Crítica | Vitória – O tamanho de Fernanda Montenegro

O cinema da observação é sempre um cinema de risco. Afinal, tão importante quanto saber o que se observa, é saber quem observa. Poucos artifícios são tão manipulativos quanto a construção do olhar para que o espectador se encontre na narrativa, para que saibamos para onde olhar e o que observar. Vitória, filme cuja produção passou por mudanças significativas após a morte de Breno Silveira, seu diretor original, é um filme de observação e, por tanto, um projeto de natureza delicada, principalmente por retratar uma história real que começou e terminou dentro das favelas cariocas.

Os acertos e erros de Vitória

Podem ficar tranquilos que, ao menos aqui, não entraremos em qualquer mérito ou desmérito sobre o fato da Joana da Paz da vida real ter sido uma mulher negra, mas interpretada por Fernanda Montenegro na obra em questão, uma vez que o filme já estava gravado antes da morte de Joana e, portanto, sua identidade não era conhecida por fazer parte do Programa de Proteção às Testemunhas após desmantelar toda uma rede de tráfico com sua denúncias registradas por uma câmera filmadora.

Sem qualquer surpresa, a presença de Fernanda Montenegro se coloca acima de qualquer elemento do material – o que me parece um problema, dada sua temática e problemática. O roteiro de Paula Fiúza entente a figura de Nina (Montenegro) como essa força motriz da narrativa, mas é claudicante quanto tenta exercitar o olhar para fora da individualidade observacional de Nina – na verdade, é de se questionar se o filme tenta exercitar esse olhar micro para algo macro. E daí ressalto o quão é importante questionar quem observa e como observa.

Porque por mais que a protagonista de Montenegro seja a guia do nosso olhar, é difícil ignorar os fatos abordados pelo filme de Andrucha Waddington, genro de Montenegro, como algo a ser resumido ao que se olha daquele apartamento, daquela janela, daquele ponto de vista. Todas estas escolhas parecem limitar o escopo dramático que, no fundo, existe em Vitória, mas que é analisado somente até certo ponto para que a temática não ofusque a presença magnética de nossa querida atriz.

Prova disso é como o filme relega quase todos ao redor de Nina, pretos em sua maioria, a personagens que vão se fechar em arquétipos diminutos e já esperados dentro da temática de Vitória. Linn da Quebrada é a que mais sofre com essa ineficiência do filme em tratar e fotografar os corpos negros que fazem parte da rotina de Nina.

Montenegro, claro, é esse prazer gigantesco em cena como uma representante tão ativa do que uma profissional do nosso audiovisual é capaz. Com quase um século de vida, a atriz segue tão comprometida quanto sempre lhe vemos em tela, entregando uma performance que flutua entre a dramaticidade e a comicidade com uma leveza que se espera de uma profissional tão experiente. Quando questiona a passividade dos outros moradores de seu prédio, ela também confere uma intensidade e autenticidade que nos permite criar um laço de empatia por Nina e todo o terror que vive diariamente naquela vizinhança. 

Veredito

Não há em Vitória, entretanto, esse estofo dramático que o filme acredita possuir para além da presença de Fernanda Montenegro. A direção de Andrucha parece frouxa demais para tanto, e sobra o deleite de acompanhar mais um trabalho de uma das maiores representantes vivas da cultura do nosso país.

Nota: 5/10

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