Crítica | Eternos – O ambicioso próximo passo do Universo Marvel

Eram os deuses, super-heróis? Na nova e ousada aposta da Marvel Studios, Eternos (Eternals) – que visa dar uma origem alienígena à criação do universo – a resposta é sim.

Após uma duradoura saga que explorou e fundamentou todo o Universo Cinematográfico da Marvel, parece que o caminho mais óbvio agora é tirar algumas cartas inéditas do baralho, fazer retcons habituais aqui e ali e – antes de caminhar para o próximo grande crossover – brincar com alguns personagens promissores.

É evidente que a Marvel está encontrando dificuldades de se reinventar após 13 anos desde que o Homem de Ferro abriu as portas para a maior franquia de filmes da história do cinema? É sim. Mas e se o “próximo passo” estiver escondido nos detalhes? E de detalhes Chloé Zhao sabe bem.

A diretora – ganhadora do Oscar por Nomadland – possui uma narrativa extremamente singular, baseada no contemplativo e no longo desenvolvimento dos personagens humanos. Como então encaixar algo tão dramático e fora do mainstream em um filme de super-heróis cuja fórmula Marvel não pode ser dispensada?

Bom, é aí que habita os maiores problemas de Eternos, ainda que, de certa forma, seja também a sua grande qualidade. Ou seja, na corda bamba entre inovar e desenhar dentro da linha, a diretora entrega um filme para ser digerido com os olhos, repleto de personagens carismáticos, mas que não funciona tão bem quando o assunto é “Ok, Thanos passou, e agora?”. Na real – e mais uma vez sem sucesso – o MCU busca respostas em um passado que nunca fundamentou.

A trama

É fato que 2021 foi um ano cheio de filmes retroativos. Viúva Negra saiu no tempo errado, Shang-Chi não vai para lugar algum e agora Eternos tenta nos convencer de que, assim como o clássico livro de Erich von Däniken, os alienígenas foram os responsáveis pela criação da humanidade, dando aos seres humanos as ferramentas corretas para se desenvolverem, prosperarem e chegarem onde estão hoje.

Dessa premissa, a trama constrói o imaginário de que esses “deuses”, os Eternos, foram criados por seres galácticos poderosíssimos, chamados Celestiais – uma raça alienígena que, literalmente, germina os planetas em busca de criar novas galáxias. Porém, nosso grupo de 10 heróis começa a descobrir que nem tudo é o que parece ser e a razão para sua existência pode significar algo muito maior e, consequentemente, apocalíptico.

Ao ir e vir do passado – mostrando o início da Mesopotâmia e a criação da Babilônia – a trama centraliza no presente, 5 anos após o estalar de dedos de Thanos e com os Deviantes – outra raça criada pelos Celestiais – sendo a grande ameaça do momento.

O roteiro, por sua vez, precisa lidar com o desafio de desenvolver coerentemente 10 heróis e alguns personagens secundários, sendo que todos são bastante diferentes entre si e, com isso, gasta mais da metade da duração nessa busca para reunir a equipe completa antes que algo terrível aconteça na Terra. E, sinceramente, até funciona por dar carisma e coração ao elenco extenso, mas, com isso, sacrifica o espaço da ação. Porém, quando mergulha nas lutas, a interação com os personagens é ótima. Dinâmica, por vezes bastante apressada, é no melhor (ou pior, no caso) estilo filmes da DC – inclusive, há piadas sobre o Superman e o Batman no filme – como Liga da Justiça e seu apego por bonecos de computação gráfica.

O elenco

Mesmo com tantos rostos em cena, Sersi (vivida pela ótima Gemma Chan) e Ikaris (Richard Madden está sombrio) são os protagonistas, mas os demais atores ainda possuem cada um seu momento de brilhar entre uma cena longa de monólogo e outra. Todos dispõem de arcos próprios e bastante identidade.

Destaque para o carisma de Kingo (Kumail Nanjiani) – que funciona como alívio cômico da vez – e para a ótima e satisfatória energia de Lauren Ridloff, como Mikkari e Brian Tyree Henry, como Phastos, esse último, aliás, protagoniza a primeira (e tardia) cena de beijo entre dois homens (com o ator Haaz Sleiman) em um filme/série da Marvel. O momento é de arrepiar e carrega consigo parte da enorme carga de representatividade que o filme possui ao dar voz e espaço para heróis negros, latinos, indianos e, tudo isso, sob o olhar sensível de uma diretora chinesa.

Agora, se espera ver Angelina Jolie em seu potencial máximo, sinto decepcionar. A atriz é naturalmente um deslumbre de atuação, mas sua personagem foi totalmente mal aproveitada, assim como Kit Harington, cujo personagem é brevemente introduzido com a esperança de retornar em algo maior no futuro.

A direção

Há uma tonalidade única na narrativa imersiva de Chloé Zhao que a faz ser tão visionária em seus projetos. É possível ver a paixão pelo cinema fluir de cada cena, cada plano que elabora e isso é emocionante de se assistir. No entanto, como já citado, como encaixar algo tão indie, corpóreo e profundo dentro de um produto industrializado e carregado de expectativa que, na teoria, deveria ditar as regras do futuro do MCU?

Bom, se esse peso for extraído (algo que os fãs dificilmente irão fazer), sobra um filme bastante diferente em sua estética e, ainda assim, imerso em todos os elementos que fazem esse tipo de filme ser um sucesso. Há piadas fora de hora, há cenas de ação carregadas de efeitos especiais, uma fotografia marcante e uma trilha cheia de sucessos (incluindo BTS), há explosões, destruição global e Eternos pode facilmente ser inserido na categoria de filme-catástrofe. Algo como se Independence Day fosse feito com a criatividade de A Chegada, ou seja, se aceitar que a história geral não caminha para frente, ainda assim é um ótimo filme espacial do estúdio.

As cenas de ação, por outro lado, são desenfreadas – ainda que visualmente bonitas, uma vez que os poderes dos heróis possuem essa energia dourada que deixam as lutas mais estilosas. Porém, o uso exagerado de CGI troca os atores por bonecos digitais e, por vezes, isso desvia bastante a atenção. Um pouco mais de lutas práticas teria funcionado.

É curioso como a condução de Zhao nessas sequências lembram (e muito!) a forma como Zack Snyder faz suas cenas de ação. E não sei se é um elogio. Fora isso, o ritmo é algo peculiar. Temos bons desenvolvimentos, mas a trama se alonga além do necessário, culminando em um clímax até épico e divertido, mas que demora para chegar. O desfecho deixa mais perguntas que respostas no ar e se sustenta apenas pelas promessas do que está por vir.

Conclusão

Ao romper a barreira da mesmice e sendo destemido em, de fato, seguir fundo com a representatividade e inclusão que tanto é prometida no estúdio, Eternos entrega um ambicioso épico de super-heróis visualmente deslumbrante e faminto por subverter a “fórmula Marvel” em algo mais ousado, adulto e que, pela primeira vez, questiona e reflete sobre o que faz de nós humanos. Chloé Zhao – com seu olhar visionário e sua condução contemplativa – luta para se encaixar nos limites dos filmes industrializados do MCU e segue as rédeas do gênero, mas preza por valorizar as conexões humanas no lugar de fazer apenas mais um filme de ação desgovernado. Mesmo com falhas irreparáveis no ritmo e, especialmente, com dificuldades de dar um futuro claro para o Universo Marvel (que parece andar em círculos desde Ultimato), ainda assim é uma obra especial, singular e feita com coração.

Obs: Eternos possui DUAS cenas pós-créditos bastante interessantes. Portanto, não perca!

Nota: 8/10


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