Dizem que nada causa mais controvérsia do que discutir política e religião, no entanto, o cinema habita o maravilhoso limbo onde ser político é rotina e questionar crenças faz parte de sua reflexão. Além do mais, quando esses dois temas são abordados – juntos ou não – rendem obras com um quê a mais, como Amarração do Amor, nova comédia romântica nacional cujo foco do enredo é exatamente ponderar a intolerância religiosa.
O que faz da sua crença ser mais válida que a crença do outro? Em um país como o Brasil, com a religião ocupando espaços indevidos, doutrinando fiéis em troca de votos ou mesmo sendo vítima de preconceitos irracionais, é interessante pensar no que deveria ser a única vertente: o lado benéfico de se acreditar em algo maior que nós mesmos.
A trama e o elenco
No enredo bem construído e solidificado por um humor gerado por situações rotineiras, o foco central não é converter o espectador, mas sim, o fazer refletir sobre a comunhão de diferentes tipos de religiões/pessoas dentro de uma mesma casa ou família.
Em Amarração do Amor, o casal Lucas (Bruno Suzano) e Bebel (Samya Pascotto) decidem oficializar a união após se conhecerem por um acaso do destino. Porém, apesar da forte paixão entre eles, há um empecilho considerável: Lucas é umbandista e Bel vem de uma família tradicional judaica. Esse conflito de crenças é a fagulha que vai mover a narrativa pra frente e colocar esse amor à prova, uma vez que cada família quer que o casamento seja com base na sua própria personificação do que é correto perante Deus.
Sem dar muitas voltas, o enredo logo estabelece a divergência e o roteiro preza por entregar boas piadas dentro do tema. A grande maioria funciona, especialmente pelo carisma inigualável de Cacau Protásio (Os Farofeiros) – um pouco mais contida do que o convencional -, que vive a mãe do noivo, e da boa química entre Pascotto e Suzano – destaque para esse último, um ator realmente promissor, tanto na comédia quanto no drama, um dos pontos altos do filme.
Fora isso, é especialmente importante um filme com essa vertente pop trazer aos holofotes um recorte das religiões de matrizes africanas em prol de derrubar preconceitos – mesmo que seja pelo olhar do humor.
Há brincadeiras escrachadas e estereótipos? Sim, porém, visivelmente o texto preza por rir, mas rir com respeito e não busca subverter o imaginário popular. De qualquer forma, uma maneira de educar é também não se levar tanto à sério. Por esse lado, o longa acerta com perfeição em apresentar o “desconhecido” para muita gente e, com isso, instruir ao princípio básico de viver em sociedade: diversidade existe quer você goste ou não.
A direção
O olhar sensível e perspicaz da diretora Caroline Fioratti faz total diferença nessa linha tênue entre satirizar e honrar. Sua condução é fluída e possui um ótimo ritmo, que acaba por compensar o enredo raso, praticamente todo construído em torno do famigerado casamento dos protagonistas, sem grandes mergulhos em outras possibilidades. Uma situação de rotina após a outra e que, no fim, culmina numa cerimônia matrimonial que funde elementos de ambas as religiões em uma espécie de megazord de valores tradicionalistas.
No demais, a trilha sonora – com clássicos nacionais – é boa e a montagem auxilia no ritmo apressado da história, que apenas deixa à desejar por sua falta de surpresas e uma trajetória bastante previsível, no melhor estilo “feijão com arroz” das comédias românticas.
Conclusão
Mesmo ao habitar a zona de conforto e não subverter previsibilidades, Amarração do Amor é uma comédia romântica sólida, eclética e que presta um importante serviço ao refletir sobre a comunhão de crenças, pluralidade e intolerância religiosa, especialmente em um país cuja religião ainda é fortemente utilizada como ferramenta de censura. Há bom humor, positividade, o elenco cumpre o esperado e a direção suaviza qualquer mal entendimento por parte do espectador de mente mais fechada. Uma pena que o roteiro seja tão leviano, ainda assim, o riso é garantido.
Nota: 7/10
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