Crítica | Capone – Uma bad trip sombria e sinistra pela mente de um monstro

Se tem algo que ‘Capone’, cinebiografia do gângster mais famoso do mundo, faz é subverter as expectativas e ir por caminhos inesperados para mostrar os últimos momentos da vida de Al Capone. Surpreendentemente, ao se afastar da clássica narrativa de filmes do gênero, que inspiram Hollywood desde a década de 40, a história inova e se transforma em uma espécie de bad trip estranha e sinistra pela mente confusa do personagem, após dez anos preso e com início de demência. Essa subversão é interessante e dá ao filme um tom criativo abrupto, que preenche as lacunas dos deslizes que comete ao longo do desenvolvimento.

Ao partir do princípio de que não será um filme estereotipado, carregado de crimes e tramas elaboradas da máfia, o roteiro imaginativo e com bastante liberdade criativa concentra suas energias inteiramente no gangster (Tom Hardy) e o transforma, de fato, no centro do palco, no protagonista de sua história de morte. A trama é muito mais sobre um pai de família do que sobre uma das figuras mais violentas do mundo. E nesse caminho curioso, conhecemos um Capone fragmentado, debilitado, frágil e assustado, diferente da imagem que o mundo tem dele, basicamente o que restou após sua personalidade ter sido removida. Com isso, Tom Hardy (Venom) entra em cena em um papel realmente desafiador, que tira de letra com o talento que tem, porém, não é o melhor de sua carreira até então, já que, apesar de conseguir transmitir toda a loucura e desespero do personagem, especialmente seu ar sombrio e medonho, a atuação tem altos e baixos e nos baixos, é robótica e artificial. Linda Cardellini (Disque Amiga Para Matar), que vive sua esposa, tem um papel mais contido, bom, porém, descartável.

Se o roteiro de Josh Trank, que também dirige, se afasta de ‘O Poderoso Chefão’ e ‘Scarface’, ele definitivamente abraça a loucura de ‘O Iluminado’. As melhores sequências do longa são sinistras e flertam, até mesmo, com o horror, já que a trama se passa praticamente dentro de uma casa, mas também na mente de Capone, que viaja por suas lembranças mais sombrias e violentas enquanto sua mente definha. O tom dark, obscuro e fúnebre repercute até mesmo na direção de fotografia escura e quente. Aliás, a maquiagem é um espetáculo à parte. A proposta vai completamente contra a típica humanização desse tipo de biografia, já que Hardy não apenas aparenta ser Capone, como também vive essa versão monstruosa da sua personalidade. Os olhos sempre vermelhos, os ruídos que faz ao falar (se não tivesse algo na boca, não seria um papel de Hardy, seria?) e a postura torta, o coloca mesmo como uma criatura típica de filmes de terror. Um mostro que, de fato, era. Até mesmo comparado à Hitler por um personagem.

Com isso, o diretor Josh Trank acerta em não romantizar uma atrocidade, mas sim, mostrar seu desfecho assustador e que, no fundo, mas abaixo do que qualquer camada, havia piedade em seu coração, como há em todos nós. Sua forma de contar a história é sensível, instigante e serve como redenção após a tragédia que foi ‘Quarteto Fantástico’. Claramente é um diretor que trabalha melhor quando está completamente no comando. Ainda assim, nem tudo são flores e o filme tem problemas de ritmo, além da falta de conflitos. Na maioria do tempo é lento e se torna um exercício contra o tédio, apesar de ganhar força no último ato, seu melhor momento, sem dúvida. Fora isso, não deixa de ser uma história superficial. Para quem nunca ouviu falar sobre Al Capone, dificilmente terá alguma afeição ou irá entender sua “importância”.

Dessa maneira, ‘Capone’ surpreende por sair do habitual filme de gênero, já que flerta com o horror e entrega uma trama sombria e tenebrosa, sobre uma versão fragmentada e monstruosa do gângster mais famoso do mundo. Mesmo com problemas no ritmo, é a performance artificial de Tom Hardy que decepciona mais, especialmente por ser um filme com poucas falas. Por outro lado, o trabalho de caraterização é fantástico e a bad trip pela mente bizarra de Al Capone se torna um bom entretenimento. Falta alma no roteiro, já que personalidade tem.

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