Crítica | ‘A Guerra de Anna’ mostra as consequências da guerra através do olhar da inocência

Como ser diferente e inovador quando sua premissa já foi explorada à exaustão em diversas outras obras que tratam sobre mesmo assunto? Bem, a solução que o roteiro de ‘A Guerra de Anna’ (Voyna Anny), produção russa, encontra é divergir o seu foco e se estabelecer como um filme de guerra sem guerra, cujo objetivo é mostrar as consequências do confronto na vida de uma menina judia de 6 anos, que tem sua vida completamente devastada e precisar sobreviver escondida em uma chaminé abandonada, localizada no escritório de um comandante nazista. Dessa proposta, a trama se desenvolve lentamente e se transforma em uma espécie de diário macabro da degradação da personagem, que começa a passar fome e frio, mas que precisa se manter escondida para viver – ou apenas sobreviver.

Aliás, esse debate sobre sobrevivência é outro elemento que o roteiro aproveita pouco, ainda que sua base seja sobre a rotina da menina escondida, é mais visível a intensão de causar desconforto, com as inúmeras cenas de agonia dela, do que se aprofundar no debate sobre sua vida já ter, de fato, acabado no dia que sua família morreu. Deixando esse interessante drama de lado, a construção da narrativa é rasa e superficial, que acaba sendo tediosa, especialmente pelas longas sequências da personagem apenas caminhando e se mantendo escondida. Se pegarmos outro filme com uma proposta similar, ‘JoJo Rabbit’, é fácil perceber como essa trama desperdiça seu precioso tempo presa em apenas um ambiente, com apenas um personagem e sem mostrar os efeitos ao seu redor. Não há nuances, não há ritmo e o cortes com “fading to black” acabam deixando a narrativa ainda mais lenta. Ainda que essa proposta simplista seja para fazer o espectador sentir na pele o isolamento e a rotina triste da menina, a mensagem acaba se dissipando no meio da monotonia.

O diretor Aleksey Fedorchenko sabe aproveitar momentos de silencio e se torna visível sua intensão de imergir o espectador na atmosfera do filme, porém, acaba se excedendo na duração de algumas tomadas, como a própria sequência inicial, que mostra a menina coberta de terra. A proposta é boa e conversa com a empatia que o público terá pela jovem mais pra frente, no entanto, são mais de cinco minutos em que vemos apenas o chão, pedaços de tecidos e nada mais, algo que poderia ter sido feito em menos tempo. Curiosamente, o filme tem uma duração curta (de apenas 74 minutos), mas a dilatação de tempo que permeia pelo filme inteiro definitivamente tira sua intensidade dramática. Nada se desenvolve, nada sai do lugar, poucos elementos são inseridos para mostrar a sensação de perigo que ela vive e, quando a trama decide coloca-la no meio de nazistas, a cena é completamente surtada e estranha, que mais parece ser um sonho lúcido do que a realidade nua e crua da guerra.

Como a proposta é focar em apenas um núcleo, a jovem atriz Marta Kozlova é absolutamente perfeita em sua performance. Seus olhares frios e sua gradual transformação em alguém que só existe para sobreviver, convencem e provocam uma enorme sensação de pena e angústia pela sua situação. É uma personagem que não tem interação com elenco e, dessa forma, precisa ter bastante presença corporal, algo que a atriz tem, sem dúvida. A parte técnica, como a direção de fotografia escura e a ausência de trilha sonora são condizentes com a proposta monótona e triste, ainda que algumas cenas peçam mais detalhes técnicos que outras e que o uso de uma trilha marcante sem dúvida teria ajudado na imersão que a direção tanto busca alcançar.

Dessa forma, ‘A Guerra de Anna’ mostra os efeitos da guerra através dos olhos inocentes de uma criança e a observa enquanto definha de fome, através de uma narrativa monótona e melancólica. A proposta é boa, porém, a direção se excede e exagera na dilatação do tempo. E o roteiro, por sua vez, desperdiça a oportunidade de explorar outros aspectos da guerra ao redor da jovem e até mesmo dar uma visão de fantasia para que ela possa escapar da realidade cruel, já que se preocupa muito mais em provocar o espectador com cenas pesadas do que desenvolver emoção. Ainda assim, sua mensagem anti-nazista é clara e poderosa, assim como a performance intensa da pequena Marta Kozlova.

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