Assistir a uma produção da Marvel Studios tem se tornado cada vez mais desagradável. Embora o estúdio seja mestre em planejar universos interconectados, seus filmes têm perdido identidade e profundidade a cada nova ideia que surge de Kevin Feige. Os cenários, por exemplo, muitas vezes parecem absurdamente artificiais e mal elaborados, mesmo com orçamentos exorbitantes. O aguardado Deadpool & Wolverine não é uma exceção a regra, mas sabe brincar com ela.
Após a aquisição da Fox pela Disney em 2019, havia muita especulação sobre como o Mercenário Tagarela se encaixaria no infanto-juvenil MCU, com seus filmes mais leves em relação à violência e palavrões. O resultado é exatamente o esperado: a franquia permanece intensamente violenta e, felizmente, com a total liberdade criativa do brilhante Ryan Reynolds e sua mente implacável em rir de tudo que existe na cultura pop.
Agora na Linha do Tempo Sagrada, Deadpool tem a missão de resgatar um Wolverine para uma aventura bizarra pelo multiverso no Lixão de descarte do cinema e, assim como a fase atual do estúdio, o filme é irregular, com altos e baixos, mas é indiscutivelmente a melhor produção que a Marvel ousou explorar no conceito de multiverso.
Mais do que um simples terceiro filme de um herói amplamente aceito pelo público, o longa consegue ser uma homenagem divertida ao fim da Era Fox. O projeto oferece um desfecho leve, mas significativo, para os super-heróis que marcaram a história antes do gênero se tornar o fenômeno que é hoje.
Índice
Os acertos e erros de Deadpool & Wolverine
De certa forma, criar um filme que quebra a quarta parede para resgatar, brincar e se despedir de um estúdio é um feito criativamente genial. No entanto, essa ideia quase ofusca o protagonista como o verdadeiro destaque do filme. Além disso, o longa enfrenta o desafio de reintroduzir Wolverine em um universo muito mais dinâmico, sem desrespeitar o legado de seu fim em Logan (2017).
Essa não é uma tarefa simples, mas o roteiro de Deadpool & Wolverine reconhece a complexidade narrativa envolvida, mesmo que a história seja simplificada e a trama quase inexistente, como era de se esperar. O objetivo agora é inserir Deadpool no mundo dos Vingadores, e, nesse cenário, o herói questiona sua integridade e a sua capacidade de se encaixar em um time de celebridades.
O resultado é melhor do que o esperado, oferecendo uma homenagem afetuosa aos heróis que não eram interconectados, enquanto mantém o mesmo nível impiedoso de violência que caracteriza a franquia.
Somos imediatamente atraídos pela química inigualável da dupla, pelo carisma irresistível de Ryan Reynolds e pela expressão carrancuda de Hugh Jackman, que claramente está se divertindo mais do que em qualquer outra versão do Carcaju nos cinemas.
No entanto, o que realmente torna o projeto especial é a maneira como eles abordam o passado com carinho. Embora o resultado pudesse ter sido desastroso, o filme sugere um futuro promissor para o MCU, que tem se mostrado inchado e sem foco desde Ultimato.
Apesar de apresentar as melhores piadas da franquia e um senso de humor perversamente afiado, a maneira como aborda o conceito de multiverso é a mais divertida até agora. Afinal, se há uma agência dedicada a corrigir problemas no tempo, certamente existe um lugar para descartar todas essas questões. Para nossa surpresa, até a Fox está lá, junto com a maioria dos super-heróis e vilões dos anos 90 e 2000.
Dentro dessa premissa, Deadpool precisa encontrar um Wolverine — a âncora de seu universo — para substituí-lo e, assim, salvar seu próprio universo. Claro, essa jornada os leva a explorar o repositório cinematográfico da Disney, resultando em uma verdadeira tempestade de aparições e easter eggs que causam mais impacto do que um filme com jump scares. É tanta auto-referência que chega dar dor de cabeça.
A vilã desta vez, a enfadonha unidimensional Cassandra Nova, interpretada por Emma Corrin, a irmã gemea de Charles Xavier, acaba sendo mais do mesmo e não deixa impacto algum na trama. Sua participação não contribui em nada para o desenvolvimento da história. É apenas mais um antagonista fraco na longa lista de vilões da Marvel.
Definitivamente, este não é um filme para crianças, e a inclusão do nome da Disney é uma mudança ousada que já estava mais do que na hora de acontecer. A linguagem irreverente de Deadpool e sua violência gráfica espetacular trazem ao MCU uma dose extra de audácia e sabor, afastando-se da certeza de que nada tem impacto.
O risco de trazer Hugh Jackman de volta após Logan ser um ponto alto do cinema de heróis era altíssimo, mas o filme demonstra que ainda há muitas histórias a serem exploradas e que Wolverine, independentemente dos recomeços futuros, merece ser honrado – e nem mesmo Kevin Feige pode mudar isso.
A solução apresentada é convincente nas mãos criativas de Shawn Levy (Free Guy), que a torna coerente e eficaz. O diretor, além de ter uma boa sintonia com o elenco, compreende que o verdadeiro atrativo desse projeto está no texto ácido e em como ele é traduzido para as imagens, mesmo que envolto em exageros.
A química entre os astros é uma conquista rara. O filme não é um confronto direto entre eles, mas sim um espetáculo contínuo de destruição mútua, xingamentos e ataques, tudo em nome do entretenimento. É um casamento imperfeito ao som de Madonna e clássicos dos anos 2000.
Veredito
Entre ser um concurso barato de cosplay e um parque de diversões temático da falecida Fox, Deadpool & Wolverine é, de fato, o auge do multiverso no cinema — para o bem e para o mal. A diversão e a autorreferência ofuscam os problemas da trama e a produção extremamente precária dos cenários econômicos. Com seu senso de humor irreverente e uma ação profundamente violenta e brutal, Deadpool está melhor do que nunca dentro do MCU.
E é basicamente isso que temos: um filme repleto de participações especiais chocantes, ambientado no lixão de descarte da Disney onde, sem exagero, tudo parece possível. Trata-se de uma verdadeira farofa cinematográfica que oferece surtos, gritos e uma dose generosa de nostalgia. O material autorreferencial é imprevisível e incisivo como deve ser.
É corajoso ver como o roteiro não hesita em tocar em aspectos que podem desafiar a integridade do MCU ou mesmo irritar os fãs. Deadpool parece um twitter de uniforme e sua acidez e ousadia faz deste o projeto mais perigosamente delicioso do gênero. Longe de ser o messias da Marvel, mas também longe de ser tão ruim quanto seus fracassos recentes. Finalmente o MCU tem uma comédia absurda e genuína que realmente faz a nossa barriga doer de tanto rir. Obrigado, Ryan Reynolds.
NOTA: 7/10
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