O único atrativo do roteiro genérico de Todos Os Meus Amigos Estão Mortos, novo filme polonês Original da Netflix, está em torno do mistério que constrói sobre o desenrolar dos acontecimentos de uma noite de Ano Novo em que todos os convidados de uma festa são mortos. Ao começar a trama já pelo desfecho, o longa constrói muito bem sua história não-linear e entrega a conta-gotas pistas para que o espectador mais interessado possa resolver esse puzzle central. No entanto, ao mesclar terror e suspense com comédia, perde totalmente o equilíbrio e se sustenta apenas com piadas eróticas, prometendo um plot twist espetacular que nunca chega e desperdiçando sua ótima premissa apenas pela diversão.
A trama e o elenco
É vergonhoso como o longa, ainda que obviamente com menos orçamento, tenta ser o clássico filme de detetive no estilo Entre Facas e Segredos, porém, trabalha tão precariamente seu mistério central que se aproxima bem mais de paródias como American Pie por conta de seu humor exagerado e o teor sexual de suas piadas “5ª série”. Há muitos personagens e muito pouco aprofundamento na grande maioria deles, aliás, a ausência de um protagonista evidente faz com que o palco seja dividido por diferentes personalidades, mas que, no fim das contas, todas dão no mesmo vazio e no excesso de estereótipos. Durante o desenrolar da noite e da festa, que já sabemos que todos morrem, os mistérios de “como aconteceu?”, “qual o motivo?” e “qual a arma do crime?” são revelados aos poucos e esse ritmo intrigante até segura o espectador, ainda que as resoluções sejam patéticas e a grande maioria das mortes não esconda mistério algum.
Porém, ao deixar de lado seu aspecto de terror, já que nada assusta de fato, o longa ganha força quando foca totalmente na comédia e tira sarro de filmes slasher, especialmente na construção da narrativa de que alguém (ou alguma entidade) possa ter sido a responsável por todas as mortes, quando, na realidade, o desfecho é bem menos elaborado e bem mais estúpido que isso. Enquanto a violência gráfica enriquece a história e proporciona momentos hilários, a ousadia do roteiro não poupa tempo de matar seus personagens em prol de pura diversão descompromissada. No elenco, por sua vez, somente Julia Wieniawa e Mateusz Wieclawek se destacam a ponto de fazer alguma diferença notável. Os demais atores apenas completam as lacunas da história sem grandes feitos.
A direção
De longe, um dos maiores méritos de Todos os Meus Amigos Estão Mortos está na direção simples e bem construída do jovem Jan Belcl. Sem seu ótimo ritmo, a narrativa sem dúvida se perderia com facilidade, especialmente pelo grande número de subtramas sendo desenvolvidas simultaneamente ao plot central. Em apenas um único ambiente, o diretor entrega o melhor que pode dentro das limitações e até sobra tempo para brincar com as possibilidades. Além de explorar bem o cenário e não permitir que a trama caia no tédio com sua interminável e alucinada festa onde tudo dá errado (que em um universo paralelo poderia se aproximar de filmes singulares como Climax, do Gaspar Noé), o cineasta mostra confiança na história e não teme prestar homenagens à outras obras de comédia e terror que tanto moldaram os últimos 40 anos do cinema, como o clássico O Iluminado. Apesar da maestria, as falhas se encontram na falta de novidade da história e na resolução brochante após grande promessa de que a reviravolta seria, no mínimo, peculiar.
Conclusão
Através disso, o roteiro cômico de Todos Os Meus Amigos Estão Mortos proporciona uma festa estúpida e vulgar no melhor estilo American Pie, enquanto brinca com outros gêneros e entrega uma narrativa atrativa e descompromissada com qualquer coerência. Não é um filme ruim, mas para uma comédia trash sem limites, há desperdício de uma boa premissa e a falsa promessa de uma reviravolta chocante que nunca chega a surpreender de fato. Ainda assim, mesmo com enormes falhas, para um filme pipoca, ao menos a diversão é garantida.