Conversamos com o elenco e diretor de ‘Um Dia Qualquer’, nova série nacional do canal Space

O Pipocas Club foi convidado para participar da coletiva de imprensa virtual de ‘Um Dia Qualquer’, nova série nacional de drama do canal Space, que estreia dia 17 de agosto às 22h.

Nessa coletiva, rolou um super bate-papo sobre a produção com Mariana Nunes, Augusto Madeira e Jefferson Brasil, protagonistas da série, e com o diretor Pedro Von Krüger, o produtor Denis Feijão, da Elixir Entretenimento, e a diretora de conteúdo da WarnerMedia/SPACE, Sivia Fu Elias.

Confira à seguir a conversa na íntegra:

Gravada em 2018, ‘Um Dia Qualquer’ estava planejada para ser um longa-metragem que mostraria 24 horas da vida dos personagens envolvidos, porém, após algumas mudanças de direcionamento, a produção se mostrou mais eficiente no formato de série de TV, como conta o diretor e roteirista Pedro Von Krüger:

“A história nasceu à partir de uma pesquisa que fiz para um documentário, no começo dos anos 2000. Na época, me chamou atenção esses “justiceiros de bairros”, que era muito comum. O começo do que seria as chamadas milícias, que tanto vemos hoje em dia no Rio de Janeiro. Inicialmente, era para ser um filme, mas percebemos que tinha o DNA de série de TV e que se encaixava perfeitamente no modelo do canal Space.”

“No projeto inicial do filme, a trama se passava em apenas 24 horas da vida dos personagens, porém, para virar uma série de TV com cinco episódios, resolvemos mostrar o passado desses personagens para preencher essas lacunas. O passado também se passa em um único dia. O personagem do Jefferson Brasil, por exemplo, nasceu através disso, ele não estava nos planos do roteiro original, mas a série permitiu que ele fosse incluído. Tive que sair do lugar comum e tentar inovar na narrativa, a história que sempre amei não caberia no filme, mas na série começou a fazer mais sentido para mim, estava sendo mais completa. É uma tragédia grega à brasileira que vive comigo por muitos anos”

Pedro também explicou como esse projeto se destaca em relação à tantas outras obras similares, que mostram a dura realidade do subúrbio carioca:

“Gosto de usar a arte para expressar a realidade de uma sociedade, é assim que penso que deve ser meu trabalho, por conta disso, a história me chamou atenção desde o começo, do machismo desse meio, da violência cruel e do racismo sempre muito presente. Ainda que a ideia tenha surgido lá no começo dos anos 2000, ainda hoje é algo relevante. Chamo de ativismo social. Usamos a arte que nos é dada para dar luz à essas questões sociais importantes”

“Na sala de roteiro, buscamos dar um olhar mais humano aos personagens que estávamos gerando. A história é muito íntima, se passa dentro da casa dos personagens, diferentes de outras obras mais gerais. É uma tragédia e a relação que as famílias têm com a violência é o foco dessa trama, não, de fato, o sistema como um todo. De modo geral, é uma história sobre como o crime destrói famílias. Isso não vemos em todos os filmes por aí. O Space resolveu investir na série exatamente por conta desse drama familiar diferenciado e não por definir quem é o mocinho ou bandido. É uma história muito humana”

Sobre o processo de seleção do elenco, Pedro revelou que haviam mais de 100 atores e atrizes na disputa para viver os personagens jovens da história. Além disso, também contou os detalhes de como foram os testes:

“O elenco é poderoso e tanto a Mariana (Nunes) quanto o Jefferson são atores totalmente versáteis, que entregam todas as nuances que precisávamos. Foi um extenso trabalho de entrevista e selecionamos 30 atores entre os mais de 100 que apareceram. Estávamos mais interessados nas histórias pessoais dos selecionados e, através disso, encontramos nosso elenco jovem. Lembro que fizemos uma festa real com os três núcleos da trama (os traficantes, os milicianos e os evangélicos) e, com isso, criamos a interação dos personagens e como eles iriam se comportar. Fora isso, tivemos mais 350 figurantes que são moradores reais da Zona Norte do Rio, foi fantástico”

No bate-papo, o produtor Denis Feijão contou as dificuldades de fazer cinema e TV no Brasil com o atual governo e que ‘Um Dia Qualquer’ foi uma das últimas produções a utilizar o Fundo Setorial do Audiovisual:

“Olha, nós realizamos a produção em tempo recorde e o elenco ajudou muito. Filmamos em 2018 e foi um dos últimos filmes feitos pelo fundo Setorial do governo. Gravamos tudo em Marechal Hermes, o Rio, e o bairro nos adotou de uma forma linda. Foi um prazer gravar lá. Sem dúvida não conseguiríamos filmar essa série se fosse em 2019, especialmente por conta das mudanças no Fundo Setorial, que se modificou no último ano através desse governo atual e todo o boicote à cultura que estamos vendo. Por isso é tão importante fazer um produto nacional como esse, para manter a arte brasileira viva”

