Crítica | Rebecca – Uma afronta da Netflix ao clássico de Hitchcock

Manter ritmo, qualidade e entretenimento durante duas horas certamente é um desafio para muitos filmes, que partem de uma premissa interessante, mas que transformam a jornada em um verdadeiro tédio. Digo isso pois ‘Rebecca – A Mulher Inesquecível’, produção da Netflix que serve de remake do clássico thriller de Alfred Hitchcock, sucesso nos anos 1940, mergulha em sua exaustiva narrativa romântica sem ânimo e acredita estar entregando suspense o suficiente para manter o público vidrado, o que de longe não acontece. Essa mistura de gêneros, e a tentativa de fazer um terror psicológico, saem pela culatra devido a ausência de surpresas de um roteiro raso, morno e bobo, que serve de base para uma produção realmente sofisticada em sua arte e figurino, mas que não entrega nada excepcional além do design de produção e de algumas nuances de atuações.

A trama e o elenco

Tanto o original quanto o filme da Netflix basearam-se no romance homônimo escrito por Daphne Du Maurier, publicado em 1938 e que entrega um delicioso conto gótico sobre uma jovem doce e simples que se envolve com um homem rico e poderoso, mas que começa ser atormentada pelo vazio que sua ex, a tal da Rebecca do título, deixou em sua vida e na vida de todos a sua volta, após seu falecimento precoce. Se por um lado, o original consegue manter o nível de suspense em alta, claro, muito por conta da maestria e genialidade de Hitchcock, o remake peca exatamente nessa construção de atmosfera de medo e perigo, algo fundamental do livro, especialmente por conta da mansão onde a trama se passa ser um ambiente sombrio, escuro e cercado de fantasmas do passado, como as clássicas casas mal-assombradas da literatura gótica.

Aqui, o lugar tem pouco espaço em cena e o foco maior do roteiro é em desenvolver a relação Disney (da princesa pobre e o príncipe galã rico) entre o casal protagonista, vivido por Lily James (Cinderela) e Armie Hammer (Me Chame Pelo Seu Nome). Dois ótimos atores, mas que estão horríveis nesses papéis, especialmente do 2º ato em diante, quando a trama enlouquece e muda até mesmo a personalidade da personagem de James, que passa de retraída e cabisbaixa para vingativa ao começar a apoiar situações irracionais por conta do seu amor incondicional pelo problemático, porém charmoso, Sr. Winter, a pura personificação do homem culto da literatura inglesa.

A direção

A condução de Ben Wheatley (No Topo do Poder) é sem ritmo e a trama se arrasta por um primeiro ato ingênuo e novelesco, até que, quando finalmente engrena, parece perdida em qual caminho tomar. Nesse ponto, o casal perde a química que estava sendo construída, o suspense replica jump scares de filmes baratos e até mesmo a atuação de James se torna exagerada e enfadonha. Isso para não falar da tão aguardada reviravolta na história de como Rebecca havia, de fato, morrido, que é tediosa e sem supresas.

Porém, é visível que o peso de refazer um clássico do cinema afetou a narrativa de Wheatley, que se prende demais em tentar deixar o longa com cara de filme dos anos 1940, seja em sua forma precária de filmar ou nas atuações teatrais do elenco, toda a identidade visual se mantém ateada ao original e, com isso, desperdiça a oportunidade de fazer algo completamente novo e condizente com os dias de hoje, ainda que adapte o datado livro do século passado.

Conclusão

‘Rebecca – A Mulher Inesquecível’ tenta desesperadamente replicar o magnetismo do clássico de Hitchcock, mas acaba sendo um thriller psicológico exagerado, nada assustador e com atuações tediosas. Vale destacar que o original foi o primeiro filme norte-americano dirigido pelo futuro Mestre do Suspense e levou também o Oscar de Melhor Filme em 1941, ou seja, o fardo é pesado e, mesmo com o olhar requintado da Netflix, ainda assim, esse remake, feito mais de 70 anos depois, é subitamente inferior e quase uma afronta à história do cinema.

Nota: 4

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