Representante da Netflix no Oscar 2023 e um dos favoritos em diversas categorias, Nada de Novo no Front (All Quiet on the Western Front) não é o primeiro filme a nos mostrar que a guerra é um verdadeiro inferno. Não é nem o primeiro filme a contar essa história em particular – já que trata-se de um remake de 1930. No entanto, a visão sensível e severa do diretor suíço Edward Berger sobre o romance épico da Primeira Guerra Mundial o torna mais comovente do que nunca, afinal, este é um estudo brutal e intransigente das realidades (e futilidades) de uma nação em guerra.
A trama e o elenco
A rigor, não se trata de uma adaptação fiel do clássico de Erich Maria Remarque lançado em 1928, já que há grandes diferenças (incluindo o desfecho), porém, ao longo da trama dessa produção da Netflix torna-se evidente duas coisas: usar a violência como forma de impacto visual – tal como 1917 fez recentemente – e jogar um olhar contemporâneo sobre um conflito de mais de 100 anos atrás.
Na premissa, Paul Bäumer (vivido pelo expressivo Felix Kammerer) é um adolescente desesperado para se alistar para servir seu país na Primeira Grande Guerra. Ele foi enganado por uma mentira – promessas de glória e heroísmo por militares e políticos que estão felizes em jogar jovens alemães no moedor de carne. Ele só não sabe disso ainda. Grande parte do filme acompanha sua jornada de amadurecimento pela barbárie do conflito (enquanto perde amigos pelo caminho) e sua luta para sobreviver diante dos horrores da guerra.
Obviamente, a opinião do diretor sobre essa clássica história de guerra é terrivelmente sombria – como deve ser, aliás. Seu foco na propaganda em comparação com a dura realidade da vida nas trincheiras é sutil e inabalável, com uma cena particularmente angustiante mostrando Paul recolhendo seu uniforme – sem ideia de que as roupas nas costas foram retiradas de soldados mortos antes dele. Nada dentro dessa história é leve e até mesmo os momentos raros de humor antecedem mortes inesperadas.
A desolação sutil está em toda parte, e quando Paul chega às trincheiras, ele recebe uma dura lição: é hora de se preparar ou cair morto onde você está. E isso é apenas o começo. As fantasias de heroísmo e bravura são rapidamente destruídas quando as realidades da guerra surgem. Nada poderia prepará-lo, e esse é o ponto – ninguém sequer tentou. Ele é apenas mais carne para o moedor enquanto a máquina de guerra alemã continua. Para isso, o longa se beneficia de uma trilha sonora poderosa e visceral, quase que um lamento terrível da crueldade da ambientação, criando assim uma atmosfera absolutamente imersiva de pânico, mais eficaz que muito filme de terror por aí.
Apesar de ser novo no ramo do cinema, Kammerer demonstra um desempenho de arrepiar, carregado de olhares de apreensão e medo das situações terríveis em que seu personagem é posto. O ator captura com maestria esse olhar terrível do diretor e coloca ainda mais profundidade no intuito. Esta performance verdadeiramente incrível destaca o horror de um jovem soldado forçado a enfrentar todos os pesadelos imagináveis. Felizmente, nem tudo é implacavelmente tenebroso. O filme é pontuado com alguns momentos verdadeiramente maravilhosos de camaradagem, como se pode esperar de um filme de guerra habitual. As cenas de batalha são ferozes – possivelmente as melhores desde a abertura de O Resgate do Soldado Ryan.
Além disso, o olhar contemporâneo desta nova versão serve para alimentar uma trama anti-guerra dentro de um filme de guerra. O roteiro caminha sobre uma linha tênue entre humanizar e glorificar seus jovens soldados, mas nem sempre funciona perfeitamente. Esses momentos tocantes citados não duram muito, já que o ponto é mesmo ser um lembrete da humanidade perdida para a guerra em ambos os lados das trincheiras. Uma cena particularmente inquietante mostra o protagonista enfrentando a realidade de suas próprias ações depois de esfaquear um soldado francês até a morte. É intenso e comovente como raramente vemos.
Veredito
Nada de Novo no Front é uma interpretação visceral, sangrenta e assustadoramente realista dos horrores de uma nação em guerra. Ainda que não seja o primeiro filme a trazer esse olhar anti-guerra aos cinemas, a obra alemã da Netflix nos coloca em um campo de batalha no meio de uma carnificina intensa e sobe o nível de qualidade e maestria desse tipo de história clássica. O diretor Edward Berger captura o sentimento desesperador de fazer parte de algo tão violento e proporcionalmente fútil.
Longe de ser fácil de ser digerido, seu roteiro carrega uma força inabalável e nos lembra constantemente (e de forma cruel) da desumanidade que existe dentro de nós. Sem dúvida, um dos melhores filmes de guerra dos últimos tempos e, apesar do título, traz um frescor ao gênero já tão defasado. No fim, depois que a tempestade passa, nos resta um lembrete poderoso de que nunca mais deveríamos deixar algo assim acontecer novamente.
NOTA: 9/10
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