Crítica | Sempre em Frente – Um abraço apertado aos corações solitários

Com a sensível e honesta proposta de mergulhar na intimidade dos laços familiares de uma relação construída através do carinho e da empatia, Sempre em Frente (C’mon C’mon) – drama da A24 que chega ao Brasil através da Diamond Films – explora delicadamente temas cruciais como solidão, saúde mental e desenvolvimento de personalidade ao abraçar o amor genuíno entre um tio e seu sobrinho. Apesar de ter ficado de fora do Oscar, o longa possui todas as características convencionais da premiação e brilha por fazer algo tão imensamente raro no cinema atual: ser simples, direto e eficaz em sua intenção.  

A trama e o elenco

No enredo, envolto por uma áurea de melancolia nostálgica, atenuada pela belíssima fotografia em preto e branco que remete as memórias de momentos singulares que um dia vivemos, Joaquin Phoenix (Coringa) interpreta Johnny, um jornalista de rádio que viaja pelo país entrevistando adolescentes sobre seus pensamentos sobre o futuro. Ele não tem esposa, filhos ou família para falar, exceto sua irmã distante, Viv (Gaby Hoffman). Eles não se falam há mais de um ano, no entanto, uma necessidade os faz se reaproximar e, durante um momento de solidão, passa a cuidar de seu sobrinho, Jesse (Woody Norman), uma criança de cheia de sonhos e, ao mesmo tempo, reprimida por não se encaixar no mundo.

Dessa premissa simplista, nasce uma trama contemplativa, por vezes poética, carregada de sentimentos ocultos sobre detalhes do dia-a-dia que não damos atenção, como por exemplo, o fato de parar para escutar uma criança e adentrar em sua visão única e inocente do mundo ao redor, afinal, temos muito a aprender com a espontaneidade e sinceridade delas. Jesse vê em Johnny uma figura paterna que nunca teve e isso fortalece seu senso de autonomia, no entanto, Johnny também encontra nessa relação uma razão para viver, algo que preenche as lacunas cinzas da sua solidão adulta. Ao explorar esse lado mais doce e natural, totalmente oposto de seu último grande trabalho, a performance de Phoenix impressiona pelo nível autêntico de honestidade. Porém, nada supera a deliciosa e divertida química alcançada entre a dupla. Woody Norman é uma surpresa mágica e conquista por sua inteligência e carisma. Com isso, o texto verborrágico e repleto de reflexões sobre a vida flui com bastante leveza.

A direção

Mesmo com todas as qualidades inegáveis, ainda assim, Sempre em Frente sofre por nunca ter um momento grande, ousado e emocional, mas vários momentos contemplativos discretos. O roteiro não possui ápices catárticos e o ritmo pode (e sabemos que vai) afastar parte do público interessado em mais ação. Com uma condução lenta, mas imersiva e emocional como nunca alcançado em sua carreira, o cineasta Mike Mills (Mulheres do Século 20) acerta no tom sensível e empático e entrega momentos impossíveis de não derrabar uma lágrima, mas teria sido ainda mais enriquecedor para o diálogo e forte para a narrativa se o roteiro se aprofundasse nas questões do menino e sua saúde mental, já que há diversas pistas sobre sua bipolaridade e autismo. No lugar disso, o diretor optar por recortar apenas os momentos mais doces, sem grandes conflitos.

Conclusão

Através de seu tom melancólico e emocional, Sempre em Frente alcança uma química rara entre o elenco e se mostra um belíssimo exercício terno e amoroso sobre nossa busca por conexão, sobre os vínculos que formamos na vida e, acima de tudo, sobre as lembranças que um dia esquecemos. A doçura simples do roteiro – somada a uma direção contemplativa – mergulham na intimidade de seus personagens e provam que temos muito o que aprender com a sensibilidade das crianças.

Não é para todos, mas trata-se de um filme sobre saber ouvir e se colocar no lugar do outro. Ainda que possa ter momentos maçantes e arrastados por conta do fluxo constante de reflexões, sem dúvida o drama faz cócegas no lugar certo ao emocionar pela vulnerabilidade e fazer rir pela simpatia. Ao irmos à diante na vida, talvez nos esqueçamos de algo primordial para superar as decepções de ser adulto: a espontaneidade. E sobre isso, a história aquece o coração e ressoa por um bom tempo depois da sessão.

NOTA: 9/10


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