Outra vertente forte da comédia romântica, que tem feito sucesso, é a comédia da crise de meia idade, que utiliza todos os elementos de filmes adolescentes, porém, em um contexto completamente diferente, protagonizada por personagens na casa de seus 40/50 poucos anos, que precisam se adequar à modernidade dos relacionamentos efêmeros atuais. Essa colisão de mundos, do jovem com o maduro, faz nascer obras diversas, que acertam mais do que erram, como é o caso de ‘Milf’, nova comédia francesa original da Netflix que está fazendo sucesso no catálogo. Dessa forma, outro diferencial que faz essa se destacar das demais, além do típico humor francês sofisticado, é a forma ousada e até mesmo corajosa de como o roteiro dá espaço para mulheres maduras assumirem o posto de protagonistas e, além disso, construírem desejos e relacionamentos com homens jovens.
Como o próprio título sugere, “milf” é um acrônimo em inglês que significa “Mom I’d Like To F*ck” (em português, “Mãe que eu gostaria de f*der”), e refere-se a um fetiche sexual com mulheres mais velhas com idade suficiente para serem mães de determinados parceiros mais jovens. Ao partir dessa premissa, a trama até surpreende ao se desligar de alguns estereótipos e piadas de mal gosto, para mostrar essas relações de amor e sexo com bastante bom humor e sensibilidade. O roteiro acerta em trabalhar a construção das relações, já que são três protagonistas e cada uma tem um ritmo de envolvimento diferente com os meninos de 20 e poucos anos que estão trabalhando em um clube de remo perto da casa onde elas estão passando uma temporada. No entanto, a trama encalha de uma forma tão severa, que parece não sair mais do lugar e se torna uma grande repetição de acontecimentos rotineiros.
Ao ver determinadas cenas, a sensação é de que há uma mulher por trás da direção, já que o olhar que conduz a narrativa é realmente dedicado e destemido em relação ao assunto abordado. E, de fato, há, Axelle Laffont, que também estrela o filme, é a responsável por não permitir que a obra caia em problemas ou que as personagens sejam hipersexualizadas, aliás, muito pelo contrário, dessa vez são os homens que são sexualizados e tem seus corpos exibidos de forma a provocar desejo no espectador. Porém, nessa busca para fugir de alguns estereótipos de um lado, acaba reforçando outros, como a padronização de beleza através de corpos magros e “definidos” e a ideia de que uma mulher mais velha só é desejada caso pareça uma jovem de 20 anos. Além disso, há pouquíssima representatividade e alguns diálogos perigosos por conta do elenco masculino. Esses detalhes se sobressaem ainda mais conforme a história não anda e se torna demasiadamente arrastada.
Por outro lado, o humor é bom e a química do elenco feminino é fantástica, visivelmente natural. O trio de protagonistas possui diferentes perspectivas e personalidades e isso fica bem evidente em cada uma delas. Uma, busca superar a perda do marido, outra acaba de ser traída e quer se vingar e a outra tem um espírito livre e apenas deseja aproveitar a vida que lhe resta. A energia e a atuação são boas e as piadas, de modo geral, funcionam quando estão dentro do trio, exatamente por conta da liberdade e naturalidade do elenco. Porém, fora do núcleo, o humor é extremamente fraco e constrangedor. Há bastante cenas de sexo e algumas até em mais explicitas do que se poderia esperar para esse tipo de filme. Felizmente, esse erotismo também é feito pelo olhar de uma diretora e o corpo feminino é tratado de forma condizente com as cenas propostas. Ainda assim, mesmo com essas qualidades inegáveis, a trama é vazia, superficial e termina na previsibilidade.
Dessa forma, ‘Milf’ funciona como um ‘American Pie’ da meia idade e até surpreende pela naturalidade que o roteiro trata relações amorosas tão distintas, fora isso, a química do elenco também ajuda a tornar o humor assistível, no demais, segue uma história vazia e superficial, que se apaga com facilidade da lembrança após certo tempo. O filme entrega exatamente o que se propõe e isso, infelizmente, não é o bastante para torná-lo delicioso de ser assistido. Ainda assim, deve agradar o público alvo e, com sorte, encorajar mulheres maduras a viver suas vidas sem medo do julgamento.