Para os fãs e admiradores do livro Uma Garota de Muita Sorte (Luckiest Girl Alive), romance de estreia mais vendido da autora Jessica Knoll em 2015, sobre a vida aparentemente perfeita de uma mulher corroída por traumas do passado, resta dizer que – assim como tem se tornado rotina – a adaptação da Netflix não faz jus ao seu valor. Toda a sagacidade da obra à frente de seu tempo se transforma em um hino de empoderamento que não reverbera, muito por conta de uma produção extremamente superficial e mal desenvolvida.
A versão cinematográfica, dirigida por Mike Barker a partir de um roteiro de Knoll, sofre do mesmo mal que assola Um Lugar Bem Longe Daqui, lançado este ano nos cinemas, outra adaptação de um sucesso literário sobre uma protagonista feminina irregular, que herda falhas caóticas do seu material de base. Ao desejar ser mais profundo e ideológico do que suas mãos podem alcançar, ambas as produção desenvolvem uma trama fraca e inserem um final que possa cair bem e casar com o movimento #MeToo, mesmo sem segurar tal importância.
A trama e o elenco
Neste filme, há uma energia semelhante ao polêmico Garota Exemplar, de David Fincher, uma vez que ambas as obras falam sobre o abismo entre o presente traumático e o passado conturbado de uma mulher branca bem-sucedida. Uma trama carregada de questões femininas importantes de serem discutidas nas telas, mas pouco carinhosa com seu público. Essa vertente do cinema feminista, ainda que bem intencionado em promover debates e questionamentos, carrega uma herança que falha por si só: ter um olhar masculino na direção.
Aqui, Mila Kunis (Amizade Colorida) vive Ani, uma bela e bem realizada mulher cheia de charme e dinheiro, noiva de um jovem igualmente chamativo, vivido por Finn Wittrock (que parece ter nascido para viver playboys mimados), ou seja, como diz o título da obra, parece mesmo ser uma típica “garota de sorte”, obcecada por status e por beleza. Ani narra sua trama de forma ácida e sagaz, mas logo flashbacks mostram que seu passado não foi nada feliz, que ela é uma sobrevivente de um massacre numa escola e que uma grande reviravolta está por vir. Porém, as rachaduras do roteiro surgem logo no começo.
Ao retornar ao passado para mostrar a realidade por trás de tantos traumas adultos, sua narrativa se fragmenta e entrega respostas importantes antes da hora, algo que tira parte da graça do mistério e faz a grande e prometida reviravolta morrer antes mesmo de chegar ao seu clímax. E olha que Kunis faz o possível para segurar a dor frágil de Ani, mas seu desempenho fica na zona de conforto e se afoga em clichês baratos.
No lugar de cumprir a promessa de ser um drama feroz e realista sobre a vítima de uma tragédia cuja dor foi totalmente incompreendida e desacreditada, o longa se perde em previsibilidades e atuações sem carisma algum, recheadas de falta de ritmo da direção e uma duração absurdamente cansativa para o pouco de enredo que possui.
Conclusão
No fim das contas, apesar do título, quem não teve sorte mesmo foi o espectador de Uma Garota de Muita Sorte, que precisa se contentar com um drama arrastado, massivo e mal trabalhado por uma adaptação que passa longe da essência feminista de sua obra original. O carisma e senso de humor de Mila Kunis não segura nem meia hora dessa história desinteressante.
Ainda assim, por mais fragmentado que seja, a obra lida com assuntos sensíveis, reais e gera debates importantes sobre sobreviver com traumas. Uma oportunidade perdida que precisava de uma escrita e direção muito melhores para atingir seu nível de provocação.
NOTA: 3/10
Leia também: Qual a verdade por trás? Entenda o final de Uma Garota de Muita Sorte
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