Crítica | Um Lugar Bem Longe Daqui – Romance atolado no pântano do tédio

Um Lugar Bem Longe Daqui (Where The Crawdads Sing) é um clássico exemplo de filme que só se torna mais interessante por conta de sua impactante história real por trás. O longa da Sony Pictures é parte romance de época e parte drama jurídico, mas esta adaptação literária estranhamente estruturada tem pouco a oferecer além de sua ótima atriz protagonista.

Na tentativa falha de mergulhar no drama de um assassinato denso e outros temas mais complexos, como machismo e racismo, o roteiro – baseado no livro best-seller de mesmo nome da autora Delia Owens – peca por suavizar a gravidade dos fatos e exagerar outros, quando poderia ser bem mais incisivo e sem firulas narrativas para fisgar os amantes de romance. Acaba que, na jornada, tudo soa leviano e jogado, nada neste filme é realmente convincente.

A trama e o elenco

Tendo os pântanos da Carolina do Norte como um personagem, a história se desenvolve na preconceituosa e segregada década de 1960, quando a polícia local descobre o corpo de um jovem (Harris Dickinson) na floresta e sua morte gera uma série de perguntas não respondidas (Twin Peaks, temos visitas!).

Evidências circunstanciais apontam para a reclusa Catherine Clark (Daisy Edgar-Jones), chamada de Kya por sua família, mas apelidada de “Garota do Pântano” por moradores da cidade. Logo a fofoca corre e faz Kya ser presa e julgada por seu possível crime. No meio desse caos, vemos o passado da menina e sua rotina de abusos psicológicos e violência provocadas por seu pai. A jovem foi abandonada pela família desde criança e cresceu sozinha no pântano, no melhor estilo Tarzan. Nem mesmo o romance com o doce Tate (Taylor John Smith) muda o destino das coisas.

Dentro desse enredo que instiga o espectador a desvendar o mistério da morte do jovem e se Kya realmente possuía alguma culpa, a trama fracassa na construção do suspense e se atrapalha ao misturar os dois gêneros. O romance é aguado, superficial e o casal está longe de sustentar a intensidade. Já o suspense, lento e arrastado, guarda seu melhor para os minutos finais, mas se esquece que possui um filme de duas horas para segurar. As pistas passam apressadas e grande parte da reviravolta é facilmente antecipada por conta dos diálogos expositivos.

Toda a estrutura não-linear parece não conversar entre as partes. A vida de Kya sofrendo bullying pela cidade e sua fixação por animais e pela natureza, nada parece ter grande relevância para o julgamento que, diga-se de passagem, são as piores sequências do filme. David Strathairn (Nomadland) é calmo demais para convencer como um advogado.

Fora a performance aceitável de Daisy Edgar-Jones (Fresh) – que emprega seu carisma para ajudar a segurar a barra de uma personagem praticamente inexpressiva – o restante do elenco (menos Jojo Regina, que vive a versão criança de Kya) é bastante mecânico, ligados no piloto automático dos estereótipos. O problema é que todos são unidimensionais demais para o mistério funcionar. Desde o começo, está na cara quem matou, o motivo e como o roteiro tenta criar pistas falsas sem sucesso.

A direção

Enquanto a diretora Olivia Newman (Minha Primeira Luta) consegue capturar a poesia do pântano (com ajuda da bela fotografia), com uma sensação de nostalgia melancólica, seus planos estabelecidos e transitórios da natureza são as únicas coisas que não se desdobram mecanicamente. Apesar disso, falta ritmo na condução. A trama de Um Lugar Bem Longe Daqui é apressada mas o desenvolvimento não acompanha, especialmente no final, quando usa o cafona salto temporal para mostrar o futuros dos personagens.

Essas escolhas dramáticas são puramente vazias e simuladas para extrair lágrimas de onde não tem. Ainda que comovente por trazer à tona o dilema de alguém excluído da sociedade e tratado feito um monstro por ser “diferente”, convenhamos que não é uma história que leva ao choro. Outro fato tenso se deve ao passado polêmico da autora Delia Owens (ela está sendo procurada por autoridades da Zâmbia para depor sobre o assassinato de um homem em 1996) e como esse livro/filme parece fazer uma conexão mórbida com a realidade. De mau gosto, eu diria.

Conclusão

Com medo se sujar ao mergulhar nos dilemas éticos da época e sem a dose necessária de emoção e ritmo, Um Lugar Bem Longe Daqui nada mais é do que um romance mecânico, que só se torna meramente interessante por conta das polêmicas da autora do material de base. A trama indecisa e enfadonha falha na construção de um sentimento maior do que monotonia.

O resultado é um banho de lama grudento dentro de uma história suavizada e tediosa, que, apesar do título, nunca parece ir para lugar algum. Sem dúvida, uma adaptação sem estilo, sem camadas e feita sob medida para àqueles que se emocionam com qualquer coisa.

NOTA: 4/10

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