As atuais discussões em torno da validade das adaptações de histórias em quadrinhos como sétima arte soariam inacreditáveis há poucos mais de 20 anos, quando os principais expoentes desse gênero ainda eram Superman (1978), Batman (1989) e Blade (1998). Com a consolidação do MCU, DCEU e do próprio gênero, as adaptações de games ainda estão bem longe do mesmo status e, consequentemente, são uma incógnita na indústria cinematográfica. Em quase trinta anos de filmes desse gênero, poucos títulos conquistaram aprovação de crítica e público (e/ou uma boa bilheteria), vide Mortal Kombat (1995), Silent Hill (2006) e Castlevania (série de animação do Netflix, 2017-2021). Entretanto, o sucesso recente das adaptações de Sonic podem ter iniciado uma nova era nas adaptações de games para o cinema e a televisão.
Repleta de franquias de sucesso nos anos 80, 90 e 2000, porém mal administradas após sua saída do mercado de hardware em 2001, a Sega obteve um ótimo retorno nos últimos anos com continuações e remakes de algumas de suas principais franquias. Foram os casos de Sonic Mania (que concorreu na categoria “Melhor Jogo Familiar” no The Game Awards 2017), Streets of Rage 4 (por sua vez concorreu na categoria “Melhor Jogo de Ação” no The Game Awards 2020), Alex Kidd in Miracle World DX (2021), ToeJam & Earl: Back in the Groove (2019), dentre outros.
Numa parte considerável de sua existência como fabricante de consoles domésticos e portáteis, a Sega teve pouco apoio de empresas third-parties, fazendo-a produzir jogos de todos os gêneros lúdicos possíveis para suas próprias plataformas. Outra característica importante da Sega foi o apelo ao público adolescente e adulto por meio de conteúdo mais maduro, como estratégia de diferenciação em relação à Nintendo, que historicamente possui um conteúdo family friendly. Dessa grande diversidade de jogos próprios produzidos, há as propriedades intelectuais (intellectual property, ou IP), como por exemplo, Altered Beast, Golden Axe, Shinobi e ToeJam & Earl; e os licenciados, como por exemplo os clássicos com personagens da Disney, como Castle of Illusion e QuackShot.
Em 2014 a Sega terceirizou para as empresas Stories International e Circle of Confusion a tarefa de fazer parcerias com estúdios audiovisuais grandes com o objetivo de produzir adaptações cinematográficas de suas franquias famosas. Figuras como Kevin Feige demonstram a essencialidade de um produtor competente, que conhece profundamente as obras e personagens, seus públicos e que sabe como transpor bem a essência dessas obras para outras mídias.
Dentre os maus exemplos de adaptações do passado, tivemos principalmente os filmes do cineasta alemão Uwe Boll (The House of the Dead, Postal, Far Cry, Alone in the Dark, Bloodrayne, dentre outros), além de bombas como Super Mario Bros. (1993), Street Fighter (1994), a franquia Resident Evil, Tekken(2010), The King of Fighters (2010), e o recente Resident Evil: Bem-vindo à Raccoon City (2021).
No início de 2020 tivemos o primeiro resultado dessa nova empreitada da Sega: Sonic, o Filme(Sonic The Hedgehog). Apesar da pandemia, a bilheteria do filme foi boa (mais de US$ 319 milhões no mundo todo) e garantiu uma sequência. Lançada esse ano, Sonic 2 já é um sucesso de bilheteria (US$ 289 milhões, até agora), fazendo com que a Paramount já garantisse um terceiro filme do ouriço azul e uma série derivada estrelada pelo equidna Knuckles. Adaptações recentes de games também obtiveram ótimos números, como Pokémon: Detetive Pikachu (2019) (US$ 433 milhões) e Uncharted (2022) (US$ 392 milhões), afastando de vez a maldição das adaptações ruins de games.
Recentemente foi anunciado a adaptação do clássico beat ‘em up Streets of Rage, que será roteirizado por Derek Kolstad, criador de John Wick. Lançados para o Mega Drive no início dos anos 90, os jogos da série Streets of Rage mostra jovens ex-policiais enfrentando uma organização criminosa que dominou a polícia e o governo local e tornou a sua cidade um lugar violento e inseguro. Com mecânicas co-op inovadoras para a época, uma bela ambientação urbana e uma das melhores trilhas sonoras de todos os tempos (produzidas por Yuzo Koshiro), a série tornou-se sinônimo do gênero beat ‘em up e conquistou uma legião de fãs no mundo inteiro. Dentre continuações oficiais canceladas e fangames lançados entre o recente quarto jogo e o terceiro lançado em 1994, é bastante compreensível que Streets of Rage seja uma das mais aguardadas para uma adaptação nas telonas.
Em termos de universos cinematográficos, há experiências bem-sucedidas (MCU e DCEU) e as mal sucedidas (Dark Universe, do Universal Studios), de modo que essa possível empreitada da Sega poderia ser pioneira no âmbito dos games. Apesar da diversidade de jogos de gêneros diferentes produzidos pela empresa, muitos dialogam entre si em fatores como gênero ficcional, ambientação e período, podendo vários deles serem facilmente integrados num só universo. Por exemplo, jogos como Streets of Rage, Shinobi, Yakuza e Shenmue podem tranquilamente se passar num mesmo universo focado no gênero ação, explorando a violência urbana em filmes com classificação PG-13. Por sua vez, Sonic, Alex Kidd, Ristar, ToeJam & Earl e Nights também podem compartilhar o mesmo universo, com filmes, animações e séries do gênero aventura direcionados para o público infantil.
A alta demanda por conteúdo inédito e exclusivo pelos serviços de streaming – por sinal num mercado cada vez mais competitivo – aumenta exponencialmente as chances do surgimento de adaptações de games e uma possível integração em universos cinematográficos compartilhados. A Netflix já possui um longo histórico de investimento em séries de games, vide Castlevania, Arcane, DOTA, Dragon’s Dogma, Cuphead e Resident Evil; a Paramount+, com Halo e a vindoura Knuckles; a Amazon Prime, com as anunciadas Fallout e Mass Effect; e por fim a HBO com a aguardada The Last of Us. Portanto, agora não é mais uma questão de “se”, mas “quando”.
Autor: Rodrigo Brandão
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