Crítica | A Vida Depois – As cicatrizes de um trauma em drama comovente da HBO Max

Trauma é algo intrínseco, que faz parte de nós e que, na grande maioria das vezes, nos transforma em pessoas resilientes. Sofrer uma dor tão forte assim sem dúvida muda nossa perspectiva de mundo e nos faz crescer. E essa é parte principal da premissa de A Vida Depois (The Fallout), novo drama original da HBO Max que explora todas as fases mais intensas e dolorosas do luto, ao mesmo tempo que navega por um assunto bastante delicado: a violência escolar e a legalização de armas nos EUA.

Ao focar na construção de personagens que precisam lidar com as consequências de uma tragédia na escola, o longa emociona com suas nuances entre a superação e o fundo do poço, mas ganha força mesmo pela atuação da jovem em ascensão Jenna Ortega, que abraça com sabedoria sua performance e compreende que este pode ser facilmente o ponto de virada de sua carreira.

Diferente de outras produções dentro do mesmo tema, como o ótimo Elefante (2003), aqui o ato terrível nunca é de fato mostrado, uma vez que a peça central do roteiro está mesmo em acompanhar a vida de uma adolescente após sofrer essa ruptura cruel bem na fase mais modificadora de sua existência. E a jornada não é fácil, nem para a protagonista e nem para os espectadores.

A trama e o elenco

Era só mais um dia comum na escola quando um jovem decide entrar armado e ceifar a vida de mais de 10 estudantes. Dentro desse caos inesperado, três jovens com personalidades diferentes se escondem no mesmo banheiro e passam juntos por longos minutos de agonia e medo até que o estudante assassino seja detido. Um momento tão rápido, tão pequeno, que serve de ponto de mudança para uma vida inteira no comportamento dos que escaparam da morte. E Vada (Ortega dá tudo de si e prova que é uma das melhores atrizes de sua geração) lida com a síndrome do sobrevivente ao sentir-se culpada por estar viva, ao mesmo tempo que precisa se reerguer e se reinventar, uma vez que agora presenciou de perto a perversidade do mundo. Como lidar com uma dor tão sufocante? A resposta nunca é fácil.

Na outra vertente, o roteiro acompanha uma jovem influencer de sucesso na internet – Mia (vivida pela menina dos clipes da Sia, Maddie Ziegler) – que possui uma vida extremamente solitária no mundo real e mostra como um trauma pode modificar até mesmo os mais resistentes.

Sem mostrar a chacina em si, o longa opta por nos colocar num ponto cego, onde apenas os tiros são ouvidos e isso causa uma agonia ainda maior, uma sensação de pânico que realmente assusta e nos faz adentrar no mundo das personagens. As ótimas escolhas por parte da direção acabam por deixar o roteiro – que é simples e sem grandes pontos de virada – mais emocional e denso, ainda que o processo de cura seja longo e a trama acabe por se arrastar mais que o necessário.

A direção

Definitivamente é uma grande estreia para a diretora Megan Park, uma vez que consegue realizar o mais difícil: sustentar um longa-metragem apenas na gama de sentimentos que o roteiro aborda. O tema não é fácil e a cineasta consegue navegar com leveza quando necessário e com pesar quando preciso entre todas as nuances emocionais da protagonista. Sua condução é um pouco lenta? Sim, há momentos desnecessários e até repetitivos que ancoram a narrativa e fazem com que a jornada de amadurecimento proposta acabe por perder força enquanto busca achar seu tom ideal.

Mas, ainda assim, há pontos altos que roubam a nossa atenção e a experiência de chegar até o final sufocante não é tranquila, algo que apenas comprova que a mensagem principal e a reflexão foram plenamente alcançadas. Diferentes dos dramas teens contemporâneos, aqui há sim espaço para lágrimas e canções que elevam a sensação de superação, mas seu foco está mesmo em nos colocar na mente de alguém que não consegue seguir em frente. E isso machuca, parte o coração e desperta gatilhos que nem sabíamos que tínhamos. É preciso ter cautela.

Conclusão

De forma totalmente honesta e profunda, A Vida Depois sustenta sua trama nas cicatrizes deixadas por um trauma e mostra como o processo de cura pode ser uma jornada sufocante quando se é um adolescente em construção. O drama da HBO Max é uma verdadeira torrente emocional que envolve o espectador numa narrativa dura, sincera e que captura com maestria momentos humanos raros dentro de um filme teen. Além do ótimo estudo de personagem, a jovem Jenna Ortega (Pânico) faz seu nome e se prova uma das melhores atrizes de sua geração. Simples, direto e eficaz, uma preciosidade que merece sua atenção.

NOTA: 9/10


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