Outro tema importantíssimo que surgiu na conversa foi como a série se relaciona com o momento atual em que vivemos e os protestos antirracistas que se espalham pelo mundo. Sobre isso, o ator Jefferson Brasil, morador do Vidigal, contou como se sentiu ao receber o papel:

“Fazer esse personagem foi um desafio para mim, pois ele é uma peça muito importante dessa história, mas confesso que fiquei com o pé atrás por conta do personagem ser carregado de esteriótipo. Depois de tempo, Pedro (o roteirista) me convenceu da importância de dar voz à esse personagem negro, que se torna invisível na sociedade. Meu plano era dar coração e sentimentos para ele, mesmo sendo um bandido, queria mostrar o que o levou a ser assim. Nesse momento em que vivemos, com os protestos da comunidade negra, essa série se torna essencial”

“As pessoas acham que por a gente morar em comunidade – eu moro no Vidigal – é mais fácil dar vida à traficantes nos cinemas, mas é disso que tentamos fugir, tentamos encontrar personagens além disso, que possam mostrar todo o nosso talento. Mesmo que tenhamos presenciado histórias como essa aqui, nós queremos fazer muito mais que isso, sabe?”

“Obviamente é difícil defender um personagem como o meu, tive medo de fazer isso, mas me preparei para dar à ele a bagagem familiar que tenho comigo, não apenas fazer um traficante violento, com “cara de mal”. Para fazer um bandido requer muito estudo para que ele possa ser humanizado. Antes de ser bandido, ele é pai de família e tem sentimentos também, só não teve oportunidade, como muitos nesse Brasil racista em que vivemos. Ele é vítima de uma sociedade, uma elite branca que vem apagando nossa história. Por conta disso, personagens assim são tão importantes para mostrar essa falta de espaço nas comunidades”

Ainda no tema, a atriz Mariana Nunes aplaudiu a fala do Jefferson e acrescentou alguns detalhes, especialmente sobre como tentou fugir dos esteriótipos na construção da Penha, mulher negra e evangélica, cujo passado ficou marcado por ser “mulher de traficante”:

“Concordo plenamente. Minha personagem é uma mãe que busca seu filho desaparecido e esse drama materno é uma delícia de fazer. Assim como fiz na novela ‘Amor de Mãe’. Tentei quebrar alguns estereótipos e aprofundar a personagem, mostrar seu passado de forma orgânica. Qualquer ator vai trazer suas vivências consigo, não precisa morar na favela para interpretar bandido. Acho importante ressaltar isso. Não nos encaixamos apenas nisso. Por isso o trabalho de construção desses personagens foi tão importante, tão íntimo”

“Essas mulheres, como a Penha, existem pelo Brasil todo. Mulheres que buscam um corpo do filho para enterrar. Estereótipos existem e nós vivemos isso todos os dias. A trama não é uma ficção, é nossa realidade e como nós somos vitimas desse sistema que nos corrompe”

O ator Augusto Madeira, acostumado a fazer comédia, aproveitou o debate sobre a desconstrução de esteriótipos e falou sobre como foi fazer o vilão Quirino:

“Eu não me considero um comediante, mas sim um ator que sabe fazer comédia. Me afastei do Zorra Total exatamente para fazer papeis mais dramáticos e entrei nesse projeto após fazer uma série chamada ‘Hora do Perigo’, que está na Netflix, onde também vivo um agente do crime”

“Como ator, procuro defender os personagens que faço. Não foi difícil sair do clichê pois, mesmo que ele seja uma pessoa com problemas, ele acredita estar fazendo o bem para o bairro e tem uma relação de amor pelo filho e pela Penha. Então ele tem nuances de personalidade que o tira desse vilão estereotipado que tememos. Depois de 10 anos no mundo do crime, com muita violência, ele se sente cansado, com um peso nas costas, e tentei agregar isso ao personagem, um cansaço psicológico por tudo que ele já fez até hoje”

Para encerrar a conversa, ainda que o longa-metragem não tenha dato certo no primeiro momento, o filme que servirá de complemento para a série já foi filmado. Sobre isso, o diretor Pedro Von Krüger contou mais alguns detalhes:

“O filme está pronto, seria lançado em fevereiro desse, antes da série estrear, mas o presidente atual vetou o Fundo Setorial, como já comentamos, e logo também veio a pandemia. Por conta disso, segue sem data de estreia definida, mas estamos felizes de ver a série sair antes. Outra coisa boa é ver que o filme já foi selecionado para alguns festivais, como o de Buenos Aires e o de Madri, inclusive, a Mariana Nunes foi indicada à Melhor Atriz em Filme de Língua Estrangeira.

“Sobre a trama do longa, posso dizer que será ainda mais contemporânea e vocês vão ver referências ao Escritório do Crime do governo Bolsonaro e ao assassinato da vereadora Marielle Franco. No filme, tem um personagem inédito, que deseja ser eleito à vereador e é inspirado na luta da Marielle. Está imperdível”

Vale lembrar que ‘Um Dia Qualquer’, nova série nacional de drama do canal Space, estreia dia 17 de agosto às 22h. Além disso, o primeiro episódio já está liberado de forma gratuita, no canal do Space no YouTube.

Você pode assisti-lo na íntegra abaixo:

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