Apesar dos altos e baixos do trajeto, uma coisa não podemos negar: a Sony está tentando. Mas quem disse que desenvolver um Aranhaverso sem o protagonista seria uma tarefa fácil? Após apostar não em apenas um, como dois filmes do Venom, o caminho parece ter dado uma volta 360º e agora segue para uma estrada menos tortuosa – convenhamos que ambos os filmes do simbionte são horríveis -, porém, igualmente inconsistente e muito por conta dessa necessidade absurda de fazer parte de algo maior do que consegue ser. Não é que Morbius – nova superprodução do estúdio dentro do mundo do Homem-Aranha – seja um filme ruim em sua totalidade, muito pelo contrário, a premissa é divertidíssima e promissora, mas fracassa exatamente por mirar o inalcançável.
Como uma obra única – sem conexões e/ou referências – o roteiro se esforça para criar uma narrativa sombria, com nuances de terror, sobre um sujeito que ultrapassa todos os limites em busca da cura para sua doença terminal. O médico e o monstro, no melhor estilo Frankenstein, Drácula e Nosferatu, porém, dentro do mundo onde tudo é possível dos super-heróis. Como poderia tal ideia genial dar errado? Pois bem, dá! Como um dos péssimos filmes da franquia X-Men, por exemplo, Morbius esgota sua criatividade antes que possa conquistar ou envolver o público, mesmo sendo mais ousado que Venom e trazendo sangue e violência para o contexto de “vilão que vira mocinho na ausência de um herói de verdade”.
A trama e o elenco
O tom de seriedade e o clima sombrio, gótico e quase filme da DC se destaca, uma vez que essas produções da Sony associadas com a Marvel seguem a linha piadista e PG-13 de costume – afinal, agora há ligação direta com as histórias da Disney por conta do Multiverso. Essa ambientação mais soturna é um dos pontos mais interessantes e que nos faz, de fato, temer o protagonista, já que ele se transforma num verdadeiro monstro descontrolado e assassino quando precisa se alimentar de sangue. Isso, por si só, já dá mais profundidade do que Venom sonhou fazer, porém, nada segue como original nessa premissa. Se pegarmos a franquia do Homem-Aranha do Sam Raimi e destrincharmos seus plots, encontraremos a mesmíssima estrutura em Morbius.
O mocinho cujo DNA se conecta com o de outra espécie – nesse caso, dos morcegos – com seu amigo egocêntrico (que vem a se tornar um vilão), o triângulo amoroso e até mesmo os conflitos da amizade, tudo que já vimos antes em outros filmes está nesse roteiro raso, simplório e pouco engenhoso, fruto de uma pressa para desenvolver uma história que teria funcionado perfeitamente caso houvesse mais sutilezas e abraçasse o horror que tanto finge ter.
No demais, fica nas mãos de Jared Leto (Casa Gucci) entregar a profundidade essencial para o Dr. Michael Morbius e sua ambição cega pela cura não apenas de si mesmo, como também do seu melhor amigo Lucian/Milo (atuação notável de Matt Smith). Essa loucura faz nascer, claro, dois vampiros bizarros em Nova York e um conflito pessoal que acaba colocando vidas inocentes em perigo. Leto vive esse herói ambíguo e entrega o simples, não faz nada além do habitual e se mantem íntegro. Dos males, a performance do astro (e do elenco todo em si) é o menor dos problemas.
A direção
Por outro lado, a direção de Daniel Espinosa (Vida) é uma bagunça sem ritmo. A primeira metade do filme, ainda que arrastada, até que desenvolve bem o enredo e apresenta as nuances do protagonista com certa sabedoria, porém, do meio pro final, a narrativa corre desenfreada para concluir as pontas soltas e entregar um clímax cabível, clímax esse que mostra como a receita desanda completamente ao longo do filme.
As sequências de luta definitivamente agridem menos os nossos olhos do que as de Venom, mas são igualmente escuras, frenéticas e ambiciosas demais para o nível até bom dos efeitos especiais e do trabalho da maquiagem. Há bastante slow motion (e por pior que seja, ao menos dá para enxergar alguma coisa na briga). A sensação que fica é de que o “complexo” conflito se resolve de forma abrupta. Todo o desfecho é anticlimático, isso para não ressaltar que não existe um final de fato. O filme termina com tudo em aberto, mais uma síndrome de franquia que põe o filme de origem como algo que necessita ser complementado para fazer sentido.
Mesmo dentro de uma chuva de inconsistências, há algo que precisa ser ressaltado como positivo e isso está nas explicações lógicas e coerentes, tanto para os poderes do personagem quanto para sua doença e a forma de ser curada. Como ficção científica num filme fantasioso, até que é crível (claro, sem considerar a transformação em vampiro, óbvio). Agora, se você busca mesmo as conexões com os demais filmes da Sony e da Marvel, sinto te desapontar pois as cenas vistas nos materiais de divulgação não estão presentes no filme – exceto nas duas pós-créditos que são, como posso dizer, bem sofridas e feitas na pressão para encaixar na trama, como uma roupa que não nos cabe mais. Fora isso, Morbius tenta fôlego sozinho dentro de um universo que só faz sentido com todas as peças interligadas.
Conclusão
Com dose extra de violência e nuances de horror, Morbius suga nossa atenção e facilmente supera o entretenimento de Venom, mas sua ambição e desespero por conexões no Aranhaverso não são o suficiente para fazê-lo funcionar. Jared Leto mira em Nosferatu mas acerta mesmo nos Volturi de Crepúsculo.
Falta de ritmo, clímax apressado e ausência de desfecho são apenas alguns dos problemas imperdoáveis de um filme que foi adiado inúmeras vezes para que, no fim das contas, desperdice seu enredo promissor com algo tão preguiçoso. Ainda assim, talvez seja o filme de super-herói que chega mais próximo de alcançar o título de “filme de terror”. E para quem busca apenas os divertidos easter eggs da Marvel, certamente ficará desapontado pois muita coisa dos trailers foi enganação. Em resumo, Morbius não é terrível quanto se poderia imaginar e, para um filme do Sonyverso, isso soa como um verdadeiro triunfo.
NOTA: 6/10
PS: O filme possui DUAS cenas no meio dos créditos. – Veja a descrição
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