Uma das maiores, senão a maior, qualidade de ‘Invasão Zumbi’ (Train to Busan), filme sul-coreano lançado nos cinemas em 2016 e que explodiu internacionalmente na Netflix, está na forma em como o roteiro constrói a emoção dentro de um contexto sangrento e assustador da invasão de um vírus mortal. Muito mais sensível e emocional do que qualquer outro filme dessa temática desde então, não é novidade nenhuma que sua existência repercute até hoje como um dos melhores exemplos dentro do gênero. Mas a cobiça, essa é a grande inimiga da arte.
Obviamente, o sucesso levaria à uma inevitável sequência, bem-vinda como expansão de universo do primeiro filme, mas que cai na terrível maldição da necessidade de ser maior e melhor que o original. Através dessa ambição, que não existia no anterior, ‘Invasão Zumbi 2: Península’ (Train to Busan Presents: Peninsula) se passa exatos 4 anos após os eventos passados e, com novos personagens e uma ambientação completamente apocalíptica, explora a decadência do planeta e a insanidade humana diante do caos.
A trama e o elenco
Essa nova proposta, que passa longe da simplicidade da original, é ambientada quatro anos após o surto de zumbis que atingiu os passageiros de um trem-bala com destino a Busan. A península coreana ficou devastada nessa ocasião e Jung-seok (Gang Dong-Won), um ex-soldado que conseguiu fugir do país, tem a missão de retornar e surpreendentemente encontra alguns sobreviventes pelo caminho, com isso, precisa também lidar com a perversidade humana ao seu redor. Dessa premissa, o roteiro não retorna aos personagens do passado e decide seguir por um caminho mais denso, repleto de cenas mirabolantes de ação sem freio e menos momentos de terror e suspense.
Ao se afastar do desenvolvimento do horror, a sequência se aproxima bem mais do tom de filmes como ‘Guerra Mundial Z’ e até mesmo da franquia ‘Resident Evil’, algo que pode conquistar novos fãs, sedentos por cenas de ação espetaculares e que parecem terem sido tiradas diretamente de um videogame de survival horror, mas, por outro lado, certamente deve afastar quem se apaixonou pela forma em como a franquia estava construindo uma narrativa bem mais humana e dramática e, por conta disso, se destacava da enxurrada de filmes semelhantes.
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Essa expansão colossal de premissa realmente impressiona pela qualidade técnica. Seja pelas sequências sofisticadas de pura adrenalina, com carros e cenários feitos através do uso de computação gráfica, ou mesmo pelo design de produção, que possui identidade própria e apresenta um mundo devastado pelo caos, coberto de plantas e mortos-vivos, muito semelhante ao universo do game ‘The Last Of Us’. Até mesmo a fotografia, sombria, densa e carregada de cinza, eleva o longa para um patamar de grandiosidade e uma atmosfera sem igual.
O elenco, por sua vez, segue tão bom quanto o do primeiro filme. O protagonista, vivido por Gang Dong-Won, é a pura personificação de um herói clássico de “jogos de tiro”, já a dupla Lee Re e Lee Ye-won conquistam pelo carisma. Ainda que o roteiro abra mais espaço para a ação, o drama existe e se mantém forte, talvez mais forçado que antes, mas presente em toda a narrativa e que culmina em um desfecho emocional catatónico, que dilata o tempo apenas para estender, o máximo possível, as lágrimas do espectador.
A direção e o ritmo
Todavia, o grande (e certamente maior) problema de Invasão Zumbi 2, está exatamente nesse aumento de proporção em relação a expectativa do público. O uso exagerado de CGI e o ritmo desenfreado, ainda que divertidos de assistir, jogaram o charme da franquia pela privada. Tudo se tornou artificial em excesso e a simplicidade, o drama humano, servem apenas como uma leve camada agora, soterrada por toneladas de efeitos especiais e por uma ambição que pode levar a franquia à ruína em pouco tempo. Após meia hora de momentos desenfreados de perseguição pela cidade, o roteiro entorpece o espectador e a trama caminha maçante.
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A história, sem rumo, se repete diversas vezes até finalmente caminhar para o clímax, no entanto, acerta bastante quando mergulha nas relações pessoais, sejam dos personagens protagonistas ou mesmo com os demais sobreviventes do lugar. Outro fato interessante é que o diretor do original, o talentoso Yeon Sang-ho (Psychokinesis), retorna e tem a oportunidade de fazer o blockbuster que talvez o orçamento anterior não permitisse. Sua condução enérgica é um deslumbre visual e técnico e se prova um grande nome da ação sul-coreana, sem dúvida.
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Conclusão
Com isso, ao ser o ‘Mad Max’ dos filmes de zumbis, ‘Invasão Zumbi 2: Península’ sacrifica a simplicidade e algumas qualidades do primeiro filme e aposta em ser uma sequência grandiosa, desenfreada e carregada de computação gráfica, que expande a franquia para um caminho colossal, mas que também se perde em sua própria ambição. No entanto, ainda que tenha problemas irreparáveis no roteiro, a narrativa eloquente é imersiva, sombria e a sensação é de estar jogando um videogame de última geração. Está longe de ser um filme ruim, mas funcionaria bem melhor caso fosse independente, já que o original é menor, mais natural e, curiosamente, superior a esse.