Crítica | Free Guy é o melhor filme de videogames já feito

O universo das adaptações de videogames nos cinemas nunca alcançou seu verdadeiro potencial. Ao longo dos anos, foram várias as tentativas e execuções. Se a adaptação foge do material de origem, não alcança os fãs mais fiéis, e quando o foco está em reproduzir com fidelidade, o filme não atrai público o suficiente. Os problemas dessas adaptações são vários, mas o principal é que esses filmes não conseguem exprimir, com precisão, a sensação que esses jogos de videogame dão. Bem, pelo menos até agora. Free Guy muda tudo isso.

Ainda que não seja uma adaptação, o novo filme estrelado por Ryan Reynolds consegue fazer o que nenhum filme baseado em videogames já fez: te fazer se sentir dentro de um jogo. A simples e funcional trama segue um personagem de um jogo que não sabe que não é real e ganha vida própria. Ele sai por aí, no universo do jogo de Free City, achando que está vivo e buscando propósito.

Com uma história que varia entre o mundo virtual e o mundo real, em um estilo parecido com Jogador Nº 1, Free Guy conversa com o público gamer atual, ao mesmo tempo em que não exclui a audiência que não entende muito desses jogos. Diferentemente das adaptações, que tentam simular aqueles universos específicos dos videogames, Free Guy te explica, desde o primeiro momento, como aquele mundo funciona. Por não se tratar de algo que tenta parecer real e crível, as normas de Free City logo ficam bem claras. A narração de fundo também ajuda para que Guy, o protagonista, ganhe importância para quem está assistindo.

A direção de Shawn Levy ajuda bastante. O visual de Free Guy é exagerado e lúdico, ao ponto de qualquer um reconhecer como um videogame. O mérito da equipe ainda vai além disso. Free Guy funciona não porque fala de videogames, mas porque é o único filme, no meio desse montante de adaptações sem alma, que consegue fazer com que o espectador se sinta dentro de um jogo. É por isso que é tão difícil de adaptar um jogo de videogame: é impossível simular a sensação de jogar ao assistir alguma coisa. Free Guy talvez seja o único filme na história a conseguir isso com êxito, e isso é graças à própria intencionalidade do longa.

As referências da produção também são bem claras. A sensação de dèjávú é muito forte durante algumas cenas que lembram Show de Truman e até mesmo a série da HBO Westworld. Por mais que seja uma comédia com ação, o foco do filme está muito mais na sensação de que o espectador está, assim como o Guy, descobrindo como aquele jogo deve ser jogado. A metalinguagem do filme tem muita força, especialmente no último ato. Até mesmo quando as normas do jogo mudam e a missão do protagonista é outra, assistir ao filme é como assistir ao streaming que está sendo feito dentro da trama.

Aliás, Free Guy sabe como conversar com a geração Fortnite. Não só mostrando streamings, mas também com youtubers que falam sobre Free City e apresentando termos como skins e colocando easter eggs que falam não só com esse público dos videogames, mas com a audiência cinéfila e geek.

Em um ano como 2021, em que os filmes chegam e logo desaparecem, Free Guy talvez seja a melhor surpresa possível. Divertido, engraçado e com reverência a todos que amam videogames, Free Guy sabe conversar com públicos muito diferentes, sem nunca perder a intenção de te colocar dentro de uma trama virtual e lúdica, e, no processo, acaba se mostrando o melhor filme de videogames já feito – ainda que, ironicamente, seja um original e não uma adaptação.

Nota: 10/10

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