O maior problema dessa nova adaptação de Mortal Kombat para os cinemas está na temida “síndrome de transformar tudo em uma franquia”. Essa grandiosidade faz com o um filme de origem, como esse, perca grande parte de sua singularidade, já que os seus realizadores estão com a cabeça lá na frente. Como se já não fosse complexo o suficiente fazer um recorte de um universo tão rico em histórias e com um enorme número de personagens, esse reboot coloca os pés pelas mãos em diversos momentos e transforma um começo promissor em apenas uma sequência inicial com pouco desenvolvimento e que tenta conquistar o espectador através de boas cenas de acrobacia. Tem violência gráfica? Bastante! Tem referências aos jogos? Bastante! Tem efeitos especiais plausíveis? Sim, ótimos por sinal! Então o que deu errado? O roteiro raquítico, expositivo e que parte do infeliz princípio de que todos já conhecem o mundo fantástico de Mortal Kombat.
A trama e o elenco
Definitivamente não é uma adaptação que visa aderir novos fãs e isso é um enorme problema, afinal, trata-se de um produto realizado em outra mídia e que, assim como tal, precisa compreender que irá atrair um novo público. Mas ok, apesar do roteiro ter grande dificuldade em apresentar o que são os torneiros de Mortal Kombat, como funciona ser um campeão e por qual motivo é necessário desbloquear sua arcana, os diálogos são, em sua grande maioria, repetitivos e vazios, assim como a jornada do herói, vivido por Lewis Tan, que interpreta o jovem Cole Young, personagem inédito na franquia de games e criado apenas para ser o condutor desse filme, assim como a Alice de Milla Jovovich na saga de filmes de Resident Evil. Ter um protagonista sem background é interessante pois torna-se um papel em branco que pode ser pintado da forma mais adequada, porém, sua aventura como escolhido da Terra para lutar no torneio é apressada, confusa e, no fim das contas, sem o devido destaque e necessidade.
Na busca por colocar um easter egg em cada golpe, a trama insere seus inúmeros personagens, conhecidos dos jogos, e se perde ao tentar desenvolvê-los um a um. É Sonya Blade, Liu Kang, Kung Lao, Lorde Raiden, Kano, aliás, esse último é um verdadeiro pé no saco com seu humor fora de sincronia e só torna a comédia do filme uma boa de uma porcaria. Mas há acertos, especialmente no vilão Sub-Zero, vivido pelo ótimo e sombrio Joe Taslim, e seu confronto milenar com Scorpion (Hiroyuki Sanada). Essa subtrama, apesar de enrolada, acaba por ser o ponto mais alto do filme. Por outro lado, Shang Tsung (Chin Han), imperador da Exoterra, é puro desperdício de potencial com um vilão megalomaníaco sem carisma algum. Mas, sim, para os amantes de artes marciais, as cenas de luta são ótimas e empolgantes, orquestradas por uma trilha exageradíssima, que parece música feita para tocar em trailer de filme de ação.
A direção
Seria injusto não evidenciar o trabalho do novato diretor Simon McQuoid na elaboração das cenas de ação e nas coreografias de lutas entre os personagens e seus poderes espetaculares. O ritmo enérgico, os efeitos bem realizados (especialmente os do Sub-Zero) e a promessa de que o confronto vai ganhar ainda mais força conforme todos os personagens são apresentados, faz a trama ter uma diversão inesperada e que envolve o espectador, quase ofuscando o roteiro mal escrito, que gasta tempo demais no treinamento e tempo de menos no clímax. Eu disse quase, pois o 3º ato é uma bagunça sem tamanho e o desfecho, ainda que sirva boa ação, coloca o desenvolvimento ainda mais a perder, muito por conta da falta de maestria do diretor na conexão emocional entre cada indivíduo, já que, quando o grupo está formado, o trabalho em equipe contra as forças do mal é bastante fraco. Mas – felizmente – há bastante violência gráfica e litros de sangue para compensar, algo que já se espera de uma adaptação de respeito de uma franquia de jogos conhecida pelo alto teor de brutalidade.
Conclusão
Através de uma enxurrada de fan-service, essa nova adaptação de Mortal Kombat oferece pouco para quem não está investido na franquia e, apesar dos esforços das ótimas cenas de ação e uma violência brutal – que condiz com os games – parece que apenas os efeitos especiais evoluíram, já que o roteiro bagunçado continua preso em 1995. Boa diversão escapista em algo que poderia (e merecia!) ser muito mais que apenas isso, afinal, o universo da franquia é rico o suficiente para sustentar um enredo mais inspirado.