Crítica | Pantera Negra: Wakanda Para Sempre – Uma carta de amor em um acerto gigante da Marvel

“Apenas as pessoas que mais sofreram podem ser grandes líderes”

Esta é a frase que mais marcou a minha experiência ao assistir o novo filme da Marvel. Não só porque ela tem seu embasamento — basta olhar o registro histórico de líderes do mundo —, mas também porque ela define e sintetiza a essência do que é Pantera Negra: Wakanda para Sempre, longa dirigido por Ryan Coogler. Tudo que acontece em tela, nas linhas e entrelinhas do que é dito, é sobre o luto. Não só sua forma mais brusca e impactante, mas também em como este sentimento universal define as pessoas. 

Pantera Negra: Wakanda Para Sempre engloba vários tipos de filme dentro de um, mas o seu núcleo é sobre pessoas que sofreram e como elas podem se reerguer para liderar. E é no meio deste luto e desta jornada que o longa reacende uma chama há muito apagada: a Marvel nem sempre acerta, mas quando acerta não há nada igual no cinema blockbuster. E que acerto!

A sequência começa já explicando a ausência de T’Challa, que era interpretado por Chadwick Boseman (ele morreu em agosto de 2020, vítima de câncer). Coogler não discorre muito sobre isso, mas fica claro que o herói de Wakanda teve alguma complicação de saúde. A partir disso, com uma introdução emocionante, silenciosa e crua, o longa dá início à jornada que o diretor se propõe a contar.

Desta vez, a história parece muito menos focada em Wakanda como um todo, ainda que a nação estampe o título. Ryan Coogler expande os horizontes da franquia ao apresentar a nação submersa, Talocan, liderada pelo antagonista Namor (Tenoch Huerta). O personagem é uma grande adição à mitologia do Universo Marvel não só por seus poderes, mas por seus dilemas. Assim como Killmonger (Michael B. Jordan) no primeiro filme, não temos um vilão propriamente dito. Em vez disso, um anti-herói que, em alguns momentos, pode até soar compreensivo. Huerta sabe bem como conduzir o papel, que não cai em estereótipos já conhecidos dentro do MCU. Ele é um antagonista relevante, com um ar de mistério e complexidade que fazem dele um dos personagens mais interessantes desta fase 4.

De novo, vemos um conto sobre a força do imperialismo e também uma justificativa pela defesa do lar. Apesar do núcleo em Talocan ser o menos interessante do filme, especialmente por conta de algumas decisões visuais de Coogler (é impossível não se incomodar com os efeitos dos personagens debaixo da água, ainda mais com o que Avatar 2 já mostrou apenas nos trailers), Namor é interessante. Ele rouba algumas cenas e estabelece um padrão de qualidade de antagonistas para esta fase 4 do MCU — algo que só pudemos ver, até agora, em Kang, de Loki.

A fórmula funciona, apesar da repetição. Além do anti-herói, a presença de Riri Williams (Dominique Thorne) é muito bem-vinda. Ela surge como a pessoa a carregar o manto do Homem de Ferro. Sinceramente? Não há ninguém melhor para isso. Apesar do visual terrível da armadura e das cenas de voo possuírem alguns problemas de CGI, a presença dela no filme é apenas um gostinho do que vem pela frente — e é algo bastante animador —, mas já é o suficiente para deixar qualquer um apaixonado pela personagem.

Todavia, mais do que seguir apenas com inserções de novos personagens, Coogler vai além do próprio gênero ao contar esta história. O filme tem os dois primeiros atos bem distintos de qualquer outro longa de herói que foi lançado nos últimos anos. Chega a lembrar muito Capitão América: O Soldado Invernal, que possuía uma trama muito mais voltada para espionagem e ação urbana. 

Neste caso, quando a história sai de Wakanda nas primeiras vezes, Pantera Negra: Wakanda Para Sempre parece um filme de resgate aos moldes Velozes e Furiosos (no melhor dos sentidos). As cenas de perseguição são eletrizantes, a ação é compassada e bem filmada e o próprio ritmo do filme parece ir em uma vertente diferente do que é comum nos filmes do gênero herói: em vez das apresentações padrão de antagonistas, objetivos, objetos de poder/missão, luta desenfreada, conflito e conclusão, o novo Pantera Negra escapa disso e, em vários momentos, parece um filme de ação. Não são raros os momentos que o longa lembra Missão Impossível — e mesmo quem não é o maior fã disso vai receber bem a notícia, porque tudo isso é bem traçado ao lado da jornada que a protagonista percorre. O problema fica mais no último ato, que recai no padrão de super-herói e recorre a algumas das soluções mais fáceis vistas na Marvel — é terrível como qualquer explicação parece o suficiente se vem da boca de algum personagem que é um super-gênio.

Entretanto, o foco é no conto do luto, que é alinhado com uma busca por vingança por parte de Shuri (Letitia Wright). Depois que Namor ataca Wakanda, ela vai atrás dele para matá-lo. E aí que mora o grande feito de Coogler. A história de vingança não é uma novidade em Hollywood, mas ganha um peso diferente dentro do contexto de perda que esse filme traz por natureza. E isso também é mérito das protagonistas: Shuri, Rainha Ramonda (Angela Bassett) e Okoye (Danai Gurira) vivem o mesmo luto, ainda que de formas diferentes. A força delas em tela, alinhada com a vulnerabilidade e ternura que possuem em momentos específicos, é uma das coisas mais lindas que o cinema viu nos últimos tempos. Além disso, é incrível ver como as três, cada uma à sua própria forma, carregam o manto de Chadwick Boseman.

Para isso, a fábula dos ancestrais, contada desde o primeiro filme e que constantemente relembra a personagem que aqueles que morreram não se foram eternamente, é essencial. Eles continuam aqui de alguma forma. E a presença de T’Challa é o grande diferencial deste filme.

Chadwick Boseman não está mais entre nós, mas é como se ele estivesse em cada cena do filme. É claro como esta é a carta de amor que Ryan Coogler escreveu para ele e sua forma de honrar o amigo. O apelo emocional é quase desnecessário, mas, mesmo quando inserido, é sutil, terno e gentil.

Apesar disso, Pantera Negra: Wakanda Para Sempre tem alguns problemas com ritmo. Suas duas horas e quarenta minutos de duração garantem isso, ainda que, de alguma forma, sejam necessárias para a narrativa complexa e cheia de novos personagens que Coogler apresenta. Apesar desta falta de dinamismo em alguns momentos, este é com certeza o mais perto que a Marvel chegou de alcançar o nível de entretenimento que vimos pela última vez em Vingadores: Ultimato. Desde então, existe um senso de falta de essência ou pelo menos de baixa no nível de qualidade. É um filme emocionante com uma história que sabe trabalhar bem sua protagonista e que às vezes até se esquece do gênero de herói — e isso é incrível. 

Por fim, muito tempo atrás, quando Chadwick Boseman se foi e Ryan Coogler começou a trabalhar no filme, o diretor disse que, durante todo o processo, sentiu como se o amigo estivesse com uma mão no seu ombro. Ao fim da sessão, foi exatamente o que senti. Como se o nosso eterno Pantera Negra estivesse vivo em cada cena, em cada diálogo, em cada lágrima. No fim das contas, cinema é isso. Cinema é sensação. E goste ou não do novo Universo Marvel, é impossível que você saia da sala depois de ver este filme sem sentir algo e com um sorriso no rosto ao pensar que é verdade mesmo. Wakanda é para sempre.

Nota: 8/10

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