É péssimo dizer isso mas, definitivamente nem todo filme funciona para todos. E não tem nada a ver com inteligência ou questões sociais, é que algumas obras simplesmente se conectam mais com alguns do que com outros. Quando dizem que “filme tal não é para todos”, certamente Men – Faces do Medo é um deles. A obra da A24 – que chega ao Brasil pela Paris Filmes – se encaixa no polêmico movimento “pós-horror” e é, em suma, sobre muitas coisas. Tentar desvendá-lo é um desafio asfixiante, sendo o mais importante desses desafios a masculinidade tóxica.
A trama e o elenco
Assim como em todas as suas obras anteriores, Alex Garland tem muito a dizer e pouco se importa se a comunicação é nítida (e alerta de spoiler: nunca é!). Ir ao cinema esperando que Men: Faces do Medo seja um filme de terror convencional é o passaporte para o arrependimento.
Dessa vez, o cineasta por trás de Ex Machina e Aniquilação, cria um conto perturbador sobre misoginia e sexismo, mas passa longe de proporcionar um horror simples de ser consumido. Abarrotado de metáforas e significados ocultos, a trama acompanha Harper (Jessie Buckley), uma mulher que recentemente presenciou o suicídio de seu marido abusivo e que decide viajar para a zona rural da Inglaterra em busca de se curar do trauma. Porém, lá encontra um mal que não pode ser superado.
Para isso, Garland coloca o espectador num folk horror atmosférico, que se sustenta muito por conta das ótimas performances do elenco e do tom grotesco do terror visual. A forma como a natureza interage com a trama e como a protagonista parece envolvida nesse ambiente que vai do sublime ao claustrofóbico, é feita, em partes, pela entrega honesta de Jessie Buckley (A Filha Perdida), se provando uma das melhores atrizes de sua geração.
Já Rory Kinnear (Penny Dreadful) – absolutamente assustador no papel – cria um contraponto ao viver os vilões da trama, uma evolução constante de homens abusivos que dominam o mundo ao nosso redor. Se a narrativa lenta não fisga de início, certamente a ambientação úmida, sinistra e verde envolve o público no mistério.
Ainda que a atuação silenciosa de Buckley possa dizer muito com pouco, o filme constantemente promete bem mais do que entrega e, por vezes, se perde dentro do próprio caminho sinuoso que cria nessa floresta obscura, culminando num desfecho aterrorizante, grotesco e patético que, aliás, são boas palavras para descrever o comportamento tóxico de homens.
O misto de pesadelos vívidos com cenas bizarras, recheadas de nudez e sangue, mostra o quão desesperado o diretor está em gravar na nossa mente as mensagens ocultas da obra. No entanto, para isso, acaba por ser mais incisivo do que a própria proposta discreta do filme. O roteiro de Men: Faces do Medo é visceral, mas torna-se difícil não desejar alguma mínima explicação para onde tudo aquilo está indo. É frustrante.
A direção
Que Alex Garland é visionário em subverter os clichês de gêneros, isso nós já sabemos, mas a sensação é de que o diretor parece cada vez mais imerso no seu próprio subconsciente e cada vez menos preocupado em criar algo “lógico” (Lars von Trier, temos visitas!). A arte, sendo algo subjetivo, não necessita de manual para ser assistida, mas isso também exige um mergulho muito mais intenso e profundo do que ir ao cinema comer pipoca com um filme cujo subtítulo nacional é “Faces do Medo”, não é mesmo?
Em Men, o diretor – imerso no privilégio masculino – cutuca o espectador o tempo todo com um espetáculo de referências bíblicas e imagens sobre mitos e lendas, mas nunca consegue, de fato, concluir seu pensamento. Ele quer questionar (e satirizar) os homens que governam o mundo, o sexismo e a opressão social que mulheres vivenciam todos os dias desde o nascimento, mas as boas ideias são vagas demais, vazias demais. Ou seja, muito parecido com Mãe! do Darren Aronofsky, ou senta e aprecia o show ou vai embora sem compreender sua mensagem. E, sendo homem, o desconforto é fantástico e bem extraído. Isso por si só já vale o ingresso.
Conclusão
Atmosférico e grotesco, Men – Faces do Medo leva o simbolismo para o próximo nível ao retratar a masculinidade tóxica dos homens que dominam nosso mundo. Como um pesadelo vívido, o diretor Alex Garland condensa o sexismo em algo visual e aterroriza através cenas bizarras e sublimes, que levará tempo para sair das nossas cabeças. Mas não espere um filme de terror tradicional ou mesmo sustos comuns, Men é complexo, estranho, uma alegoria que, infelizmente, não é para todos o púbicos. Sendo assim, o desconforto visceral cresce dentro de nós como uma semente.
NOTA: 8/10
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