Crítica | X: A Marca da Morte – Uma carta sangrenta de amor ao cinema slasher

A capacidade de reinvenção faz do terror um dos gêneros mais sobreviventes do cinema. E quando a inovação não é uma opção válida, aderir ao humor, a paródia, e rir de seus próprios clichês, sem dúvida, é um nível de maturidade que poucos cineastas sustentam. Felizmente, para nosso deleite em um ano tão fraco como 2022, o diretor e roteirista Ti West entrega sua obra mais espirituosa até então, o terror X: A Marca da Morte, uma sangrenta carta de amor ao cinema slasher – assim com o uma perfeita reestruturação do gênero sem perder a essência dos clássicos.

O filme da aclamada A24 – que chega ao Brasil pela PlayArte – se baseia nas influências dos filmes de terror dos anos 1970, ao mesmo tempo em que explora o sexo em diferentes idades e perspectivas. O resultado é um soft porn de qualidade, bem ritmado e inteligente, consciente de seus estereótipos e repleto de temas fascinantes que vão muito além de jatos de sangue e gritos estridentes. Assim como a franquia Rua do Medo fez recentemente, X acende a chama do subgênero, mas se mostra apto para subvertê-lo quando necessário.

A trama e o elenco

Situado em 1979, X: A Marca da Morte começa com um casal de policiais chegando ao local de uma antiga fazenda no Texas. Eles estão enojados com o que veem e, à partir disso, o filme deixa claro que temos um Massacre da Serra Elétrica pela frente. Com um flashback convencional, o enredo volta para mostrar o que aconteceu no lugar nas últimas horas e revela uma trama intrincada e totalmente sinistra ao acompanhamos o arrogante Wayne (Martin Henderson), que deseja fazer filmes adultos e recruta a namorada Maxine (vivida pela excelente Mia Goth) – uma aspirante a atriz que quer se tornar uma grande estrela de Hollywood – para estrelar o filme pornô A Filha do Fazendeiro.

Juntando-se a eles nesta jornada cinematográfica estão as co-estrelas de Maxine, Bobby-Lynne (Brittany Snow), Jackson (Kid Cudi), o diretor RJ (Owen Campbell) – que não quer fazer um pornô simples, mas sim um grande filme cult – e Lorraine (Jenna Ortega), namorada de RJ que é tímida e conservadora. Eles começam a filmar pouco depois de chegarem a uma casa de fazenda que Wayne alugou de Howard (Stephen Ure) e sua misteriosa esposa Pearl, um casal assustador que vive isolado no lugar. Cenário estabelecido, agora vamos para o horror.

Entre uma cena e outra de sexo, o roteiro ganha força e suspense ao explorar as reações de Pearl à pornografia e ao ato sexual de forma geral. Especialmente por conta do profundo desejo que ela ainda sente por isso. Grande parte de sua frustração vem do fato de ela querer ser tocada e seu marido hesitar em fazer sexo com ela porque ele poderia ter um ataque cardíaco e morrer pelo esforço.

Isso cria uma distância entre eles, mas algo desperta em Pearl com a chegada do grupo jovem. Não apenas o fascínio pelas meninas – em especial Maxine e a estranha conexão que ambas possuem – mas também uma fúria e desejo por sangue que a domina, fruto de muita raiva e frustração contida. O roteiro utiliza sabiamente o sexo como instrumento para mover a trama pra frente. E Mia Goth (Suspiria), uma das melhores atrizes de sua geração, brilha em absolutamente todos os sentidos.

A direção

O que faz X se destacar da mesmice de outros filmes é exatamente a maneira como subverte as expectativas do espectador, fruto de uma direção engenhosa e competente de Ti West (Hotel da Morte), um diretor sem grandes feitos na carreira, mas que parece ter assistido toneladas de slashers para compor esse seu universo sexual farto de sangue. As motivações do casal de idosos se mantém no escuro, algo que dá ao público brecha para construir sua própria interpretação dos fatos, ainda que seja evidente o desejo de Pearl por sexo. Sem transformar isso em um tabu ou motivo para vergonha, há até mesmo espaço para reflexões sobre libido na velhice.

Mas, como um bom e clássico slasher, o sangue e o gore em si são abundantes. O diretor de fotografia filma cenas de morte de diferentes ângulos, algo que amplifica cada momento de violência e aumenta a angustia de quem está assistindo. As sequências de terror são intensas e repletas de sustos convincentes e divertidos que, mais uma vez, subvertem clichês – ainda que utilize muitos deles para criar uma espécie de zona de conforto no espectador. Até puxar o tapete e apavorar com imagens bizarras que vão ficar nas lembranças por bastante tempo, mesmo sem mergulhar tão profundamente quanto poderia em alguns detalhes, algo que deve ficar para a já anunciada prequel sobre o passado de Pearl, que estreia ainda em setembro desse ano.

Conclusão

De longe um dos melhores filmes do ano, X – A Marca da Morte presta homenagem ao cinema de horror desprovido de medo de abraçar as peculiaridades e o senso de humor dark do slasher em sua mais pura e sanguinolenta essência, sem que, para isso, precise sacrificar um ótimo enredo em prol de apenas agradar ao público. O sangue jorra, mas também há fluidez de uma história divertida, inteligente e que subverte todas as nossas expectativas.

Um tipo raro de filme que nos coloca dentro da mente perversa do vilão – neste caso, da bizarra vilã Pearl – enquanto explora uma série de reviravoltas surpreendentes e nos faz refletir sobre temas de sexualidade, julgamento e, claro, religião. Com isso, tem tudo para ser o novo clássico cult do gênero.

NOTA: 9/10

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