Interrompemos a Programação (Prime Time), selecionado para o Festival Sundance e que chega ao Brasil como original Netflix, é uma cópia de uma cópia, um thriller de reféns emulando tudo, desde Um Dia de Cão até Jogo do Dinheiro, mas esquecendo um ingrediente essencial: a recompensa.
O filme polonês, do diretor e co-roteirista Jakub Piatek, é sobre um jovem magoado que assume um estúdio de TV na Cracóvia, bem na virada do novo milênio, para fazer uma declaração ao vivo para o mundo – mas o conteúdo dessa declaração, e na verdade, qualquer coisa mais aprofundada sobre o jovem, são detalhes deixados inexplorados do começo ao fim da trama. Sem eles, o drama até consegue ser um ótimo exercício de suspense, mas não chega a surpreender.
A trama e o elenco
Sabemos o nome do homem, pelo menos – Sebastian (vivido por Bartosz Bielenia). Sabemos que é véspera de Ano Novo de 1999 e que a paranoia sobre o tal “bug do milênio” está dominando uma nação apavorada com a perspectiva de alguma calamidade iminente. Sabemos que seus reféns são o segurança Grzegorz (Andrzej Klak) e a personalidade de longa data da TV Mira (Magdalena Poplawska). E, por fim, sabemos que ele tem uma arma. Essas são todas as coisas que aprendemos nos primeiros 20 minutos e são as únicas que o roteiro recompensa o público até seu desfecho enfadonho.
É irritante ter tudo sobre um filme e seus personagens explicados ao público com detalhes insultuosamente óbvios, mas também é bastante frustrante não ter nada explicado. Podemos inferir que Mira é veterana na estação e está prestes a ser substituída. Podemos supor, principalmente graças a uma aparência imprudente do pai do protagonista que ele vem de uma família impulsiva, não particularmente agradável e obviamente disfuncional. Ele pode ou não levar um “estilo de vida doentio”, o que pode – sinceramente – significar qualquer coisa.
Sem um entendimento concreto do que Sebastian está fazendo, o que o levou a este ponto e o que ele espera alcançar com ações tão drásticas, é impossível sentir empatia pelo personagem. É impossível traçar paralelos entre ele e quaisquer outros personagens ou o povo polonês retratado em frenesi nas notícias. Tudo fruto de um roteiro e uma direção que claramente privilegia apenas a criação de suspense e a sensação eminente de que algo terrível está para acontecer, ferramentas de roteiro que manipulam e prendem o espectador. Apesar dele ter um discurso escrito, a trama não explora esse texto à fundo e, mesmo que a ausência de explicações seja um conceito criativamente delicioso em obras inteligentes, é preciso que o silêncio faça alguma lógica para isso funcionar. Ter um ponto almejado não significa que você tenha um bom ponto de vista. A crítica social, que deveria ser a base de sustentação da jornada do protagonista, se perde e é silenciada. Apesar do bom elenco e da interação sólida entre os personagens, falta química, emoção e carisma.
A direção
Claramente dividir funções não é o forte de Jakub Piatek. O diretor se mostra mais eficiente na direção, na criação desse ambiente tenso e temeroso onde a trama se desdobra, do que na forma como a história é construída. Vale destacar que, apesar do que aparenta, Interrompemos a Programação não é baseado em uma história real específica, mas é inspirado em situações reais, que já aconteceram, como pessoas armadas invadindo programas ao vivo. Essa base, por si só, já germina suspense em nossa cabeça, mas a diferença está nas reviravoltas constantes, algo que aqui é quase inexistente. Se pegarmos outra obra, Vingança FM (sim, esse título nacional é horrível), por exemplo, há quantidade o suficiente de dilemas que não permitem que a história perca fôlego em nenhum momento, diferente da condução desequilibrada de Piatek. Os altos e baixos do ritmo e a falta de planos mais elaborados, que exploram melhor o cenário e o ambiente fechado, são desperdícios dolorosos. No entanto, o clima sombrio, realista e perigoso provoca sim aflição, uma pena que não passa dessa superfície óbvia.
Conclusão
Apesar da atmosfera moderada de suspense, Interrompemos a Programação não passa de um thriller tenso que não recompensa, não se justifica e, no fim das contas, não entrega mensagem social alguma em seu roteiro enfadonho. Ainda que a ausência de explicações seja uma dádiva para poucos filmes criativos, nessa história sobre uma invasão confusa e sem nexo, havia a necessidade de uma entrega maior e mais coerente. A direção é boa, o elenco possui atuações sólidas e o suspense segura o espectador, mas definitivamente não vale interromper sua programação para interagir com esse filme da Netflix.