Crítica | A Hora do Desespero – Naomi Watts, um celular e 80 minutos de agonia

Um filme sobre tiroteio em escolas sem ser um filme sobre tiroteio em escolas. Esse é o desafio do roteiro engenhoso de A Hora do Desespero (The Desperate Hour), thriller que chega ao Brasil pela Paris Filmes. Com o intuito de sair do óbvio – que seria mostrar de forma gráfica a tragédia e questionar o porte de armas – o filme busca colocar o espectador no lugar de uma mãe desesperada para saber se seu filho está ou não entre as vítimas de um massacre e, através disso, cria uma clássica trama no estilo “cinema de câmara”, cuja história se desdobra apenas em poucos cenários e com um personagem central e, nesse caso, o seu telefone celular.

Essa “decisão” acaba por ser assertiva, uma vez que, coincidentemente, uma tragédia do mesmo tipo acabou de ocorrer nos Estados Unidos e a ferida ainda sangra. Ao invés de cair no mau gosto, a trama de A Hora do Desespero acaba por se centralizar na dor e na sensação de pânico de saber que alguém que você ama pode fazer parte de algo tão doloroso. Com isso, expõe mais uma vez a fragilidade das escolas americanas e como esse fato têm se tornado algo terrivelmente comum. A montagem – em tempo real – extrai o máximo de agonia e ansiedade dessa temática, ainda que, claro, transforme algo tão sensível em um mero entretenimento de massa.

A trama e o elenco

Para começo de conversa, A Hora do Desespero não tem a coragem de ser um filme anti-armas, uma vez que o foco dos realizadores é mesmo ponderar e, às escondidas, tocar nessa temática sem tomar um partido de fato. Aqui tudo gira em torno de uma mãe (vivida por Naomi Watts) e seu pânico crescente, ou seja, trata-se bem mais de um filme sobre maternidade e amor incondicional do que algo político e incisivo, como por exemplo, o ótimo A Vida Depois.

A equipe por trás de A Hora do Desespero – o diretor australiano Philip Noyce (Salt) e o roteirista Chris Sparling (Enterrado Vivo) – reduzem a história ao seu mínimo essencial, até que seja apenas uma mãe sozinha com seu telefone no meio da floresta, no melhor estilo O Culpado (The Guilty), com vozes diferentes em seus fones de ouvido e uma sequência de decisões capazes apenas por conta do uso criativo da tecnologia, fruto de um roteiro sagaz e que sabe fugir dos becos sem saída com coerência.

Nessa premissa simples e direta, Amy (Watts) é uma viúva de luto com uma filha na escola primária e um filho adolescente. Certa manhã, ela tira um dia para si mesma, coloca a filha no ônibus escolar e tenta acordar seu filho deprimido Noah de sua cama. Enquanto ela está correndo na floresta remota, seu telefone toca sem parar. Mesmo quando ela ajusta para “não perturbe”, um zumbido aparece: um alerta de emergência do departamento de polícia local. É a chamada que todos os pais americanos temem. Há um “incidente em andamento” e as escolas da cidade estão fechadas.

Grande parte desses minutos de ação são apenas sobre a provação mental e física de Amy enquanto ela responde às notícias e tenta chegar à escola a tempo de salvar seu filho. O filme só cresce no final, e mesmo assim, bem pouco. Watts é a única estrela em tela por todo esse tempo e entrega uma performance absolutamente fantástica, algo que prova a estrutura forte do script e a capacidade da atriz de carregar nas costas uma narrativa intensa e constante. Sua força é inabalável e convincente, e o filme sabe muito bem que precisa dessa veracidade para se sustentar.

Como um badalar tenso de um relógio pulsante, o ritmo implacável constrói com maestria o suspense, mesmo dentro de todas as visíveis limitações de orçamento e distanciamento social. Afinal, é uma história cuja força está mesmo nessa atmosfera de crise. Quanto mais terrível fica a situação, mais a protagonista se perde na floresta e maiores são as reviravoltas provocantes.

A direção e o roteiro

Outro feito excelente em A Hora do Desespero está no design sólido de som, que permite que o público possa preencher as lacunas da narrativa com sua própria imaginação, fator esse bastante divertido e criativo desse tipo de obra. É uma surpresa perceber que grande parte do filme é apenas uma mulher correndo por uma hora, porque parece muito mais que isso. Philip Noyce sabe bem como conduzir uma história simples, com poucas alternativas, mas de uma maneira que prende a atenção e mantém o público na ponta da poltrona. Não é tarefa fácil, mas também está longe de ser um mérito singular. Sua condução é coesa e seu maior desafio é o tempo, algo que acaba por contornar de forma mediana.

Quando as alternativas divertidas se esgotam, para não cair na repetição (ainda que caia), o roteiro faz a protagonista agir com irresponsabilidade e joga na lata do lixo toda a inteligência que estava sendo construída até então. Esse caminho que se segue é conveniente demais e, por conta disso, preguiçoso e até frustrante para o desfecho emocional. As lágrimas do filme dependem da ressonância traumática dos tiroteios em escolas para criar urgência e pavor. Ainda que seja algo relacionável, é um exercício de empatia que nem todo público possui. O filme é certeiro no alvo sobre o acontecimento em si, mas vaga ao tentar explicar seus motivos.

Conclusão

Com isso, A Hora do Desespero acompanha Naomi Watts, um celular e pura agonia para evocar o terror que os pais sentem quando seus filhos estão em perigo mortal. O filme se sustenta totalmente através de um roteiro simples, porém afiado.

A trama, carregada de intensidade e uma forte dose de crise de ansiedade, envolve o espectador numa sensação mista de pavor e nervosismo que funciona, ainda que sua mensagem seja imperdoavelmente evasiva no fim das contas. Tudo depende do quão imerso o público consegue ficar com uma história tão absurdamente simples sobre uma mãe correndo por uma interminável floresta.

NOTA: 7/10


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