Há uma cena, que envolve a protagonista e um golfinho sedento por sexo, completamente nonsense de tão absurdamente mal encaixada na história, que mostra o nível de presepada que é o humor “Adam Sandler” de ‘Desperados’, nova comédia romântica da Netflix cuja premissa é tão rasa e preguiçosa, que parece ter sido escrita por um grupo de adolescentes tentando replicar a crise de meia idade de adultos de classe média. De fato, é difícil decidir o que funciona menos nessa comédia, se é o humor sem graça, gerado através de situações bobas e clichês, ou se é a falta de consistência da história, que se constrói em torno de inúmeras coincidências e conveniências do gênero e que, no fim, não servem para nada. Uma coisa é certa: a breguice e o medo de sair da zona de conforto faz o filme ser apenas mais um entre tantos que caem facilmente no esquecimento após assistir.
O excesso de diálogos faz a trama, inicialmente, parecer uma sitcom sem risadas, até que a aventura é direcionada para uma – clichê e tão utilizada – viagem de férias para o México, onde a protagonista e suas amigas precisam deletar um e-mail que foi enviado em um momento de bebedeira, antes que o príncipe encantado sem graça possa ler e, com isso, descobrir a real personalidade dela. Nessa jornada, o roteiro até se esforça para encaixar mensagens de autodescoberta e o valor da amizade mas, na realidade, segue mesmo à risca todas os elementos desse tipo de filme, sem tirar nem pôr. Seu desenvolvimento e conclusão são tão previsíveis que não precisa nem assistir para saber como tudo vai terminar. Nessa presepada, assim como ‘A Missy Errada’, outra grande bomba recente da Netflix, falta carisma no humor e energia e ritmo na direção para ser a tal comédia divertida que tanto almeja ser.
Por falar na condução, a diretora LP entrega o mais simples possível dentro da proposta tradicional que tem em mãos. Ainda que não dê para fazer milagres quando o roteiro é desconjuntado, ao menos espera-se que a direção possa dar ânimo e identidade à trama, o que – de longe – não acontece. Assim como as piadas forçadas, que se perdem antes que o espectador possa encontrar a graça. O elenco, por sua vez, também não faz lá grandes coisas. Robbie Amell (Upload) não é conhecido por seu talento, já Nasim Pedrad (Aladdin), até tem um timing cômico bom, mas passa boa parte da história sendo apenas uma personagem sem desenvolvimento nenhum, cujo único e principal objetivo é conquistar um homem que mal conhece e, pra isso, passa por uma aventura exagerada, idiota e que poderia ter sido evitada se existisse apenas uma linha de diálogo entre o casal. Haja suspensão da descrença para engolir tantas coincidências que o roteiro magicamente insere em “becos sem saída” da trama.
Para piorar a situação, o desfecho acaba anulando toda a construção da trama até então e se encerra com o óbvio: a protagonista descobre que seu amor verdadeiro estava o tempo todo ao seu lado. Após tanto descer, a história finalmente encontra o fundo do seu poço e dali não sai mais. Até mesmo as mensagens motivacionais – como a de dar valor aos amigos no lugar de homens aleatórios – acabam se perdendo no ar e não atingem o objetivo de, após tanto desequilíbrio do humor, encerrar de forma doce e emocional. Se há falta de destreza para fazer rir , imagina a dificuldade que o roteiro tem de fazer o espectador refletir, ou seja, no drama também não funciona nadinha. Por fim, com exceção de alguns poucos momentos divertidos e uma dinâmica boa entre o elenco de atrizes, é difícil levar o filme a sério.
Dessa forma, ‘Desperados’ é a típica comédia romântica sem graça da Netflix, com um roteiro desajustado e preguiçoso, que testa a paciência do espectador. Talvez a criatividade e a vontade de fazer algo minimamente original tenha mesmo desaparecido do gênero. Ainda que o maior objetivo – na grande maioria das vezes – seja entregar uma farofa sem alma, que funcione apenas como distração no vasto catálogo de filmes originais vazios da plataforma, é realmente frustrante ver que a credibilidade das comédias românticas está decaindo exatamente pela existência de obras “meia-boca” como essa. Ao lado de ‘A Missy Errada’, o ano segue convicto, só piorando.