Crítica | Noelle – Conto natalino progressista com carisma de Anna Kendrick

A tradição diz que Papai Noel precisa ser um homem branco, cisgênero e heterossexual. Felizmente, o cinema veio para colocar do avesso a regra e ceder espaço para as minorias que nunca se identificaram com o padrão estabelecido. Não que o objetivo seja apagar a lenda ou, como muitos diriam, “militar” em cima de algo tão clássico como a imagem do Bom Velhinho, na realidade, filmes como os recentes ‘Uma Invenção de Natal’, com seu elenco majoritariamente negro, e ‘Noelle’, que brinca com a possibilidade do icônico personagem ser uma mulher, funcionam bem mais como forma de reparação histórica, como inclusão e também para agregar alguma novidade que seja à um subgênero tão batido e clichê como o de filmes natalinos. Dito isso, presigo sobre o último filme citado, produção Original do Disney+ que dá um gás extra para que esse tipo de obra ainda se mantenha relevante.

A trama e o elenco

A premissa de ‘Noelle’ é interessante e reimagina um mundo onde a figura do Papai Noel é feminina e de liderança. Na trama, após algum tempo da morte do Bom Velhinho, o filho mais velho da família, Nick Kringle (vivido por Bill Hader) tem dificuldade de assumir o trono hereditário deixado por seu pai. Porém, outro membro da família parece ter vocação para o cargo, a jovem Noelle (Anna Kendrick), mas, apesar de sua vontade e dedicação, não pode ser o “Papai Noel” por simplesmente ser uma mulher. Nessa jornada para localizar seu irmão e trazê-lo de volta para o Polo Norte, ela descobre que seu destino está muito mais evidente do que parece. E é isso. De forma orgânica, o roteiro da Disney reconta o clássico e, com bastante humor, passa o bastão para uma mulher e explora a dificuldade que a sociedade possui em aceitar uma mudança válida e importante de ser realizada, tendo em vista que vivemos no Século XXI (apesar da consciência de muita gente ainda não viver).

O carisma de Anna Kendrick (A Escolha Perfeita) transborda a tela e envolve o espectador como poucas personagens recentes de filmes natalinos conseguem fazer. A performance da atriz, além de cômica e natural, é deliciosa de ser assistida. Assim como o humor contido de Bill Hader (Barry). O elenco, de modo geral, está ótimo e também contribui para a comédia afiada, regada de tiradas cômicas da própria Disney que descobriu recentemente ser interessante fazer piada de si mesma, com o intuito de desconstruir o modelo de “princesa perfeita” que tanto havia pontuado no passado. A Casa do Mickey está remodelando suas histórias e percebendo, a cada nova produção, como o mundo mudou e como necessitar mudar junto. Mesmo que o roteiro não fuja de clichês e tenha uma parcela alta de previsibilidade, há momentos hilários, desenvolvidos através do choque cultural e uma cidade exageradamente natalina, para um Estados Unidos quente, apressado e que banaliza o espírito de união.

A direção

O trabalho espirituoso de Marc Lawrence (Letra e Música), especialista em filmes para família e comédias românticas dos anos 2000, se encaixa na premissa e o diretor consegue desenvolver muito bem seus personagens e as diferenças dos dois ambientes. Um, com sua atmosfera natalina dos anos 1990, e o outro com o mundo real quente e desleixado. Fora isso, há boas sequências de comédia e o drama, extraído das mensagens importantes que a trama deseja alcançar, funciona, especialmente para o público infantil, o grande alvo da produção.

Já para os adultos, algumas tiradas de sarro são boas, mas o roteiro água com açúcar peca por não saber exatamente o rumo que deseja dar para algumas subtramas, como a química que constrói em torno de Noelle e Jake (Kingsley Ben-Adir), mas que, no fim, não leva para lugar algum. A narrativa, obviamente, é infantil e as situações exploradas são de fáceis resoluções, sem a necessidade grandes lições ou profundidade. Seu forte mesmo, além do elenco sólido, está na mudança de gênero e como essa questão afeta o público.

Conclusão

Ao ser um conto natalino progressista e bem humorado, ‘Noelle’ é a Disney fazendo uma autocorreção no modelo machista que já defendeu e que conquista através do oceano de carisma que Anna Kendrick possui. Uma comédia natalina inocente, que deve incomodar o público conservador e, como tal, já se torna fundamental de ser assistida. Ainda que seu roteiro água com açúcar seja elaborado para o público infantil, o humor é bom e a mensagem é potente. Com tantas opções de filmes natalinos nessa temporada, ‘Noelle’ ao menos acerta em trazer alguma novidade.

Nota: 7

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