi perder o centro das atenções e Shazam ser “só mais um com poderes”. Nada em sua nova jornada de amadurecimento contribui para aprofundar a história e, sinceramente, sua ausência no filme mal seria sentida, uma vez que o elenco de apoio é sensacional e preenche todas as necessidades básicas da trama.

Por fim, o equilíbrio entre o drama familiar e a comédia pastelão é bom, da mesma forma que o roteiro abraça o tom infantil sem medo de ser cafona ou brega. Agora, no quesito CGI, a Marvel anda fazendo escola com suas telas verdes horríveis. Praticamente todos os efeitos digitais são ruins e precários, fator este que nos desconecta bruscamente do filme sempre que os heróis entram em ação.

Veredito

Dentro de um universo condenado, Shazam! Fúria dos Deuses prova que um raio cai sim duas vezes no mesmo lugar e encontra seu coração no humor ao celebrar a alegria infantil como poucos filmes de super-heróis hoje em dia. A sequência mantém a energia vibrante do original e amplifica seu charme para caber dentro de uma trama maior, mais insana e carregada de magia, ou seja, Shazam! continua sendo o melhor produto da DC para as telas dos últimos anos.

Mesmo sem rumo e com uma história previsível, a comédia resgata a essência dos filmes do gênero no começo dos anos 2000 (incluindo seu CGI datado) e proporciona mais diversão do que a grande maioria do cinema blockbuster atual. Não falta alma, nem afeto e muito menos coração nessa mistura emocionante de David F. Sandberg, mas a necessidade de pertencer a um mundo maior dentro do estúdio faz com que grande parte do impacto do filme se dissipe no ar. Ser simples, pequeno e fechado em si está cada vez mais complicado para o cinema de super-heróis.

NOTA: 7/10

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